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Como lidar com interlocutores intragáveis

Eu era criança no circo e ele revelou meu truque. Não me abati, e descobri como lidar com clientes, fornecedores e concorrentes intragáveis

Fazer o oponente virar meu cúmplice — eis a arte do equilíbrio que a vida me ensinou (Gustavo Pomodoro/ stock.xchng)

Fazer o oponente virar meu cúmplice — eis a arte do equilíbrio que a vida me ensinou (Gustavo Pomodoro/ stock.xchng)

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Da Redação

Publicado em 30 de junho de 2011 às 08h00.

Era uma terça-feira fria e chuvosa de agosto. Aos 11 anos, eu já não achava mais o circo uma brincadeira de criança. O relógio marcava 18 horas e já estávamos todos lá: eu, meu pai, minha mãe e minhas três irmãs.

Caprichávamos na limpeza e acertávamos todos os detalhes para que pudéssemos promover mais um grandioso espetáculo. Mesmo num dia enjoado como aquele.

Ao prepararmos o programa, percebi que entraria cinco vezes no decorrer da noite. Fiquei tão feliz! Eu gostava quando participava bastante. Hoje percebo que talvez tenha vindo desses dias da minha infância essa minha capacidade de me reinventar, me renovar, me motivar.

E consegui fazê-lo mesmo naqueles momentos da vida em que todos os dias parecem se transformar em terças-feiras modorrentas.
Às 21 horas, o show estava prestes a começar. Resolvi espiar pela fresta da cortina de veludo vermelha e contei...14, 15, 16 pessoas presentes. É fatal.

Sempre em um dia chuvoso, quando o público era pequeno, tínhamos um — ao menos um — bêbado, que, certamente, vinha em busca de duas coisas. Primeiro, abrigar-se do frio e da chuva. E, depois, esgotar a paciência do palhaço. No caso, eu.

Dias como aquele sem muito público eram perfeitos para que nós testássemos novos quadros. Meu pai sempre me ensinava um novo truque e me estimulava a exibi-lo.


Mas daquela vez o desafio seria diferente. A quantidade de espectadores era pouca, minha experiência também, até aí uma situação familiar para mim. Mas, naquela noite, do outro lado do picadeiro, eu teria de enfrentar um oponente novo e até então desconhecido: o bêbado.

Começa o espetáculo. Minha mãe, como apresentadora, pega o microfone como se fosse a matinê de domingo. Sempre com a mesma empolgação contagiante, vai chamando um a um os artistas. Até que, enfim, chega a minha vez. Meu novo número.

Entro cambaleante com um bastão de madeira nas mãos equilibrando uma garrafa de refrigerante de cabeça para baixo. A ideia seria eu fazer mil peripécias de equilíbrio com o bastão e a garrafa. Ao final, eu sairia com a garrafa e o bastão pendurados no ombro, para então revelar ao público que era um simples parafuso ligando os dois objetos que dava todo o suporte ao número.

Mal entro no picadeiro e o bêbado grita: “Ei, palhacinho bobo, este truque da garrafa presa é velho, hein?” E eu, louco da vida, respiro profundamente e respondo: “Moço, pode até ser velho, mas fica quietinho, por favor, e me ajude, pois é a primeira vez que estou fazendo”. Todos os 16 es-pectadores caíram na gargalhada. Naquele momento, eu transformei meu oponente em cúmplice. Ele gostou — e, confesso, gostei também.

No decorrer de minha vida, reencontrei diversas vezes o bêbado. Aquela pessoa que está pronta para se abrigar na desventura de quem está à sua frente. Muitas vezes, ela estava travestida de cliente intragável; outras, de fornecedor insensível; e tantas outras, de concorrente, querendo sempre me derrubar.

Mas, devo agradecer, a vida me ensinou a lidar com essas situações. A neutralizar, ou mesmo tornar o bêbado um aliado. E a vida me ensinou também que, para cada terça-feira chuvosa, sempre haverá um domingo ensolarado. É só saber esperar.

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