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Preste muita atenção no que dizem seus funcionários

O que muitos pequenos e médios empresários estão descobrindo ao conversar pessoalmente com seu pessoal

Pedro Salomão, da rádio Ibiza:  É permitido às funcionárias usar a cozinha da empresa para fazer brigadeiro nos dias de TPM (Marcelo Correa)

Pedro Salomão, da rádio Ibiza: É permitido às funcionárias usar a cozinha da empresa para fazer brigadeiro nos dias de TPM (Marcelo Correa)

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Da Redação

Publicado em 26 de dezembro de 2011 às 05h00.

Nunca faltam chocolate em pó e granulado e leite condensado na despensa da rádio Ibiza, do Rio de Janeiro, que neste ano deve faturar 3 milhões de reais — 20% mais do que no ano passado — programando a trilha sonora dos ambientes de mais de 500 lojas, escritórios e restaurantes, como os das redes Pizza Hut e Outback.

Pelo menos uma vez por mês, as funcionárias passam algumas horas na cozinha, bem no meio do expediente, fazendo brigadeiro. Elas raspam com vontade as latas de leite condensado e se lambuzam de chocolate derretido. Enquanto mexem nas panelas, batem papo e dão bastante risada. "É uma farra", diz o administrador Pedro Salomão, de 31 anos, sócio da Ibiza.       

De seus 50 funcionários, 18 são mulheres. Salomão descobriu que boa parte delas sofre de TPM — aquela condição mensal em que a oscilação dos hormônios pode deixar muitas mulheres com os nervos à flor da pele.

“Ninguém consegue trabalhar direito se está prestes a bater em alguém”, diz ele. "Sempre ouvi falar que chocolate é bom para esses casos, e me veio a ideia da sessão de brigadeiro. Funcionou, pois elas passaram a ficar mais calmas nesses dias."


O assunto veio à tona há cerca de um ano e meio. Na época, Salomão decidira reservar um dia da semana para receber em sua sala qualquer funcionário que estivesse com vontade de conversar com ele. "E-mails e telefone são necessários, mas nada substitui o contato pessoal", diz.

"O problema é que, à medida que a Ibiza cresceu, foi ficando mais difícil manter a proximidade com os funcionários." O jeito foi criar um momento oficial para eles poderem se manifestar.   

Como em outros programas desse tipo, nesses bate-papos Salomão recebe sugestões de algo que pode ser melhorado aqui ou ali —ideias que poderiam ser colhidas também de outra forma, como por caixas de sugestões ou em brainstorms. "O importante mesmo é que fico sabendo de coisas que eu não fazia ideia que poderiam afetar o ambiente de trabalho", diz Salomão. 

Foi justamente numa ocasião dessas que  a gerente de marketing Yasmin Vilhena, de 23 anos, falou da TPM. "Contei a ele que ficava de péssimo humor e expliquei como aquele estado de espírito me impedia de trabalhar direito", diz Yasmin. Salomão interessou-se em saber se Yasmin era um caso isolado — e saiu  perguntando para a mulherada se também elas passavam por ciclos de dias difíceis.

"Descobri pelo menos meia dúzia de moças do marketing e do atendimento com o problema", diz ele. "São áreas importantes demais para o nosso crescimento para deixar por isso mesmo." 

Ao longo de sua trajetória de crescimento, muita coisa muda numa pequena ou média empresa. Departamentos são criados para dar conta de atividades mais específicas. Funcionários com perfil de líder são escolhidos para chefiá-los. Com o tempo, é normal que surjam mais e mais níveis hierárquicos entre o dono da empresa e seu funcionário mais humilde.


"É preciso encontrar uma forma de minimizar o distanciamento", diz a consultora Adriana Fellipelli, especializada em recursos humanos. "Ouvir os funcionários deveria ser uma prioridade para o empreendedor preocupado em não perder seus melhores talentos."   

