Loja da Fnac em São Paulo: a loja que vai no embalo do público geek da paulista (Alexandre Battibugli/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 18 de julho de 2012 às 11h29.
São Paulo - Das 313 patentes que levam a assinatura de Steve Jobs, fundador da Apple, uma delas não tem nada a ver com iPhones, iPads ou Macbooks. Trata-se de uma escada de vidro, concebida para a loja da Apple da Quinta Avenida, em Nova York, e replicada para dezenas de unidades no mundo todo.
Na biografia de Jobs, o jornalista americano Walter Isaacson retrata a concepção das lojas como uma obsessão do fundador da Apple. O design deveria ser tão atraente quanto o dos produtos fabricados pela empresa, imaginou Jobs. Funcionou.
Em 2011, pouco mais de uma década depois de a primeira unidade ser inaugurada, as lojas da Apple foram as que mais faturaram por área nos Estados Unidos: 130 000 reais por metro quadrado por ano — o segundo lugar ficou com a rede de joalherias Tiffany. Os santuários de vendas da Apple são tudo o que qualquer loja deveria ser: venerada pelos clientes e verdadeira máquina de geração de receita.
O Brasil, que movimentou 1,2 trilhão de reais no comércio varejista no ano passado, ainda não conta com uma única loja da Apple. Mas, mesmo sem o charme de Jobs, temos também por aqui nossos templos de consumo.
Com base em um levantamento da consultoria inglesa Euromonitor, EXAME identificou os pontos de venda campeões em sete categorias do varejo — supermercados, shopping centers, concessionárias de automóveis importados, perfumarias, drogarias, eletroeletrônicos e media store.
São eles os responsáveis pelas maiores vendas por metro quadrado no segmento em que atuam. Essas lojas são o lado mais reluzente do consumo no país, que corresponde a 60% do PIB e tem movido a economia brasileira nos últimos anos. Em comum, os pontos de venda campeões estão em ambientes de elevada concentração de pessoas ou de renda — em alguns casos, das duas coisas ao mesmo tempo.
Quando se trata de produtos de consumo de massa, considerados quase commodities, o que importa é estar no meio do caminho da multidão, como é o caso da drogaria Onofre da praça da Sé, em São Paulo. A rede é a que mais vende por metro quadrado no Brasil, de acordo com a Euromonitor.
E a farmácia campeã é a que, há mais de meio século, está instalada a poucos metros da Catedral da Sé e da estação de metrô mais congestionada do país. Lógica semelhante se aplica à rede de perfumaria O Boticário. A loja que mais vende fica no shopping center Iguatemi, de Salvador, outro lugar de grande fluxo de pessoas.
Os 46 metros quadrados geram cinco vezes mais vendas que a média da rede, de cerca de 42 300 reais por metro quadrado a cada ano. “O movimento da loja no shopping Iguatemi é abastecido pelo terminal rodoviário de Salvador, a poucos metros dali”, diz Andrea Mota, diretora de O Boticário, maior rede de franquias do Brasil, com faturamento de 5,5 bilhões de reais em 2011. O movimento é tal que a empresa tem duas lojas no mesmo shopping.
Do ponto de vista econômico, a explicação para esses casos de sucesso é relativamente simples. O que as empresas buscam é reduzir os chamados “custos transacionais” de uma compra. Traduzindo do economês: quando um consumidor compra um remédio, ele arca, além do custo financeiro do medicamento, com o deslocamento até a farmácia.
“O custo transacional pode incluir o estacionamento e o combustível do carro. Ou simplesmente o tempo e o trabalho da compra”, diz o demógrafo Reinaldo Gregori, sócio-diretor da consultoria Cognatis, de São Paulo. Portanto, quanto mais cômodo for o percurso de uma pessoa até a loja, menor é esse “custo” adicionado ao preço do produto.
