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Na Samsung, é hora da reconquista

David Cohen Para a Samsung 2016 tem sido especialmente doloroso. Nos últimos meses, dois recalls gigantescos – de um smartphone e de vários modelos de máquinas de lavar – abalaram sua imagem. Como se não bastasse, a empresa foi envolvida no escândalo que ameaça o mandato da presidente Park Geun-hye. Para tentar acalmar seus investidores, […]

SEDE DA SAMSUNG, EM SEUL: escritórios do grupo foram vasculhados duas vezes pela polícia, que buscava evidências de pagamento de propina a uma amiga da presidente / Kim Hong-Ji/ Reuters
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Da Redação

Publicado em 29 de novembro de 2016 às 10h39.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h13.

David Cohen

Para a Samsung 2016 tem sido especialmente doloroso. Nos últimos meses, dois recalls gigantescos – de um smartphone e de vários modelos de máquinas de lavar – abalaram sua imagem. Como se não bastasse, a empresa foi envolvida no escândalo que ameaça o mandato da presidente Park Geun-hye.

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Para tentar acalmar seus investidores, a Samsung anunciou na segunda-feira 28 um plano de ações para elevar seu valor de mercado. O plano inclui acelerar a recompra de ações (o que eleva seu preço), pagar dividendos maiores aos acionistas e contratar um profissional independente para fazer parte de seu conselho de administração.

Além disso, a companhia planeja “reforçar a governança corporativa com a criação de um novo comitê de governança, composto apenas de conselheiros independentes”, segundo o comunicado oficial. E prometeu “uma avaliação minuciosa para definir qual a melhor estrutura corporativa”. Traduzindo: vai estudar a possibilidade de dividir a empresa em duas, criando uma holding no mesmo estilo do Google, que montou a Alphabet no ano passado.

Duas Samsungs?

A pressão para a separação vem do bilionário Paul Elliott Singer, cuja firma Elliott Management detém 0,6% das ações da Samsung. A medida daria mais clareza à gestão da Samsung, isolando a operação da gigante de tecnologia das maquinações do maior conglomerado do país.

Tornou-se comum, nos últimos anos, o fenômeno do “investidor ativista”, em geral com dois tipos de demanda: quando a empresa está bem, ele pede mais dividendos para os acionistas; quando está mal, mudanças na estrutura ou na estratégia. No caso da Samsung, que enfrenta problemas graves mas responde por algo entre 15% e 20% do PIB do país, os investidores querem as duas coisas.

Pelo lado do retorno aos acionistas, Elliott propôs o pagamento especial de 26 bilhões de dólares aos acionistas. Vários investidores apoiaram o pedido. A não ser que a companhia os convencesse de que tinha investimentos promissores a fazer com essa verba, era melhor pagar os acionistas. Aparentemente, a Samsung concordou, prometendo entregar aos acionistas uma parcela maior de seu fluxo de caixa durante os próximos dois anos (este ano, ela já havia se comprometido a entregar entre 30% e 50% do fluxo de caixa, agora firmou-se no patamar superior, de 50%). Também vai passar a pagar dividendos trimestrais a partir de 2017.

Pelo lado das mudanças, os acionistas pedem melhoras na governança. Um passo seria a separação da empresa de eletrônicos do conglomerado (a Samsung tem cerca de 80 companhias diferentes). Elliott também sugeriu o acréscimo de três profissionais independentes ao conselho de administração (a empresa disse que colocará um). “Nós achamos que a Samsung enfrenta algumas ameaças existenciais”, disse Daniel O’Keefe, diretor da firma de investimentos Artisan Partners, à revista Business Week. “Sua estrutura executiva e de governança não está bem adequada à indústria da tecnologia, em constante mudança e altamente competitiva. Faltam conselheiros com experiência em operações globais, tecnologia e alocação de capital.”

Do celular à máquina de lavar

Claro, ninguém se incomodava muito com essa estrutura quando a empresa estava dando resultados fantásticos e se tornou a maior vendedora de smartphones do mundo. Mas os problemas dos últimos meses ficaram escancarados em outubro, com o relatório de resultados do terceiro trimestre: os lucros operacionais, de 4,5 bilhões de dólares, representam uma queda de quase 30% em relação ao mesmo período do ano passado.

