O que essas sete empresas fazem para serem um exemplo de gestão — e como replicar no seu negócio
Consultoria global Deloitte premiou sete novas empresas brasileiras que se destacam em critérios como ESG, inovação e governança
Repórter de Negócios
Publicado em 9 de maio de 2024 às 14h00.
Última atualização em 3 de junho de 2024 às 12h01.
Pode perguntar para os empreendedores brasileiros quais são as maiores dificuldades de suas empresas quando elas estão em uma toada de crescimento. A resposta será praticamente a mesma para todas: como organizar a gestão do negócio para ele suportar um aumento de demanda, vendas e receita.
Para quem possa estar nessa fase do negócio, com dúvidas sobre como estruturar a empresa para que ela decole de maneira segura, a boa notícia é que há diversos exemplos brasileiros que já passaram por essa fase -- e se deram bem.
Há três anos, a consultoria Deloitte, uma das maiores do mundo, reconhece empresas cuja gestão são um exemplo no país. Trata-se do selo Empresa com Melhor Gestão, que já existe globalmente há 30 anos.
Para concorrer, as empresas precisam preencher critérios como receitas acima de 100 milhões de reais, alguns anos de expansão no faturamento, balanço auditado nos últimos três anos e ainda não estar listada em bolsa. Para a consultoria, empresas nesse estágio da vida costumam estar preocupadas com um salto de qualidade na gestão capaz de, se tudo correr bem, colocá-las na elite do mundo corporativo.
Para as empresas elegíveis, são analisados os seguintes critérios:
- Estratégia e ESG
- Capacidade e Inovação
- Cultura e Compromisso
- Governança e Finanças
O intuito da pesquisa da Deloitte é encontrar as empresas já preparadas para uma expansão acelerada. No mundo, mais de 1.300 companhias já receberam o selo.
Nesta edição, a consultoria convidou uma gama de empresas para participar do ranking. Ao todo, 112 companhias foram analisadas, e 71 delas, convidadas a participarem. Depois, houve uma triagem até que restaram as 17 vencedoras.
Das ganhadoras deste ano, 10 já venceram edições anteriores e tiveram suas histórias contadas pela EXAME. São elas:
- Cooperativa Agrária, do Paraná (venceu as edições de 2021, 2022 e 2023)
- Coco Bambu, do Ceará (venceu as edições de 2021, 2022 e 2023)
- Cooperativa Cocamar, do Paraná (venceu as edições de 2021, 2022 e 2023)
- Farmax, de Minas Gerais (venceu as edições de 2021, 2022 e 2023)
- Farmácias Nissei, do Paraná (venceu as edições de 2021, 2022 e 2023)
- Gazin, do Paraná (venceu as edições de 2022 e 2023)
- Masterboi, de Pernambuco (venceu as edições de 2022 e 2023)
- Santa Helena, de São Paulo (venceu as edições de 2022 e 2023)
- Café 3Corações, do Ceará (venceu as edições de 2022 e 2023)
- Usina Cocal, de São Paulo (venceu as edições de 2022 e 2023)
Agora, outras sete companhias entram pela primeira vez no prêmio da Deloitte. São negócios já estruturados em suas áreas que tiveram suas práticas qualificadas pela consultoria. A EXAME conversou com essas empresas para entender o que fez elas ganharem o selo.
“O destaque neste ano ficou para o pilar de Capacidade e Inovação, no qual as empresas demonstraram melhor distribuição do portfólio de inovação: melhorias nos processos e desenvolvimento de novos produtos e serviços existentes e apresentaram projetos de inovação de longo prazo que buscam criar novas áreas de negócios, produtos ou serviços completamente novos e disruptivos", afirma Ronaldo Fragoso, líder de ecossistemase alianças da Deloitte.
