Como desafiei gigantes começando num escritório de 1,5m x 2m
Empreendedor serial desde criancinha, Brian Requarth não se deixou intimidar pelos grandes players. Sua empresa, VivaReal, é, hoje, o maior deles
Da Redação
Publicado em 20 de junho de 2016 às 16h39.
Última atualização em 17 de novembro de 2017 às 17h14.
São Paulo - Norte da California, década de 90. Brian ainda tinha seus 8 ou 9 anos de idade, mas já formava muito clara a ideia de ser dono do seu destino.
Seu pai fundou uma empresa que fazia pavimentação para estacionamentos e outros projetos de construção civil. Sua mãe, psicóloga, atendia pacientes em um consultório próprio. Neles, o menino viu o exemplo de que era possível crescer e não ter um chefe.
Entre a infância e a adolescência, se meteu em diversos tipos de iniciativa. Se não estava alugando sua jaqueta do Michael Jordan para os amigos da escola, estaria vendendo doces, relógios, ou dando aulas de natação. Chegando a até 90 alunos na piscina de casa durante o verão, ele conseguia gerar US$1.500 por semana – descontados os 15% de aluguel do quintal, claro, pago aos seus pais.
Todas as “brincadeiras” de empreender sempre tiveram um propósito adulto. E em todas elas, o olho para negócios só foi ficando mais apurado. Na Colômbia, por exemplo, foram mais 4 empresas iniciadas.
Como assim Colômbia?
Outro incentivo que Brian recebeu dos pais foram as viagens que a família fazia. Sempre encantado por outras culturas, acabou se graduando em espanhol na Universidade de San Diego.
Lá, se apaixonou por Andrea. Passada a formatura, ela precisou voltar para casa, em Bogotá. Brian pegou o carro e resolveu que faria uma viagem pela América do Sul até a Patagônia, eventualmente parando para visitá-la. Visita longa! Durou 7 anos no total, dos quais só um estava planejado. A Patagônia nem aconteceu, parou no meio do caminho. Oficializaram a união alguns anos depois, com um casamento colombiano e um norte-americano.
Para se manter no país, o empreendedor desenvolveu algumas ideias. A primeira foi uma escola de inglês, que dava aulas para grupos em empresas.
Eis que, um dia, Brian se vê com o visto vencido. As implicações não eram graves, mas a multa era inevitável. Na fila da imigração para quitar sua dívida, percebeu, próximo a ele, um rapaz alto, de cabelos castanhos, com um passaporte alemão nas mãos. Logo lembrou de um executivo colombiano, seu cliente do curso, que estava buscando aprender o idioma.
“Ei, você não se interessaria em ensinar alemão por um dinheiro extra?”, Brian puxou a conversa. Dali para outros assuntos e para a descoberta de um interesse comum por tecnologia, ele e Thomas Floracks trocaram contatos. Brian não ganhou um professor dessa vez, mas ganhou um sócio.
Juntos, fundaram a ColConnect, versão curta para Colomba Connect (“um nome horrível para uma empresa”, brinca Brian), que construía sites para outras organizações. O primeiro trabalho foi para uma “fazenda de árvores” – comuns nos EUA para produção de madeira e venda de pinheiros no Natal -, onde Brian fazia bicos de papai Noel quando mais novo. Então, se especializaram em sites para corretores imobiliários e expandiram bastante a cartela de clientes.
Só que veio a crise de 2008, e com isso uma evasão da clientela. O tombo foi grande, mas foram ágeis em perceber que o negócio não iria para frente.
O Mercado Livre dos imóveis
Sentado com seu computador em um café um dia, Brian se deparou com um estudo de caso de Harvard trazendo a argentina Mercado Livre, que havia realizado seu IPO no ano anterior. Estudando um pouco mais sobre o modelo de marketplace e refletindo sobre a experiência de encontrar imóveis na América Latina, teve um grande insight: ser a plataforma que pode solucionar esse problema.