Boa parte do problema foi o fiasco de seu celular Galaxy Note 7, que superaquecia quando a bateria era recarregada. O recall do aparelho – uma operação confusa, em que primeiro a Samsung acusou um fornecedor pelo defeito, até que a persistência do problema a obrigou a reconhecer que o problema era de design, não da bateria – deve custar 5,3 bilhões de dólares.

No início deste mês, com menos alarde mas com prejuízo possivelmente similar, veio o recall de 2,8 milhões de máquinas de lavar nos Estados Unidos, que deve impactar o relatório do próximo trimestre (e de alguns seguintes). O recall atinge 34 modelos de lavadoras, todos os com abertura superior, vendidos desde 2011.

O problema é que algumas partes internas das máquinas podem se soltar, provocando uma vibração exagerada e até a ruptura do aparelho. Autoridades americanas disseram que a Samsung recebeu 733 notificações de defeitos, sendo 9 com ferimentos, incluindo uma pessoa que teve a mandíbula quebrada e outra que machucou o ombro.

A presidente sob risco de impeachment

Como se não bastassem os problemas operacionais em produtos de ponta, a Samsung foi arrastada este mês para o escândalo que consome o governo sul-coreano. Escritórios do grupo foram vasculhados duas vezes pela polícia, que buscava evidências de pagamento de propina a uma amiga da presidente.

A alegação de que a Samsung tenha pago um suborno em troca do apoio a uma fusão entre duas empresas do grupo envolveu a companhia em um drama político que parece enredo de novela.

A presidente Park Geun-hye é filha do ditador Park Chung-hee, que governou o país nas décadas de 1960 e 1970. Em 1974, um espião norte-coreano matou a mãe dela, num atentado que era dirigido ao pai. Geun-hye, então com 22 anos, voltou dos estudos na Europa e conheceu Choi Tae-min, o líder de um culto que dizia ter sido visitado pelo espírito de sua mãe e recebido a missão de guiá-la.

Choi tornou-se mentor de Geun-hye, além de conselheiro de seu pai – e ganhou o apelido de “Rasputin da Coreia do Sul”. Sua influência durou até 1979, quando Park foi assassinado. A essa altura, Geun-hye já tinha se tornado amiga íntima da filha de Choi, Soon-sil – a quem agora se acusa de influenciar o governo e enriquecer ilegalmente, coagindo grades empresas a entregar dinheiro para instituições de caridade que ela dirigia (e das quais supostamente ganhava um pró-labore mais generoso do deveria). Esse escândalo alimenta os pedidos de impeachment da presidente, com manifestações de mais de 1 milhão de pessoas nas ruas de Seul.

Por enquanto não há acusações contra a Samsung, mas o caso todo prejudica mais um pouco sua imagem.

A transição de poder

Toda essa crise ocorre num momento de transição de poder dentro da Samsung. Nos últimos dois anos, o presidente do grupo, Kun-Hee Lee, está debilitado após um ataque cardíaco. Seu filho, Jae-Yong Lee, é o provável sucessor. A fusão de empresas (uma de construção, outra química) que supostamente teve o auxílio do governo serviu para dar a Jay Y (como ele é conhecido no Ocidente) uma participação acionária maior nas empresas.

A fusão foi contestada por acionistas, incluindo Elliott, mas acabou aprovada em julho do ano passado. Curiosamente, a proposta de Elliott de criar uma holding poderia ajudar Jay Y e suas duas irmãs a consolidar seu poder na Samsung.

Qualquer mudança, porém, deve demorar pelo menos seis meses para ser decidida e implementada. Até lá, já deverá ter sido lançado o Galaxy 8, que segundo rumores virá com um novo processador, mais memória, maior capacidade de armazenamento de dados e, possivelmente, uma tela curva, além de uma assistente virtual baseada na tecnologia da empresa Viv, que a Samsung comprou este ano.

Depois de manter a confiança dos investidores (basicamente com distribuição de dinheiro) será a vez de tentar reconquistar a dos consumidores.

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