Volkswagen: Acordo com Argentina deve ser ampliado por três anos
Está em discussão o índice flex, nome que o setor dá para o total que pode ser exportado pelo Brasil em relação ao total importado da Argentina
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de julho de 2018 às 19h51.
Última atualização em 19 de julho de 2018 às 20h23.
O acordo entre Brasil e Argentina para o comércio de veículos, que expira em 2020, deve ter seu prazo de vigência ampliado por mais três anos, disse em entrevista exclusiva, o presidente da Volkswagen para a região da América do Sul e Caribe, o argentino Pablo Di Si, que tem acompanhado de perto as negociações entre os governos dos dois países.
Segundo ele, a ampliação do acordo por mais três anos é praticamente um consenso entre as partes. O que está em discussão é o índice flex, nome que o setor dá para o total que pode ser exportado pelo Brasil em relação ao total importado da Argentina. Hoje, para cada US$ 1 importado da Argentina, o Brasil pode exportar US$ 1,5. A ideia é ampliar esse limite para algo entre US$ 1,6 e US$ 1,8.
O anúncio oficial das mudanças no acordo, segundo Di Si, deve ocorrer ainda neste segundo semestre. Com a continuidade do flex, seria enterrada, pelo menos até 2023, a possibilidade de um livre comércio para veículos entre os dois países, uma antiga reivindicação das montadoras instaladas no Brasil. Na conversa com o Broadcast, o executivo também falou sobre outros temas, como Rota 2030, mercado doméstico e eleições. Seguem os principais trechos da entrevista:
Antes do lançamento do Rota 2030, a Volkswagen já trabalhava com um plano de investir R$ 7 bilhões até 2020. Com o anúncio do programa, os investimentos podem ser revistos?
Os R$ 7 bilhões nunca estiveram em risco, com ou sem Rota 2030. Nos comprometemos com o Brasil e o governo de que o plano seria mantido. O que temos em estudo são investimentos adicionais. E minha percepção, mas não há nada decidido, é que nós vamos acelerar ainda mais, estou otimista para isso. Inclusive, já começamos a contratar. Contratamos 240 pessoas para a fábrica de São Carlos (SP), há dois meses, e agora mais 50 na fábrica de Taubaté (SP).
Os R$ 7 bilhões em investimentos serão mantidos independentemente de quem vença a eleição presidencial em outubro?
Antes de eu chegar [Di Si assumiu a Volkswagen na região em outubro de 2017], quando o mercado ainda estava no seu pior momento, o plano de investir R$ 7 bilhões já existia. Então, nós olhamos o Brasil e a região a longo prazo. E olhamos de forma otimista. Isso não vai mudar.
E qual a sua expectativa para a eleição?
Eu não acho nada. Em primeiro lugar, a Volkswagen é apolítica. E eu, como estrangeiro, respeito o processo eleitoral o Brasil. O que eu gosto no Brasil é que é um país com instituições fortes, com pessoas qualificadas, como o Banco Central (BC), por exemplo. Eu nunca vou falar de candidato A, B ou C. O importante é que Brasil já consolidou a democracia e que venha a pessoa eleita pelas pessoas.
Já há quem esteja revisando suas previsões para o mercado de veículos em 2018 por causa da greve dos caminhoneiros. A Volkswagen se inclui nesse grupo?
O mercado vai crescer um pouco menos do que se esperava. Antes achávamos que as vendas chegariam a algo entre 2,5 milhões e 2,55 milhões de unidades. Agora, esperamos algo entre 2,45 milhões e 2,5 milhões de unidades. E o motivo não é só a greve. A Copa do Mundo também afetou, com o fluxo nas lojas caindo nos primeiros 10 dias de julho. Além disso, ainda não vimos o efeito da eleição, que deve chegar durante a campanha, de forma positiva ou não. O câmbio também é um ponto de atenção.
O aumento do dólar deve elevar o preço do carro no Brasil, em razão dos insumos importados?
O câmbio não tem afetado porque a presença de conteúdo nacional na fabricação do veículo é muito relevante. E todos estão tentando absorver a alta do dólar: montadoras, fornecedores e concessionárias.
As vendas diretas ganharam relevância e hoje são 40% do mercado brasileiro. Qual a estratégia da Volkswagen para esse segmento?
A vendas diretas ganham maior relevância no mundo todo, não só no Brasil, porque muitos dos mais jovens não querem comprar carro, mas sim utilizar o serviço do carro. Na Volkswagen, o crescimento nesse segmento tem de ser sustentável e coerente, sem fazer loucuras. Se aparece uma oportunidade de venda direta em que eu perco dinheiro, eu rejeito.
A meta da Volkswagen é chegar à liderança quando?
Não temos meta para liderança. Tem de ser sustentável e coerente. Desejamos ser líderes? Claro que sim. Mas, se para atingir a liderança, eu preciso fazer venda direta com prejuízo, a resposta é não. Eu prefiro abrir mão da liderança e ser sustentável e coerente. Temos de ganhar o jogo com base em produto e preferência do consumidor.
A Argentina, que é o principal destino das exportações do Brasil, tem sofrido com a disparada do dólar e dos juros. Isso tem afetado as exportações da Volkswagen?
O problema da Argentina não é só juros e câmbio. É o déficit fiscal. O presidente Mauricio Macri entende isso e faz ajustes, mas não na velocidade desejada. Além disso, os juros sobem nos EUA e tiram capital da Argentina, disparando o dólar e elevando juros na Argentina. O resultado é uma retração de todos os setores. O mercado argentino em 2018 deve ficar estável ou um pouco menor que o de 2017. Por isso, já reduzimos produção do Brasil destinada à Argentina, mas estamos compensando com mais produção para o Brasil e outros países, como Chile e Colômbia. No fim das contas, devemos exportar, somando todos os destinos, uns 6 mil veículos a menos do que esperávamos.
Como estão as negociações entre Brasil e Argentina para ampliar o acordo automotivo?
Estão próximas do fim. Houve mudança no posto de ministro da Produção Argentina [Francisco Cabrera deu lugar a Dante Sica], um cara que conhece muito de indústria e esteve em Brasília, na semana passada. Vou me reunir com Dante, que conheço há muito tempo, e o Mdic. Acho que as duas partes têm um bom entendimento. Eu sei que governo argentino ofereceu estender o prazo do acordo por mais três anos e há um consenso para isso. A discussão do momento é se vai aumentar o flex, de 1,5, para 1,6, 1,7 ou 1,8. Em duas ou três semanas, haverá mais uma reunião entre os dois governos e estou otimista. Acho que será anunciado neste semestre.
Como estão as conversas para exportações para países fora da América do Sul, principalmente Oriente Médio e África?
As negociações estavam em bom ritmo até o ano passado. Mas com tudo o que tem acontecido [em referência a aumentos de tarifas de importação], principalmente por parte do governo norte-americano, a situação esfriou um pouquinho. Está todo mundo esperando, mais retraído. Mas é um foco para nós, precisamos converter o Brasil em exportador para fora da América Latina.
No fim de junho, a Volkswagen anunciou parceria global com a Ford para desenvolvimento de veículos comerciais. O que está sendo preparado?
Não posso dar muitos detalhes, mas é uma parceria sólida. Estamos estudando muitos projetos. E se funciona bem para as duas partes, isso é muito positivo. Os estudos estão em aberto para qualquer tipo de veículo, mas, obviamente, o foco é veículo comercial, pois se entendeu que há demanda reprimida. E estamos otimistas que podemos chegar a ter alguns projetos em conjunto no Brasil e na região, que adicione valor para Ford e Volkswagen.