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Empreendedor fracassou 3 vezes e conta como superou a crise para vencer

Mauricio Schneider já teve uma plantação de tomates, uma importadora de instrumentos musicais e agora uma empresa de jogos e fala dos seus fracassos.

Fracasso: resolver a insolvência de um negócio dura, em média, cerca de quatro anos no Brasil (Michael Blann/Thinkstock)

Mariana Desidério

Publicado em 24 de março de 2018 às 08h00.

Última atualização em 24 de março de 2018 às 08h00.

Todo empreendedor tem um Day1. Aquele dia que chacoalha a nossa vida; que nos faz perder o equilíbrio por um instante e quase cair para trás. Uma situação, um clique ou uma certeza que nos tira do lugar. Desse dia em diante, não queremos mais cruzar os braços, muito menos desistir e voltar atrás. Porém, só quem empreende sabe: para cada Day1, existem centenas de outros Day-1.

Esses são os dias em que tudo parece dar errado, quando o mundo vira de cabeça para baixo. O gatilho pode ser uma crise interna, um cliente perdido, o fracasso de um lançamento ou uma notícia inesperada que o tira o chão. Nesses dias, a derrota te faz pensar que perdeu a guerra. Passar por esses dias coloca toda a sua resiliência à prova, mas também te torna mais forte. Afinal, quem desiste não faz história.

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Mauricio Schneider, empreendedor participante do Scale-Up Agrotech, programa da Endeavor com patrocínio da Yara, tem um Day-1 para ficar na história. Uma trajetória que merece ser compartilhada como sinônimo de persistência e inspiração para quem está empreendendo.

Maurício sempre foi empreendedor, desde que se entende por gente. E, desde cedo, soube que o fracasso é parte da jornada até o sucesso. Aos 21 anos, começou uma plantação de tomates em estufa que fornecia aos mercados da região com seu pai, que entrou no negócio como investidor. O negócio ia bem, a ponto de financiar a construção de estruturas para plasticultura (cultura com o uso de estufas) que ampliaram o volume da produção. Até que, certo dia, veio um vendaval que levou todas as estufas pelos ares. Não havia mais nada que pudesse fazer: demoraria 120 dias para uma nova colheita e nenhum cliente poderia esperar tudo isso. O negócio de tomates chegava ao fim. Ou quase. Maurício ainda passou 10 anos pagando a conta do financiamento que tinha feito.

Dali, Maurício foi fazer faculdade de Administração e fez carreira na AIESEC, uma das maiores organizações de liderança jovem do mundo, até ser convidado a trabalhar como trainee na Europa. Lá, tomou a decisão: queria voltar ao Brasil para empreender. Com toda a bagagem que adquiriu, voltou e montou um negócio de importação de instrumentos musicais. O modelo envolvia um showroom em escolas de música e a venda online dos instrumentos. Porém, um dia, depois de ter problemas com a entrada das mercadorias no Brasil, o material ficou estocado no Porto Seco, uma estação aduaneira que funciona como depósito alfandegário. Mais uma vez, o tempo jogou contra o empreendedor. Veio uma chuva tão forte que alagou o depósito, estragando todas as mercadorias armazenadas. Não existia mais capital para continuar. Apesar disso, a burocracia é tão grande para o fechamento de empresas que a empresa não funciona há 5 anos, mas ainda tem um CNPJ Zumbi.

A partir daí, Maurício começou a dar cursos sobre modelagem de negócios, formatando uma iniciativa que hoje é conhecida como Administrar é Preciso, um coletivo de administradores e gestores que fazem consultorias para pequenas e médias empresas. Em uma das avaliações de plano de negócios que Maurício fez, conheceu uma empresa de ilustração que tinha ambições para crescer. Por meio de uma série de conversas com os fundadores, eles identificaram uma oportunidade de entrada no mercado de games. Maurício acabou entrando como sócio-investidor em 2009, responsável pela gestão e estratégia comercial do negócio.

O objetivo do primeiro trabalho era criar um projeto autoral — o Dodge This! — que fosse lançado em parceria com uma grande publicadora de games. Os sócios-fundadores fizeram um storyboard e mandaram para as 10 maiores publicadores do mundo. Dessas, apenas 3 responderam. Uma delas foi a Chillingo, que fechou parceria com eles.

De um lado, a IMGNATION Studios produziria o game e, de outro, a Chilingo ofereceria a rede de contatos e estratégia de RP para lançar o jogo. Além disso, eles disponibilizaram um produtor de jogos de nível mundial para ajudá-los na construção do produto.

Na prática, a ajuda foi boa, mas ruim. As mudanças que o produtor pedia eram tantas que o projeto de 1 ano e meio só ficou pronto 3 anos depois. O caixa planejado não seria suficiente para sustentar a operação por todo esse período, foi por isso que eles começaram, em paralelo, a prestar outros serviços que gerassem uma receita recorrente. Modelo esse que até hoje é um dos pilares de sustentabilidade financeira da empresa.

