Dono do Uber dos caminhões teve ideia rejeitada 200 vezes
A CargoX está faturando alto com um sistema que otimiza o transporte de carga, um dos maiores gargalos do Brasil. Antes disso, a ideia foi rejeitada 200 vezes.
Mariana Desidério
Publicado em 7 de outubro de 2016 às 11h35.
São Paulo – O argentino Federico Vega tinha um sonho: criar um negócio que gerasse impacto real no mercado. E foi no Brasil que ele encontrou essa oportunidade: após analisar os gargalos do transporte de carga por aqui, decidiu investir numa forma de tornar nosso sistema logístico mais eficiente.
“Eu queria resolver um problema verdadeiro do mercado. E o Brasil tem a logística mais complexa do mundo. Aqui praticamente não existe trem e a quantidade de caminhões é absurda, é uma das maiores e mais complexas indústrias do mundo”, afirma o empreendedor , que antes de vir para cá estudou em Londres e foi executivo do J.P. Morgan na Inglaterra.
Foi assim que nasceu a CargoX, uma startup que funciona como o Uber dos caminhões, conectando motoristas e cargas pelo país.
Mais de 200 vezes 'não'
Se o problema da logística no Brasil é complexo, a solução também não viria de forma fácil. Vega conta que buscou investimento para sua ideia com diversos investidores, no Brasil e no exterior, sem sucesso.
“Falei com vários investidores, muitos deles mais de uma vez. Chegou um momento que eles nem me atendiam mais. Recebi mais de 200 negativas, teve investidor que me disse ‘não’ umas 20 vezes”, lembra o CEO.
O primeiro obstáculo encontrado por Federico foi o idioma. “Os investidores diziam: ‘Você é gringo, não fala português. Esse é um setor muito complicado, você não vai conseguir operar’”. A providência do empreendedor, então, foi aprender a falar nossa língua. Depois, Federico tratou de atrair para sua ideia gente familiarizada com o setor logístico brasileiro.
Após meses buscando dinheiro sem sucesso, Vega decidiu bater na porta de seu antigo empregador.
Ele havia deixado o J.P. Morgan, em Londres, dizendo a seu chefe que iria empreender no Brasil. “Para eu ficar desesperado e ir até meu ex-chefe era porque não conseguia investimento de jeito nenhum. Eu pedi demissão e disse que ia abrir uma empresa. Depois de umas tentativas tive que voltar e pedir dinheiro”, conta.
O ex-chefe era Dimitrios Raptis, que aceitou a proposta com uma condição: Vega precisaria investir o mesmo valor de seu próprio bolso. O empreendedor então vendeu seu carro e seu apartamento e colocou todo o dinheiro no negócio. “Ele aceitou porque sabia que eu estava investindo tudo o que tinha”, lembra o CEO da CargoX.
A partir daí as coisas começaram a melhorar. O ex-CEO da gigante de entregas DHL, Hans Hickler, se juntou ao negócio, assim como Oscar Salazar, um dos fundadores do Uber. “Ele disse, porém, que só aceitaria fazer parte se entrasse de fato na empresa.” Salazar tornou-se então cofundador do negócio.
Uber dos caminhões
A CargoX começou a operar efetivamente no início deste ano e tem um escritório em São Paulo, um no Mato Grosso e um na Argentina. O negócio funciona como o Uber: através de um aplicativo pelo celular, motoristas autônomos recebem propostas de transporte de carga por todo o país.
Um dos principais problemas atacados pela startup é a ociosidade dos caminhões. “Hoje, um caminhão leva uma carga de São Paulo a Recife e na maioria das vezes volta vazio. Isso é totalmente ineficiente, encarece o transporte”, afirma Vega.
Dados divulgados pela empresa indicam que mais de 40% dos veículos de carga viajam ociosos pelas estradas brasileiras.
Pelo sistema da CargoX, o motorista pode encontrar uma nova carga para levar saindo do seu ponto de chegada, o que otimiza seu tempo e barateia o custo final do transporte.
Além disso, as cargas são rastreadas durante todo o trajeto, evitando extravios e, assim como no Uber, os motoristas são avaliados pelo cliente. Atualmente a CargoX tem mais de 200 mil motoristas cadastrados e atende clientes como Leroy Merlin, Gerdau e Whirlpool.
Caminhões autônomos
Um plano da empresa para o futuro é a atuação com caminhões autônomos. Nesta semana, a CargoX anunciou a criação de uma equipe focada apenas em tecnologias envolvendo esses modelos.
Segundo o CEO da empresa, os caminhões que dirigem sozinhos devem ser uma realidade no Brasil em cinco anos.
“Empresas importantes estão investindo nessa tecnologia. A Tesla já começou a fazer carros que dirigem sozinhos e o Uber está testando um serviço usando esses modelos nos EUA. Acreditamos que o futuro do transporte está nos caminhões autônomos”, afirma Vega.
A empresa recebeu recentemente um grande aporte liderado pelo banco Goldman Sachs, totalizando 35 milhões de reais. Com isso, a startup recebeu até agora 49 milhões reais em investimento, desde o início do projeto.
Vega comemora o aporte do banco, especialmente num momento de crise econômica e política no Brasil.
