ZALANDO: por décadas, varejistas buscaram inspiração na Amazon; agora, as melhores ideias vêm da China / The New York Times
Da Redação
Publicado em 2 de janeiro de 2017 às 09h16.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h42.
Mark Scott
© 2016 New York Times News Service
Berlin – Robert Gentz saiu de um voo da Air Berlin em Pequim com o objetivo de conquistar a moda virtual na China. Quando embarcou no voo de volta para Berlim, tinha um novo plano: copiar o modelo chinês.
Gentz, alemão de 34 e fundador da Zalando – o clone europeu da Zappos, a loja virtual norte-americana especializada em sapatos e roupas, que pertence à Amazon – realizou reuniões no segundo semestre de 2013 com marcas chinesas e internacionais, lojas virtuais e outros integrantes do setor de e-commerce local. Ele queria levar sua empresa para o maior mercado digital do mundo.
Contudo, após algumas reuniões, Gentz percebeu que a forma como a China encarava a moda virtual estava à frente de tudo o que existia em outras partes do mundo. Ele ficou impressionado com o fato de os clientes conversarem livremente – e comprarem – sobre marcas e estilistas pelo WeChat, o serviço de mensagens local, enquanto lojas on-line, empresas de entrega independentes e grifes muitas vezes participam do esquema.
“Nos queríamos levar essa experiência de volta para a Europa”, afirmou Gentz.
A Zalando, que é a principal loja virtual de moda da Europa, passou a utilizar a abordagem chinesa para combater a Amazon, assim como a gigante americana busca se firmar como a principal empresa de e-commerce do mundo, expandindo-se de forma agressiva pelo universo europeu da moda virtual, ainda bastante fragmentado no continente.
Poucas empresas foram capazes de impedir os avanços da Amazon – a maior loja virtual de artigos de moda dos Estados Unidos – depois que ela entra no mercado. A principal exceção é a China, onde concorrentes como o Alibaba, a maior empresa de e-commerce do mundo em termos de valor de mercado, conseguiram preservar sua participação no mercado.
Durante décadas, as empresas de tecnologia aprenderam tudo com o Vale do Silício. Contudo, a maneira como a Zalando aprendeu com as empresas chinesas representa a nova estratégia de buscar inspiração no Oriente, ao invés do Ocidente.
Ao transformar sua bem sucedida loja virtual europeia em uma plataforma digital, a Zalando não busca mais acompanhar os passos da Amazon e seus avanços logísticos e tecnológicos.
Anteriormente, a empresa alemã tentava lidar com todas as vendas e estoque. Mas com a venda direta aos consumidores, a empresa agora deseja se transformar em uma espécie de shopping virtual, permitindo que as grifes e outras lojas realizem as vendas, muitas vezes sem participação direta da Zalando no processo.
Essa iniciativa, que já está sendo gestada há cerca de um ano, pode ajudar a criar uma empresa de tecnologia europeia capaz de dar trabalho às concorrentes vindas do Vale do Silício que chegam à região, que continua a ser um dos maiores e mais rentáveis mercados do mundo.
“Se você deseja ser uma força dominante nessa área geográfica, é preciso fazer mais do que ser uma loja virtual tradicional”, afirmou Erik Mitteregger, membro da diretoria da Kinnevik, empresa de investimento sueca que foi uma das primeiras a injetar dinheiro na Zalando e que ainda é dona de 32 por cento dela. “Essa jogada é fundamental”.
Contudo, a inspiração chinesa traz desafios para a Zalando.
Apesar da dominância doméstica, empresas chinesas como o Alibaba ainda não foram capazes de replicar seu modelo de negócios em outros países. Os hábitos de compras virtuais dos europeus também são diferentes daqueles dos chineses. Além disso, a Amazon e os concorrentes europeus, incluindo ASOS e Yoox Net-a-Porter, podem superar a Zalando com sua abordagem tradicional.
Para a maioria dos americanos – e até mesmo alguns europeus fora dos mercados de língua alemã – a Zalando não é uma marca conhecida.
Ela foi criada em 2008 como uma startup berlinense fundada por Gentz e David Schneider, dois graduados em administração de empresas que tentaram – e falharam –criar um concorrente latino-americano ao Facebook. Em 2014, a Zalando havia se tornado a maior empresa de tecnologia europeia a abrir seu capital desde o ano 2000. Entre as primeiras empresas que colocaram dinheiro na Zalando estão a Rocket Internet, uma incubadora berlinense conhecida por copiar ideias de negócios virtuais bem sucedidos, e a DST Global, que investiu no Facebook, Twitter e Alibaba.
Para se adaptar às necessidades dos mercados nacionais europeus, a Zalando adaptou suas ofertas. Na Alemanha, onde poucas pessoas usam cartões de crédito, os clientes podem pagar com a ajuda de um serviço on-line de débito em conta corrente só depois de receberem as roupas pelo correio. Na Itália, a empresa trabalhou em parceria com uma empresa de entregas local para que as os clientes que tivessem medo de não receber os produtos pudessem pagar em dinheiro no momento da entrega dos pedidos.
Embora outros concorrentes europeus tenham clientes fiéis, a Zalando continua a ser a maior – tanto em valor de mercado, quanto em volume total de vendas –, de acordo com a Euromonitor. A empresa espera duplicar seu lucro antes dos impostos em 2016, chegando a US$ 220 milhões, e o faturamento bruto deve aumentar 20 por cento, chegando a US$ 4 bilhões, de acordo com a estimativa média dos analistas.
“A Zalando é a plataforma líder no mercado de moda europeu”, afirmou Andrea Ferraz, analista da Morgan Stanley em Londres.
Ainda assim, a empresa continua relativamente pequena – seu valor de US$ 9,5 bilhões representa a quadragésima parte do valor da Amazon. E o crescente mercado virtual de moda na Europa, avaliado em US$ 75 bilhões, não passou despercebido pelas gigantes do e-commerce.
A Alibaba contratou gestores nacionais e trouxe seu serviço de pagamento para a Europa, especialmente para permitir que seus clientes chineses pagassem dessa maneira no continente. A Amazon também abriu um estúdio de moda em Londres e se uniu ao Conselho Britânico de Moda para melhorar sua credibilidade na região.
Para competir com a Amazon e outras empresas, a Zalando investiu pesado em uma rede de centros logísticos por toda a Europa.
Para Nicolas Borg, executivo de estratégia da Zalando e ex-funcionário do eBay, o próximo passo provavelmente serão os chatbots, ou chats operados por uma inteligência artificial que oferecem dicas de moda aos clientes em plataformas como o Facebook Messenger.
“No futuro, o mais importante não será o local onde a venda acontece, mas como somos capazes de influenciá-la”, afirmou Borg.
“Esse é o nosso maior desafio. Como mudar a experiência de compras na rede?”