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Coronavírus: o que acontece em caso de quebra de contrato comercial?

Empresas devem ficar atentas para evitar possíveis disputas judiciais decorrentes de falha nas entregas

Expectativa é que o coronavírus resulte em quebra de contratos (Tetra Images/Getty Images)

Expectativa é que o coronavírus resulte em quebra de contratos (Tetra Images/Getty Images)

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Juliana Estigarribia

Publicado em 12 de março de 2020 às 06h00.

Última atualização em 12 de março de 2020 às 12h01.

O coronavírus pode causar estragos no caixa das empresas ao redor do mundo. Com o descumprimento de prazos e entregas de mercadorias e serviços, as empresas precisam ficar atentas às cláusulas dos contratos comerciais para evitar disputas judiciais, inclusive no âmbito internacional.

As perdas no comércio global de bens e serviços podem chegar a 320 bilhões de dólares por trimestre, segundo levantamento da Allianz Euler Hermes, do grupo Allianz. Os prejuízos somente com exportações devem somar 161 bilhões de dólares.

Diante da paralisação de portos na China e seus desdobramentos, os prazos de entregas no comércio global não vêm sendo cumpridos.

Para Walfrido Jorge Warde Junior, sócio fundador do Warde Advogados, especializado em arbitragem e mercados de capitais, o coronavírus traz uma insegurança enorme e pode atrasar muito a recuperação da economia brasileira. “O evento certamente levará ao descumprimento dos contratos, sobretudo se o contágio se prolongar.”

As empresas poderiam, então, lançar mão de um mecanismo comum no direito empresarial, a declaração de força maior, que retira algumas obrigações em casos que fogem ao controle das partes.

No entanto, para Guilherme Rizzo Amaral, sócio fundador do Souto Correa Cesa Lummertz & Amaral Advogados, não é consenso entre os países que o coronavírus possa configurar força maior. 

“Alguns países como o Brasil vão tratar a pandemia como força maior. Mas na Inglaterra, por exemplo, a questão é classificada de maneira mais restritiva: ou o mecanismo está previsto no contrato ou a parte vai arcar com os custos do seu descumprimento”, avalia o especialista em negócios Brasil-China. “Já os chineses têm uma cultura  que privilegia relações de longo prazo, então os empresários do país asiático devem querer renegociar nesse caso”, acrescenta.

A indústria brasileira de eletroeletrônicos, por exemplo, deve amargar uma forte crise decorrente dos desdobramentos do coronavírus, uma vez que a maior parte dos componentes importados do setor vem da China - em 2019, foram 7,5 bilhões de dólares em peças chinesas trazidas pelas empresas de eletroeletrônicos.

Diante deste horizonte, os fabricantes terão que se resguardar. “Quando duas partes assinam um contrato, cada uma delas assume uma parcela de risco. Em caso de um evento externo que abala esse acordo, o mais indicado é que as empresas tentem uma renegociação para não ampliar ainda mais os prejuízos”, afirma Carolina Xavier, sócia do CTP Advogados e cuja tese de doutorado  discorreu sobre renegociação contratual em tempos de crise.

Não são apenas as empresas que importam que podem sofrer reveses. As exportadoras também podem enfrentar dificuldades daqui para frente com a queda na demanda — possível reflexo de um produto interno bruto menor em todo o mundo. Para Georges Dib, economista da Euler Hermes, é provável que o impacto econômico na China seja sentido com maior intensidade durante o primeiro trimestre, dado o fechamento provisório de fábricas e o isolamento de pessoas infectadas. Já na Europa, nos Estados Unidos e no Brasil, as cadeias produtivas devem ser realmente afetadas a partir do segundo trimestre, quando os produtos e insumos estocados devem chegar ao fim.

O resultado cruel dessa história é que o número mero de falências deve aumentar. “A expectativa inicial era que houvesse aumento de 6% de insolvência de companhias em 2020, mas depois do coronavírus revisamos esse número para 7,5%” disse Dib em entrevista exclusiva à Exame.

Para Xavier, a economia global já passou por outros soluços como o vírus da SARS, que em meados de 2003 causou enormes prejuízos à China e seus parceiros comerciais. “Da China vieram gripe aviária, SARS e agora coronavírus. Dificilmente a jurisprudência acolherá a pandemia como imprevisibilidade.”

Impasse

Se as partes não conseguirem chegar a um consenso sobre renegociação, em último caso, a disputa deverá seguir para a Justiça. De maneira geral, os contratos comerciais têm cláusula sobre resolução de conflitos, com eleição de foro para o Judiciário - podendo ser no Brasil ou no exterior - ou cláusula compromissória, que prevê arbitragem.

Se o contrato não discorrer sobre resolução de conflitos, o que é raro, aplica-se, geralmente, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (no caso de contratos firmados do Brasil).

O horizonte é incerto para o controle da doença. Medidas extremas têm sido tomadas, como o isolamento da Itália e suspensão de voos e embarques ao redor do mundo. Neste ambiente, vale cautela para o empresário não cair em situações ainda mais difíceis. “O objetivo final de um contrato comercial é girar a economia. Boa-fé e cooperação são peças-chave para resolver esse tipo de problema”, diz a sócia do CTP.

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