“O Goldman Sachs é investidor do Uber e do Facebook, é um dos melhores investidores de startups do mundo. Acho muito legal ver um investidor como esse colocar dinheiro numa empresa no Brasil, num momento em que todos perderam a confiança no país, inclusive os investidores brasileiros”, afirma.
A CargoX não divulga seu faturamento até agora, mas o CEO garante que a empresa tem faturado “milhões” por mês, num crescimento mensal de cerca de 40%. A expectativa é chegar ao final do ano com um faturamento de 50 milhões de reais.
“Tenha uma equipe multidisciplinar. Dessa forma você não precisará terceirizar nem contratar pessoas nos primeiros meses da sua empresa. O time ideal que eu montaria se fosse criar uma nova empresa seria um desenvolvedor, uma pessoa de marketing e uma pessoa de negócios.”
“Fazer o plano de negócios e definir uma estratégia consistente é o começo de tudo. Porém, também é fundamental conversar com pessoas e procurar consultores ou mentores de marketing, financeiros e administrativos. “Em um determinado momento me indicaram o curso do EMPRETEC, que pra mim foi um divisor de águas. Hoje eu aconselharia qualquer um a iniciar com este curso, pois ele me deu uma visão muito clara de como devemos nos posicionar perante a nossa empresa. "Hoje, muitos clientes chegam aqui na Unius sem uma visão clara do seu negócio. Grande parte desses empresários perde parte do investimento inicial com a compra ou contratação de pessoas, empresas e serviços que não foram bem planejados”.
“Para iniciar sem dinheiro, é importante ter um bom plano definido, pois as vendas precisarão acontecer rapidamente para que o negócio gire. Outra alternativa é ter fontes alternativas de renda, caso o plano demore a se concretizar. “No caso da Involves, o plano de negócios era baseado no desenvolvimento de um software que demoraria um tempo razoável para ser comercializável — tempo este que não poderíamos esperar. Para contornar essa limitação, posicionamos a empresa como prestadora de serviços de desenvolvimento de portais, sites e como fábrica de software. Sabíamos que um dia encerraríamos estes serviços alternativos, o que aconteceu no quarto ano de negócio, quando o ‘plano B’ representava somente 10% da receita da empresa, optamos por encerrar estes serviços. “Outra questão muito relevante é o apoio incondicional da família. Como não tínhamos receita nem dinheiro no bolso, contávamos com o apoio dos nossos familiares — ainda morávamos com os pais e não tínhamos custos fixos pessoais. Estava claro que ficaríamos um tempo considerável sem pró-labore nem dividendos, e é preciso estar psicologicamente preparado para isso.”
“Para quem está começando e tem pouco dinheiro, é preciso conhecer e gostar muito do segmento que está querendo empreender. Tendo o conhecimento e gostando muito, o empreendedor precisará trabalhar com afinco, não medindo esforços e horas, com resiliência em busca de seu objetivo e sonho. Aparecerão vários obstáculos que devem ser ultrapassados. Sugiro também dar um passo de cada vez e, à medida que a situação for melhorando, ir fazendo mais investimentos e reinvestindo todo o lucro no próprio negócio.”
Ideias boas devem vir acompanhadas de coragem e de ação. Acredito, seja com muito ou principalmente com pouco dinheiro, deve-se ter atitude e perseverança como aliadas principais para começar um negócio. Mesmo no início de tudo, é necessário identificar o público consumidor, acionar a rede de contatos e se planejar, para ter foco na hora de gastar aquilo que faturar. Ou seja, trabalhar as informações antes mesmo de qualquer investimento, para não gastar dinheiro sem necessidade.
“Comece!!! Todos nós temos pouco dinheiro e não existe o "perfect moment". Sei que nesse exato momento você pode estar com um problema na sua família, mas eu também estou! Comece agora do jeito que der.”
“Defina seu público alvo, seu nicho de mercado e teste sua ideia através de um MVP (minimum viable product). Caso seu público alvo não venha a se interessar pelo produto, é melhor reformular a estratégia ou mudar o business. Não existe coisa pior do que investir tempo e dinheiro em algo que ninguém quer. Uma vez que o business estiver validado, é importante que o empreendedor tenha resiliência, pois não existe sucesso da noite para o dia.”
Utilize o Google Forms [formulário do Google usado para fazer pesquisas, por exemplo] para viabilizar o seu negócio. Teste e converse com seu usuário. Inicie sua jornada com um protótipo, algo que você pode adaptar para a necessidade real do mercado.
“Foque desde o primeiro dia em vender e gerar receita. Não existe negócio sem receita aqui no Brasil. Lá fora é mais comum acontecer de empresas conseguirem aportes de investidores só com a ideia e sem tração (receita). Então, esteja preparado para gastar bastante sola de sapato e muito telefonema! Invista tempo em marketing digital. Existem diversas estratégias e canais que têm um investimento muito baixo ou sem necessidade de investimento, como a geração de conteúdo para o blog da sua empresa.”
“Tem que ter espírito empreendedor e ter como meta realizar as 100 primeiras vendas. Entender absolutamente tudo que passou com esses 100 primeiros clientes antes, durante e depois da compra. Tentar escalar o negócio ao máximo, sem investimento de terceiros, e só procurar por investimento quando seu negócio estiver validado de ponta a ponta.”