Agora o desafio não era só como, mas onde. Decidiram apostar em três mercados potenciais: Colômbia, México e Brasil.
No final de dezembro de 2008, indo de Buenos Aires para o Rio de Janeiro para passar o réveillon, Brian recebe uma solicitação de contato no LinkedIn. A mensagem dizia algo como “Olá, estudamos juntos na Argentina em 2002, estou me reconectando”.
Diego Simon, brasileiro, foi seu colega de classe em um intercâmbio. Brian zomba da situação dizendo que ele provavelmente só buscou uma lista antiga de nomes e saiu adicionando todo mundo. “Mas como eu estava em Buenos Aires naquele momento e já havia decidido abrir um negócio no Brasil, achei uma coincidência interessante. Aceitei o contato e respondi a ele”, diz. “Falei da nossa ideia e também contei que não conhecia ninguém por lá. Perguntei se ele não topava bater um papo”.
Pouco tempo depois, os dois sócios logo convidaram Diego para passar um mês com eles na Colômbia.
Com uma estratégia definida, apertaram as mãos e mandaram ele de volta para o brasil com US$20 mil. Sem contrato nem nada.
Diego começou a operação em um quartinho em São Paulo e trabalhou sozinho por aqui por dois anos.
Melhor pedir desculpas que pedir permissão
De uma lista de 10 caminhos importantes para seguir, priorizaram 3: incluir imóveis no site, gerar audiência e conquistar clientes buscando imóveis. Por mais que fossem interdependentes, teriam que começar pelas imobiliárias. Diego fez mais de 1.000 visitas no primeiro ano, mas o início foi sofrido. “Por que nós anunciaríamos com vocês? Vocês não têm nenhuma propriedade no site”, eles contestavam.
Para enfrentar a resistência, a alternativa seria incluir os imóveis mesmo assim. Foram bombardeados de ligações com ameaças de processo e contrataram um estagiário para gerir a crise. Ele explicava que os corretores não precisavam se preocupar, que o VivaReal geraria contatos para eles. Assim, essas empresas raivosas se tornaram seus primeiros clientes.
A partir disso, Diego encontrou as melhores formas de conquistar novas imobiliáras: 1º, colocando o Brian para fazer ligações. Quando atendentes escutavam um gringo na linha, facilmente passavam a chamada para a direção. 2º, oferecendo uma fase de teste gratuito, sem nenhum compromisso ou esforço por parte do potencial cliente. Com alto investimento em tráfego orgânico, ele pôde atrair compradores e garantir que os anunciantes em trial fossem convertidos em clientes pagantes.
A operação brasileira cresceu e os números convenceram os sócios. Em 2011, concentraram todos os seus esforços no Brasil.
Se mudaram com tudo para um pequeno escritório na rua Frei Caneca e foram – Brian, Andrea e Thomas – dormir no sofá do Diego por alguns meses.
Balança ma$ não cai
Apesar de sempre ter recebido olhares atentos de investidores, dinheiro não veio tão fácil para sustentar os primeiros passos da VivaReal.
Inclusive, por conta de custos imprevistos, Brian precisou vender seu apartamento e pedir dinheiro emprestado da família e de amigos mais próximos, no início. Mas não seria a primeira bronca com verba que ele precisaria enfrentar.
Já instalados no Brasil, com aproximadamente 25 funcionários, o caixa foi minguando. Em junho de 2011, faltando dez dias para terminar o mês, sobravam apenas 87 dólares na conta. Eles tinham instituído uma regra de sempre pagar os salários no prazo, mas dessa vez não ia dar.
“Fiquei fisicamente doente. Senti que era o fim. Eu já tinha investido todo o meu dinheiro e o de vários familiares”, conta Brian.
O fracasso estava mesmo muito próximo. Mas, aos 45 do segundo tempo, um anjo (literalmente) apareceu. Simon Baker era um dos maiores especialistas do mercado imobiliário no mundo e ex-CEO de uma das gigantes do setor. Enfim, fecharam uma rodada de investimento que não só salvou a empresa financeiramente, como agregou um conhecimento extraordinário.