Em conversas ao vivo, como no caso da Ibiza, informações surpreendentes podem aparecer. Foi o que ocorreu com o empreendedor Marco Aurélio Sedrez, de 57 anos, dono da Mosarte, fabricante de revestimentos cerâmicos de Tijucas, em Santa Catarina, que em 2011 deve faturar 21 milhões de reais, 25% mais que no ano passado.

Um aspecto com o qual Sedrez sempre se preocupou foi promover a integração social entre as pessoas. "Relacionar-se com alguém apenas para cumprir uma tarefa de trabalho torna a empresa muito fria", diz Sedrez. "Acredito que para ter um bom time é preciso estabelecer conexões mais humanas."

Para isso, uma de suas iniciativas é promover pelo menos três festas por ano. Do ponto de vista da organização, não há nada errado com as festas. Sedrez aluga salões de clubes da cidade, contrata DJs instruídos a colocar discos dançantes e, claro, não deixa faltar cerveja nem salgadinho. Mas as festas não faziam sucesso.


"A maior parte das pessoas não dançava e ia embora cedo", diz Sedrez. "Não sabia o que estava errado." Tempos atrás, o mistério foi desvendado graças ao programa Fale com o Presidente, que prevê uma conversa pessoal entre Sedrez e os funcionários no mínimo uma vez a cada 15 dias. 

Um dia, um grupo de mulheres que trabalham como auxiliares de escritório resolveu expor um probleminha com as comemorações da empresa. Os convites, que davam direito a um acompanhante, eram enviados para suas casas. Normalmente, seus maridos  queriam acompanhá-las. 

Elas explicaram que, uma vez na festa, duas coisas poderiam ocorrer. A mais comum era o marido se sentir deslocado por não conhecer ninguém direito e não entender piadas de trabalho que só os outros acham graça. “Outro problema eram os maridos que não deixavam a mulher dançar com os colegas”, diz Celiane Cristiane de Souza, de 34 anos, assistente de recursos humanos da Mosarte. "Muitos acabavam ficando emburrados e as funcionárias preferiam voltar para casa." 

Sedrez mandou que o RH fizesse uma pesquisa com os 170 funcionários da Mosarte. Constatou-se que 65% deles — entre homens e mulheres — preferiam que os convites fossem individuais. Daí em diante, as festas passaram a ser exclusivas para o time da casa. "As comemorações hoje cumprem o objetivo de unir os funcionários", diz Sedrez. "O pessoal fica dançando e conversando até altas horas da madrugada." 


Desde o ano passado, a empreendedora Karin Guth, de 52 anos, dona da fabricante de instrumentos cirúrgicos paulista Erwin Guth, reserva pelo menos meia hora por semana para receber grupos de funcionários — ao todo, são 60. Ela está convicta de que sua disposição em ouvi-los e tentar atender suas demandas está ajudando a empresa a faturar neste ano mais de 17 milhões de ­reais, 10% acima de 2010. "Embora seja difícil mensurar, tenho certeza do efeito positivo da nova prática sobre o crescimento de nossa empresa", diz Karin. 

Certo dia, um funcionário entrou em sua sala para dizer que tinha vontade de mudar de área, mas que jamais falaria sobre isso com seu chefe por medo de que os colegas descobrissem e pensassem que ele queria tomar o lugar de alguém. Em outras conversas, Karin soube que algumas pessoas desejavam ter experiências em outros departamentos, mas também não tinham coragem de expor o assunto.

Karin então criou um programa de rotatividade. A cada seis meses, os funcionários podem se candidatar a trabalhar em outro setor da empresa por dois meses. Para ser aceito, basta haver vaga.

Cerca de dez pessoas já participaram do programa. A maioria acabou efetivada no novo setor. "É uma maneira de aproveitar melhor o talento de cada um", diz Karin. Para muitos funcionários, a mudança fez bem.  Elizângela Pereira de Souza, de 34 anos, há um ano e meio na empresa, passou de auxiliar de embalagem a auxiliar de controle de qualidade no mês passado, depois de participar do rodízio. "Adorei a mudança", diz ela.

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