"Outro pilar de destaque foi Cultura e Compromisso, no qual as empresas apresentaram maturidade relacionados a diversidade, equidade e inclusão. Demonstraram forte cultura corporativa e legado, desenvolvendo ativamente seus colaboradores e equipe de liderança, criando uma cultura inclusiva”.
Moura
Vem de Belo Jardim, em Pernambuco, a primeira vencedora inédita do ano. A Acumuladoras Moura, mais conhecida como Moura, por suas baterias, nasceu em 1957 pelas mãos dos empreendedores Edson Mororó Moura e sua esposa, Conceição Moura. Voltada inicialmente para o ramo automotivo, a empresa ampliou a sua atuação para outros segmentos, produzindo, hoje, baterias e sistemas de acumulação de energia para as mais diversas aplicações, como motos, barcos, empilhadeiras, nobreaks, metrôs, trens, estações de telefonia, sistemas de armazenagem, entre outros. A empresa, que fatura mais de 2 bilhões de reais por ano, tem hoje 80 distribuidores espalhados por quatro países e conta com cerca de 3.700 funcionários.
A pernambucana levou o prêmio neste ano por uma série de questões. No braço ESG, por exemplo, conta com uma estrutura própria focada em sustentabilidade e questões sociais há três anos. Por ali, trabalha investindo em educação para a comunidade de Belo Jardim por meio do Instituto Conceição Moura. No cerne ambiental, trabalha desenvolvendo novas tecnologias, como aquelas capazes de armazenar energia, o que, no futuro, poderá fazer com que haja substituição do uso da matriz elétrica nacional.
Na parte de inovação, a empresa se destaca por ter um comitê de estratégia e inovação com especialistas que desenvolvem novos produtos.
Falando em comitê, a empresa também tem um grupo que acompanha as práticas de gestão de pessoas. Entre os destaques da Moura nesse âmbito estão um programa de identificação e formação de talentos no agreste pernambucano. Também conta com uma universidade corporativa e o Trilha Moura, programa de desenvolvimento interno.
Por fim, mas não menos importante, apesar de ser uma empresa familiar, o grupo possui dois conselhos de administração, um para cada frente de negócio (indústria e distribuição) com participação de membros independentes.
“A empresa é líder no segmento que atua, com atuação relevante no desenvolvimento e inovação dos seus produtos junto as montadoras. Possui iniciativas relevantes voltadas a inovação do seu modelo de negócio. Destaque para o impacto social que a empresa promove no interior de Pernambuco, cultura e gestão de pessoas reconhecida e premiada pelo mercado, resultados econômicos e financeiros e estrutura de governança consolidada”, diz a Deloitte ao falar o que chamou a atenção na empresa.
Enxuto
A história dessa vencedora começa com o empresário João Batista Gonçalves vendendo arroz em 1963 na cidade de Campinas. Quatro anos depois, abriu um cerealista para vender secos e molhados. Foi o gatilho para, em 1973, inaugurar o primeiro supermercado Enxuto. Hoje, a rede varejista tem 41 lojas, entre hiper e supermercados e lojas de bairro (ou até mesmo aquelas de conveniência em condomínios). Com 1.300 funcionários, faturou 551 milhões de reais no ano passado.
Um dos principais motivos para a empresa ter recebido o selo está na sua frente de inovação. A Enxuto é uma referência na área e serve até de benchmark para outros negócios do setor.
“Sou um ávido aproveitador de ideias”, brinca o diretor presidente da empresa, Samuel Vanio. “Tivemos o primeiro carrinho inteligente, em que o cliente paga as compras direto no carrinho. Também temos o primeiro self checkout para grandes volumes. E na área de ESG, temos um caixa específico nas nossas lojas para aquelas pessoas que querem passar um tempo conversando com o atendente. Um caixa sem pressa”.
Outro ponto de destaque é a estrutura de governança, inclusive com conselhos de administração e auditoria, comitês de riscos e um conselho de sócios.