Vale destacar, por 3 anos Brian insistiu que Simon investisse na VivaReal. Foi só quando ele veio a um evento – organizado pelos três sócios no Brasil em apenas cinco dias – que ele percebeu o potencial do time e do negócio. Foi também quando os fundadores perceberam a relevância de investir em conteúdo, um dos segredos para o enorme número de visitantes da plataforma atualmente.
Power to the people!
O “modelo Simon Baker” de preços baixos de entrada, planos ilimitados e simplicidade foi introduzido e, com muito trabalho duro, o negócio disparou. Mesmo com players mais antigos e consolidados no mercado, o VivaReal tomou a liderança e recebeu injeção de capital de vários outros anjos e fundos.
Hoje com 4 milhões de imóveis ativos e 15 milhões de visitantes por mês, o VivaReal é o maior marketplace que conecta corretores e imobiliárias com quem busca propriedades para alugar ou comprar. A estrutura ocupa um prédio de onze andares na Bela Cintra, em São Paulo, que comporta 300 colaboradores, além de outras startups selecionadas, às quais a empresa cede o espaço por tempo determinado.
Outros 140 colaboradores estão espalhados nos outros escritórios pelo país.
A missão, como a parede do escritório mostra em letras bem grandes, é ajudar as pessoas a encontrarem o imóvel de seus sonhos. “Power to the people” é, aliás, um mote para Brian:
“Tornando processos mais transparentes, elas assumem o comando no processo de decisão e são empoderadas para melhorarem suas próprias vidas”.
Na parede estão também os valores da empresa, que os próprios funcionários reformularam coletivamente. Por falar em coletivo, as áreas de convivência agregam mesas de ping-pong, pufes, grama sintética e até a presença da cachorrinha Dalila, que todo fim de semana vai para a casa de algum funcionário (a lista de espera é de três meses!). Tudo como manda o figurino das empresas mais queridas do Vale do Silício.
Mesmo com porte de PME, a cultura de startup nunca se perdeu. Aliás, quando o assunto é essência, nada se perde. No 9º andar, tem até a réplica do primeiro escritório do Diego, de 1,5m x 2m. A história da empresa é contada com fotos e texto em biombos, para que ninguém esqueça do trabalho que deu e do longo caminho ainda a percorrer.
O poder do exemplo
É fácil perceber, por sua trajetória e energia, que Brian é altamente inquieto. Admite que ultimamente, com dois filhos, tem se esforçado para dosar esse lado e chegar em casa mais cedo. Mas um espírito empreendedor incansável e a vontade de genuína de deixar um legado que fez com que ele seguisse em frente nos momentos mais difíceis e levasse a VivaReal a um crescimento de quase 100% ao ano.
Para continuar nessa curva acelerada, Brian agora conta com a ajuda de uma rede de mentores composta pelos maiores empreendedores e especialistas em negócios do país. Após passar por um criterioso processo seletivo, Brian Requarth foi aprovado como Empreendedor Endeavor no 64º Painel Internacional de Seleção (ISP) em Madrid, Espanha, no último 27 de Abril.
Perguntado sobre o sonho daqui para frente, Brian diz que é injusto falar de um só. “Eu diria que já estou vivendo o sonho nos últimos anos, mas falando da empresa, um sonho é que a VivaReal seja sinonimo de imóveis. Ainda estamos bem longe disso. O fato de ter milhões de usuários é demais, mas queremos nos tornar essenciais, ajudar todo mundo a tomar uma boa decisão com total transparência”.
O outro sonho é pessoal. Afinal, se os pais de Brian tiveram tanta culpa pelo grande empreendedor que ele se tornou, é natural que ele passe isso adiante. “Quero ser o melhor pai possível, ser um exemplo para meus filhos”. Tudo indica que ele está no caminho certo.
Texto originalmente publicado nosite da Endeavor.