Empreender está nos genes, diz pesquisador
É esta a idéia que sustenta o novo livro de Scott Shane, professor de empreendedorismo da Case Western Reserve University
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.
São Paulo - Em Born Entrepreneurs, Born Leaders: How Your Genes Affect Your Work Life (Empreendedores natos, Líderes natos: Como seus Genes Afetam sua Vida Professional, numa tradução livre), Scott Shane defende a teoria de que quase tudo no nosso trabalho, desde a escolha da profissão até suas condutas, podem ser influenciados pela genética.
Ele explica que o livro começou da ideia de analisar a base genética do empreendedorismo, mas que alargou o tema e resolveu mostrar os efeitos da genética na vida profissional como um todo.
"A idéia não é explicar a genética, mas negócios", diz. Antes de começar a escrever, Shane fez um blog com algumas notas sobre o assunto e percebeu que as pessoas acessavam e comentavam mais do que o normal. Ele diz que não sabe porque tanto interesse do público por empreendedorismo, mas vê nisso um estímulo para dar continuidade as suas pesquisas.
A publicação explica que os genes que compõem o nosso corpo afetam a escolha de uma profissão, alguém com genes que provocam problemas de visão não poderia ser um piloto da Aeronáutica, e mais: a performance no trabalho, os valores, a carreira, a satisfação profissional.
O objetivo do livro é condensar uma vasta gama de pesquisas em genética e diferentes aspectos da vida profissional, revelar as implicações que isso provoca e discutir ainda como a genética influencia no comportamento profissional das pessoas. Em entrevista exclusiva ao site Exame, Shane fala sobre seu estudo que relaciona genética e empreendedorismo e como tirar o máximo deste campo.
EXAME - É preciso que haja um sinal na infância para descobrir a predisposição genética para ser um empreendedor?
Scott Shane - Durante a infância ainda não podemos saber. A maior parte dos estudos tem sido feita com gêmeos ou crianças adotadas, indicando que há um efeito genético quando comparamos gêmeos idênticos ou não ou crianças adotadas com seus pais biológicos e adotivos. Os pesquisadores estão tentando identificar, primeiramente, genes específicos associados com a tendência de ser um empreendedor na idade adulta. Portanto, não é possível fazer algo para descobrir se esta predisposição existe, por enquanto.
EXAME - Na sua opinião, quais as principais características de um pequeno empresário?
Shane - Esta é uma questão muito mais difícil do que se imagina. São muitos empresários com diversas diferenças entre eles. É impossível identificar um conjunto de características que claramente identifiquem e diferenciem os empresários das outras pessoas.
EXAME - É possível aprender a ser um empreendedor? Como?
Shane - Com certeza. Empreendedorismo é como quase tudo que as pessoas fazem. Mesmo quem é melhor em algo desde que nasceu precisa aprender e praticar. Pegue o futebol como exemplo. A maioria sabe que ninguém, não importa o quanto se esforce em treinar, conseguirá ter um time como a seleção brasileira. Mas todos os membros do time, mesmo aqueles que tem o dom de jogar, precisam praticar. E em algum ponto precisam aprender o jogo. Eles não nascem conhecendo as regras. Empreendedorismo é a mesma coisa. Ninguém nasce sabendo o que é capital de risco ou como fazer um plano de negócios. Você precisa aprender essas coisas.
EXAME - Quais as chances de uma pessoa que não tem uma predisposição genética para ser empreendedor se tornar um grande empresário?
Shane - São bem altas. Primeiro, porque a maior parte das evidências que temos sobre genética e empreendedorismo é sobre a preferência das pessoas de ser um empreendedor e não sobre a uma boa performance na área.
Em segundo lugar, predisposições genéticas não mudam radicalmente as probabilidades de ser um empreendedor. Isto é parecido com a maior parte das coisas sobre o assunto. Ter dinheiro aumenta as chances de ser um empresário, mas não muito. Perder o emprego também torna isto mais provável, mas nem tanto. Estamos falando de um grande número de coisas em que cada uma tem um pequeno efeito.
Outro ponto tem a ver com o fato de que podemos ter pessoas que respondem a diferentes estímulos para serem empreendedoras. Tudo isso indica que genética importa e que precisamos entender como ela funciona. Por fim, as pessoas podem tomar atitudes que superem suas predisposições. Eu posso ter uma tendência genética para ser gordo. Mas isso não significa que eu tenha que ser. Se seguir uma alimentação saudável e fizer exercícios físicos, a chance diminui.
EXAME - Você diz em seu livro que uma parte do empreendedorismo é genética. Quais outros fatores influenciam a formação de um empreendedor?
Shane - Muitas, muitas coisas. As pesquisas mostram que educação, idade, gênero, raça, renda, empregabilidade, ramo em que atua e um conjunto de outros fatores influenciam se uma pessoa irá ou não começar um negócio.
EXAME - Você afirma que o mercado de negócios ignora a genética. Por que isso ocorre?
Shane - Por muitas razões. Primeiro, as pessoas não pensam genética de uma forma elaborada. Elas pensam que tudo que envolve o assunto dispensa o aprendizado ou a escolha feita por cada um. Isso é errado, porque a genética só é responsável por uma parte do comportamento, os fatores ambientais importam mais. A genética interage com o meio de ambiente de formas muito mais complexas.
Um estudo que estamos desenvolvendo pode servir de exemplo. Sabemos que os empreendedores tem mais chances de serem disléxicos do que a população em geral. Sabemos também que eles são mais educados do que a população em geral. Finalmente, temos conhecimento de que os disléxicos acham a educação formal mais difícil. Esses padrões são inconsistentes. Estamos estudando em que ponto a educação interfere nesta relação.
Este tipo de padrão sugere que algumas pessoas são geneticamente predispostas a viraram empreendedores em resposta a alguns estímulos, enquanto outras também tem esta tendência em resposta a diferentes estímulos. Esta é uma visão muito mais sofisticada de como a genética importa. Mas ela não funciona tão bem no mercado de publicações sobre negócios que querem argumentos do tipo: "faço isso e transforme-se no próximo Bill Gates".
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