“Esse forte espírito de governança que nós temos foi implementado há 14 anos a partir de um movimento das famílias fundadoras de que a empresa precisava pensar em sua perenidade”, afirma Vanio. “E para ser perene, ela precisava se profissionalizar. Com isso, criamos os conselhos que cumprem seus papéis na governança sem se sobrepor”.
Copersucar
Com sede em São Paulo e atuação no interior paulista, a Copersucar é uma empresa reconhecida no setor sucroenergético (em outras palavras, de derivados de cana de açúcar) que começou suas atividades em 2008. O modelo de negócio da Copersucar abrange toda a cadeia de açúcar e etanol, desde o acompanhamento da safra no campo até os mercados finais, incluindo etapas de armazenamento, transporte e comercialização.
Com 37 unidades produtoras sócias localizadas nos estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Goiás, a empresa é líder global na comercialização de açúcar e etanol e a maior exportadora brasileira desses produtos. Faturou, em 2022, 70 bilhões de reais.
Entre os motivos que fizeram a empresa ser uma das ganhadoras deste ano está o seu braço de inovação. Um dos maiores investimentos do último ano foi em gestão e inteligência, mapeamento e automação de processos. Também tem uma plataforma interna de desenvolvimento semelhante à Netflix, na qual funcionários podem acessar documentos de maneira mais ágil.
Na área de governança, a empresa realiza seus controles financeiros por meio de uma equipe específica que prepara as visões financeiras segregadas por produto e outras aberturas. A empresa possui ainad uma equipe própria que avalia o capital de giro e faz análise de crédito.
Grupo Cornélio Brennand
Localizado em Recife, Pernambuco, o Grupo Cornélio Brennand é uma corporação centenária que atua em diversos setores, incluindo a geração de energia renovável, vidros planos, desenvolvimento imobiliário e cimento. A empresa é dona da marca de vidros Vivix, uma das grandes do setor, com um faturamento já na casa do bilhão de reais.
Entre os exemplos de destaque na estratégia ESG, estão workshops e reuniões mensais com os funcionários para manter uma comunicação clara sobre os objetivos e progressos de sustentabilidade. A empresa também investe em pesquisa e desenvolvimento para se manter na vanguarda de seus setores de atuação. E inova também internamente. O grupo usa uma tecnologia, por exemplo, que gerencia e automatiza atendimentos e processos de TI até a gestão de riscos e compliance, que garantem a conformidade com a governança definida pelo grupo.
Mas o grande ponto da empresa é seu braço de governança, apoiado por três principais pilares: Propriedade, Família e Negócios. Cada pilar é gerenciado para assegurar a tomada de decisões, com ênfase na transparência e responsabilidade fiscal. A governança familiar, por exemplo, é modelada para preservar os interesses dos acionistas e garantir a perenidade da empresa.
Petrobahia
Sediada em Salvador, Bahia, a Petrobahia é uma empresa de destaque no setor de energia, especialmente focada na distribuição de combustíveis. Fundada há mais de 20 anos, a empresa se consolidou como líder regional no fornecimento de combustíveis e derivados de petróleo.
Atualmente, a Petrobahia emprega mais de 400 funcionários e opera uma rede de distribuição abrangente que cobre diversos estados do Nordeste brasileiro.
Para entrar no prêmio, o principal ponto de destaque foi a sua gestão profissionalizada, mesmo sendo uma empresa familiar. "Somos auditados desde 2001 e temos valorizado conselho como o da família e outro de administração, com a maioria independente, isso grante a longevidade das organizações", diz o CEO da Petrobahia, Thiago Andrade.
A empresa também implementou várias iniciativas para reduzir seu impacto ambiental, incluindo investimentos em tecnologias limpas e programas de responsabilidade social que beneficiam as comunidades locais.
