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Cade reprova fusão entre Estácio e Kroton Educacional

Cinco dos seis conselheiros da autarquia antitruste já votaram; quatro deles são contra a fusão

SALA DE AULA DA KROTON: Cade decidiu contra a fusão  (Germano Lüders/Exame)

SALA DE AULA DA KROTON: Cade decidiu contra a fusão (Germano Lüders/Exame)

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Letícia Toledo

Publicado em 28 de junho de 2017 às 20h36.

Última atualização em 28 de junho de 2017 às 21h37.

Uma das decisões mais aguardadas do ano no mercado financeiro finalmente saiu, mas não como o inicialmente previsto. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) reprovou a fusão das duas maiores empresas de educação do país, Kroton e Estácio. Cinco dos seis atuais conselheiros da autarquia antitruste já votaram. Foram quatro votos contra a fusão. A relatora do caso, Cristiane Alckmin, foi a favor da união das empresas com a contrapartida da venda de diversos ativos.

Juntas, as duas empresas formariam uma companhia com valor de mercado de cerca de 30 bilhões de reais e 1,5 milhão de alunos. Desde que as primeiras notícias de que a fusão poderia não sair do papel começaram a sair, na última semana, as ações da Estácio já perderam 12,5% de seu valor. Já os papéis da Kroton, que chegaram a cair 7% na última semana, subiam 3,7% nesta quarta-feira. A decisão do Cade chocou executivos e especialistas do setor. A maioria previa a aprovação com ressalvas como a venda de parte do ensino à distância da Estácio e parte do ensino presencial da Anhanguera, que pertence à Kroton.

A concentração das empresas seria grande. Se nenhum ativo fosse vendido, Kroton e Estácio teriam, juntas, 23% do mercado de educação nacional. A terceira maior empresa do setor é a Ser Educacional, que conta com apenas 150.000 alunos, 10% do total acumulado por Kroton e Estácio juntas. Mas, com a venda de ativos proposta pela Kroton para a aprovação da fusão, a nova empresa teria um total de 18% de participação do mercado, segundo executivos do setor. O percentual seria, portanto, inferior aos 20% que o Cade considera como preocupante para fusões. Abaixo desse patamar, as fusões costumam passar pelo chamado “fast-track” no Cade. Em vez de passarem pelo crivo do plenário do Cade e pelos votos de todos os conselheiros, esses casos são aprovados apenas pela nova Superintendência-geral.

O Cade não tem a política de negar fusões em seus julgamentos. Aconteceu apenas em dois casos que pareceram extremos: a fusão das companhias de alimento Nestlé e Garoto e a união das petroquímicas Braskem e a Solvay Indupa. No geral, quando o Conselho considera que a concentração de mercado será excessiva, a medida para corrigir as distorções é a aplicação de remédios, que ajudam a dar equilíbrio ao mercado mesmo após o fechamento de um grande negócio. Cristiane, relatora do caso Kroton e Estácio, propôs a venda da marca Anhanguera, de cursos presenciais, e da Uniderp, de ensino a distância, em sua decisão. “É preciso vender uma unidade inteira de ensino a distância. Ninguém quer comprar só uma parte. O melhor é a Uniderp, que usa a marca Anhanguera para se alavancar nacionalmente com investimento em marketing nacional”, disse.

Para executivos, o Cade pode ter tomado a decisão de Kroton e Estácio influenciado pelos recentes acontecimentos políticos. “O Cade foi citado na gravação entre Joesley e Temer [em que o empresário reclama interferência política no órgão, com possibilidade de pagamento de propina, para garantir vantagem num processo que move contra a Petrobras] e isso pode ter influenciado uma decisão mais pesada nesse acordo”, afirma o advogado Carlos Monteiro, presidente da CM Consultoria, especializada no setor de educação. A percepção do mercado sobre a fusão também piorou após a divulgação da delação premiada. Desde a divulgação da notícia, no dia 17 de maio, até terça-feira, 27, as ações da Kroton caíram 15% na bolsa, e as da Estácio perderam 20% do valor.

O futuro das empresas

A dúvida do mercado agora é sobre como ficará a vida das companhias daqui pra frente. EXAME Hoje apurou que, apesar de poder recorrer da decisão, a Kroton deverá aceitar a decisão do Cade e mirar outras aquisições. Para não correr o risco de ser barrada novamente pelo Cade, a empresa deverá se concentrar em faculdades de médio e pequeno porte em regiões onde a companhia ainda não atua. O foco seriam cidades das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Ao mesmo tempo, a empresa também deve focar em crescer no ensino à distância e em educação básica. A educação à distância possibilita um crescimento rápido, de baixo investimento e com alta possibilidade de atração de alunos – porque ainda é um mercado com muito potencial a explorar. Hoje, o chamado EAD já responde por 21% do total de matrículas no ensino superior no Brasil. A Kroton, sozinha, detém 37% desse mercado.

Na Estácio há uma dúvida ainda maior: quem vai ficar com a companhia? A empresa permaneceu no limbo durante os mais de 330 dias do processo da fusão. Pedro Thompson, que preside a companhia desde agosto do ano passado, era visto como um executivo-tampão enquanto a fusão ainda era encaminhada. Durante o período, ele virou alvo de ataques de profissionais insatisfeitos com sua gestão. Em março, a fusão entre Kroton e Estácio tornou-se uma mina de especulações após o vazamento de e-mails de Thompson. As mensagens davam a entender que o executivo traçava uma estratégia para barrar a fusão. O presidente chegou a ser afastado e a companhia instaurou uma investigação. Em meados de abril, a investigação foi concluída sem encontrar qualquer evidência de que Thompson estivesse impedindo a fusão.

O problema para a Estácio é que seus resultados pioraram durante as negociações da fusão, enquanto os da Kroton melhoraram. No primeiro trimestre deste ano, a Estácio teve uma queda de 5,3% em sua base de alunos. No ano de 2016, o lucro da companhia caiu 16,4% e fechou em 368 milhões de reais. A margem de lucro operacional também chama a atenção: fechou o primeiro trimestre em 20,5%. Já a margem da Kroton é mais que o dobro, fechou o primeiro trimestre em 46,8%. Em 2016, o lucro da Kroton somou 1,86 bilhão de reais, alta de 33,5% ante o ano anterior. “A Kroton parece ter conseguido minimizar os problemas da redução do Fies em seus resultados, já a Estácio não conseguiu avançar, ficou muito focada na fusão”, diz um executivo do setor.

Mesmo com as perdas, a companhia deve atrair outros interessados. Os principais devem ser a Ser Educacional e o empresário Chaim Zaher, que detém cerca de 10% da Estácio. Ambos disputaram a empresa com a Kroton no ano passado. Fundos de investimento também estão entre os potenciais interessados. O difícil é saber se a companhia será avaliada nos mesmos 5,5 bilhões de reais quando da proposta de fusão com a Kroton. Ontem, o valor de mercado da Estácio estava em 4,57 bilhões de reais. Nesta quarta-feira, as ações caíram mais 1%. A cada dia de incertezas, uma nova queda pode vir.

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