Em 2011, finalmente, o game foi lançado! Em dois dias, ele já tinha 300 mil downloads e estava na lista de top 10 mais baixados do mundo. Mas cadê a monetização? A expectativa era ter um ticket médio de 10 dólares por jogo baixado, considerando as configurações premium que eram pagas, mas, por causa de um bug na conversão de moedas da loja virtual, o usuário não conseguia realizar a compra. Em 20 minutos o bug foi resolvido, logo no terceiro dia de lançamento. Mas para a nova versão entrar no ar, seria preciso entrar em uma fila nas lojas de aplicativos (App Store, Google Play e Microsoft Store), o que levaria até 10 dias.

O problema é que os jogos têm uma curva de aderência nos primeiros 7 dias do lançamento: nesse período, se você chegar no topo e conseguir descolar da concorrência, a tendência é que continue no topo. Até a nova versão ir ao ar, os usuários já tinham desinstalados, reclamado do jogo nas resenhas e, por consequência, o algoritmo das lojas derrubaria o alcance do jogo.

Em uma semana, a expectativa era chegar em uma receita de u$s 12 milhões com 1,2 milhão de downloads. Mas nem um real caiu na conta. Um desastre total.

Talvez tenham sido os fracassos anteriores, ou talvez a vontade de construir um negócio de impacto, mas o fato é que Maurício não pensou em desistir. “Nós tínhamos conseguido nos expor no mercado, fizemos todo o projeto certo, sabíamos que o bug foi causada por um problema de validação da publicadora, não podíamos jogar essa experiência no lixo só porque estávamos frustrados.”

Dos oito sócios envolvidos na IMGINATION, só ficaram dois: ele e Orlando, um dos fundadores. Maurício investiria capital para a empresa sobreviver por mais um ano, pelo menos, até um novo lançamento, e Orlando seria o líder do projeto, garantindo que a máquina continuasse girando. “Vamos encolher e vamos acreditar que a gente vai mudar o mundo”, esse era o lema.

Chamaram o time de 15 pessoas para uma reunião, uma das conversas mais difíceis da vida de Maurício. O discurso foi preto no branco, com a transparência característica de Orlando. Ele contou que os sócios teriam um salário mais baixo, que o Maurício faria o aporte do capital para o próximo ano e que eles não conseguiriam ficar com toda a equipe. Naturalmente, as pessoas foram saindo até chegarem em um tamanho possível de manter a operação. Por sorte, eles tinham uma sala na Incubadora Tecnológica de Santa Maria, a ITSM, que oferecia toda a infraestrutura por um aluguel bastante amigável.

O plano era viver de forma austera, com 4 pessoas na equipe, até o próximo jogo ser lançado. Mas, 45 dias, aconteceu o que ninguém esperava. A publicadora de games que participou do primeiro projeto conectou os empreendedores à Samsung para um projeto de realidade virtual. A ideia era lançar o mesmo jogo que eles já tinham produzido — o “Dodge This!” — na versão para o Gear VR, óculos de realidade virtual que seriam lançados em 2014. Na época, eles ainda não tinham nem o protótipo dos óculos, mas acharam que aquele jogo poderia ser um ótimo título de lançamento.

A notícia era boa, mas ficava ainda melhor. A Samsung e a Oculus, as duas empresas que capitanearam o projeto, pagariam pelo jogo. No pior cenário, seria necessário gastar metade do valor oferecido para a produção e o restante seria usado para recuperar o fôlego financeiro da companhia. Negócio fechado! Com isso, conseguiram estabilizar o caixa, manter as pessoas trabalhando e ainda teriam a oportunidade de estrear no mercado de VR (virtual reality).

A partir desse dia, as coisas começaram a mudar. Depois do lançamento, a visibilidade aumentou bastante já que eram a primeira empresa brasileira a criar um jogo para realidade virtual. Logo em seguida, surgiu também a oportunidade de fazerem a versão VR para o jogo Angry Birds. O primeiro projeto tinha sido entregue em abril, o outro já estava programado para julho. Essa abertura para o mercado global ampliou as perspectivas dos dois sócios.

No mesmo ano, participaram do programa de incubação da Game Founders, maior aceleradora de empresas de games do mundo. E, em janeiro do ano seguinte, foram acelerados pelo fundo de Venture Capital Boost VC, especialista em realidade virtual e blockchain. Durante um dos eventos do programa, conheceram a HTC que, meses depois, fez um aporte na empresa para o jogo que será lançado em breve.

Tudo isso porque, depois daquela semana terrível de lançamento do jogo, Maurício e seu sócio conseguiram enxergar além da neblina de desespero que se formou no momento. Eles decidiram olhar por cima da frustração que abatia o time porque acreditavam no potencial da empresa. Continuar por mais um dia. Quem sabe o dia seguinte não é o seu Day1?

Hoje, Maurício é COO da Solubio, uma empresa de produção de defensivos biológicos para agricultura, e, ao lado do empreendedor Alber Martins Guedes, participa do programa Scale-Up Agrotech da Endeavor.

Texto originalmente publicado no site daEndeavor.

 

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