SLC Máquinas
Originária de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul, a SLC Máquinas, outra vencedora inédita do prêmio da Deloitte deste ano, é um braço da SLC Agrícola, uma das maiores produtoras de commodities agrícolas do país. Fundada em 1977, a empresa gerencia aproximadamente 670.000 hectares de área plantada espalhados por 22 unidades de produção em sete estados brasileiros. Sua matriz está localizada em Porto Alegre.
Atualmente, a SLC Máquinas emprega cerca de 650 pessoas.
A empresa chamou a atenção este ano não apenas pelo seu crescimento significativo de 20% a 30% no faturamento entre 2021 e 2022, mas também por sua robusta gestão e inovações. Em termos de estratégia e ESG, a SLC Máquinas possui uma visão, missão e valores bem definidos, com um planejamento estratégico que inclui diretrizes da presidência, opiniões de especialistas, pesquisas com clientes, e uma análise detalhada do mercado e da comunidade ao redor. Além disso, possui um relatório de atividades socioambientais que pode ser conferido por todas as pessoas. Um artigo de luxo para o setor agrícola.
No aspecto de inovação, a SLC se destaca por promover uma cultura de intraempreendedorismo e por fomentar o ecossistema de startups, que inclui aceleração, mentoria e incubação, com o objetivo de diversificar receitas através de novos produtos e serviços. A empresa também é ativa no desenvolvimento de novas tecnologias para otimizar seus processos e ofertas aos clientes.
Internamente, a empresa tem um programa de avaliação de competências desde 2013 e oferece treinamentos, consultorias e coaching para os funcionários. Desde o ano passado, também adotaram um programa de saúde física, mental e de segurança do trabalho para os 650 empregados.
UPL
A última vencedora inédita dessa edição do prêmio está sediada em Campinas, São Paulo. A UPL, sigla para United Phosphorus Limited, é uma empresa do setor agrícola originada na Índia. Originalmente uma indústria química que atendia a diversos mercados, se especializou no setor agrícola nos anos 1980. No Brasil, está desde 2011, quando comprou o controle da subsidiária brasileira do grupo alemão DVA. Em solo brasileiro, a empresa emprega 916 funcionários e tem se destacado por suas práticas sustentáveis e inovadoras .
Em 2023, a UPL chamou atenção por seu crescimento consistente, registrando um aumento de 10% a 20% no faturamento entre 2021 e 2022. Com uma forte ênfase em Estratégia e ESG, a UPL redefiniu sua missão, visão e valores, alinhando-os com treinamentos intensivos para toda a equipe, com o objetivo de solidificar esses direcionadores estratégicos. Seu relatório de sustentabilidade foca em programas educacionais para mulheres e crianças, destacando-se também por ações voltadas à redução de carbono e parcerias para energia limpa.
A inovação é um pilar central na UPL, com investimentos significativos em P&D e produtos naturais inovadores, principalmente no Mato Grosso. A empresa investe cerca de R$ 30 milhões anuais em inovação, utilizando a Lei do Bem para apoiar seus projetos, além de integrar suas atividades de marketing estratégico e regulatório para promover inovações alinhadas às necessidades do mercado e de seus clientes.
Na parte de gestão de pessoas, faz um processo de revisão semestral dos funcionários e possui um sistema global de treinamento, que disponibiliza, entre outras coisas, aulas de idiomas.
Como essas empresas pensam
O prêmio também consegue tirar alguns insights sobre o que essas 17 empresas vencedoras estão mirando para o futuro de seus negócios. Por exemplo, para 94% delas, uma das ações prioritárias para aumentar a receita nos próximos cinco anos é desenvolver novos produtos e serviços. Para 88%, será preciso também desenvolver alianças e parcerias. A maioria também entende que deve crescer organicamente, melhorar margens e expandir para outros mercados no Brasil. Quatro em cada dez empresas também estudam fusões e aquisições.
Já na lista dos principais desafios para essa receita crescer estão:
- Reduzir custos
- Desenvolver novos produtos
- Retenção de profissionais qualificados
- Manter uma cultura corporativa de engajamento