É a extrapolação dessa mesma lógica que explica o poder crescente de atração das cidades. A alta densidade populacional das aglomerações urbanas permite que os custos de transação — como o de se movimentar, de se comunicar, de fazer as ideias circularem, de comprar e vender — sejam menores.
Luxo e tradição
O shopping center Iguatemi, de São Paulo, instalado na avenida Faria Lima, região oeste da capital paulista, é o centro de compras com as maiores vendas por metro quadrado do Brasil. Segundo estimativas de Cláudio Guaranys, presidente da consultoria CG Malls, com sede no Rio de Janeiro, cada metro quadrado de loja no Iguatemi, o primeiro shopping do Brasil, inaugurado em 1966, responde por vendas de 45 000 reais por ano.
Embora esteja numa área nobre de São Paulo, seria um exagero dizer que a maior explicação para o seu sucesso é apenas a localização geográfica. Seus clientes não se resumem aos que moram e trabalham nas imediações. O shopping — pioneiro em oferecer pequenos confortos hoje disseminados pelo segmento, como salas de cinema com lugar marcado — concentra marcas de luxo como Burberry, Chanel, Salvatore Ferragamo, Christian Louboutin, Tiffany e Louis Vuitton.
No centro do seu piso térreo, há um Gero Caffé, uma das marcas de restaurante do Grupo Fasano. No 9o andar, fica uma unidade do badalado salão de cabeleireiros Studio W. Com um fluxo médio diário de 50 000 pessoas — boa parte delas endinheirada —, o Iguatemi acaba atraindo redes não necessariamente ligadas ao mercado do luxo, como a Fast Shop, apontada pela Euromonitor como a varejista de eletroeletrônicos que mais fatura por metro quadrado no país.
Não por coincidência, EXAME apurou que sua loja campeã, com faturamento anual estimado em 300 000 reais por metro quadrado, fica no shopping (procurada, a empresa não quis dar entrevista).
O preço do sucesso
Invariavelmente, uma loja campeã enfrenta um aluguel nas alturas. “Hoje nosso aluguel é um dos mais altos do mundo”, diz Carlos Jereissati Filho, presidente da Iguatemi Empresa de Shopping Centers. Segundo a consultoria Cushman & Wakefield, trata-se, mais precisamente, do 11o endereço comercial mais caro do planeta.
Pontos de fluxo privilegiado custam muito mais que os outros — muitas vezes, separados por alguns metros de distância. Dentro de um shopping, seja um dedicado ao público de baixa renda, seja um focado na classe A, o aluguel de espaços próximos de escadas rolantes ou de lojas âncoras pode sair três vezes mais caro, calcula Manuel Puig, diretor da divisão de varejo da consultoria Jones Lang LaSalle, com sede em São Paulo.
A relação é a mesma para lojas de rua. Varejistas asseguram que lojas instaladas nas chamadas esquinas “positivas” — aquelas que ficam depois de um cruzamento — faturam mais. O motivo seria a maior visibilidade dos prédios localizados nesses pontos para quem está dirigindo. “Aluguéis caros exigem um esforço adicional das lojas para rentabilizar cada metro quadrado de espaço”, afirma Meika Nakamura, analista da Euromonitor.
Estima-se que, para manter-se economicamente viável, um supermercado não deva gastar mais do que o equivalente a 2,5% de suas vendas em aluguel, condomínio e impostos imobiliários. Para uma loja de eletroeletrônicos, a taxa é de 3,5%. Essa regra, porém, é muitas vezes deixada de lado quando se trata de um ponto campeão.
“Sob certas circunstâncias, o lugar é muito mais marketing do que de resultado”, afirma Marcos Gouvêa de Souza, da consultoria GS&MD, de São Paulo. Em outras palavras, pode valer a pena pagar o preço, desde que, ao final das contas, o varejista consiga alcançar mais clientes. Como costumava dizer Sam Walton, fundador do Walmart, maior rede de varejo do mundo, o consumidor é o verdadeiro chefe, a pessoa que pode demitir todo mundo se decidir comprar na loja ao lado.