Compra das lojas Makro pelo Carrefour mostra que atacarejo veio para ficar
Atacarejo tem um terço do setor de distribuição de alimentos, mas pode chegar a 50%; oportunidades de aquisição ficam mais interessantes, dizem analistas
Karin Salomão
Publicado em 17 de fevereiro de 2020 às 16h46.
Última atualização em 17 de fevereiro de 2020 às 17h55.
Poucos meses depois de iniciar as conversas, o Grupo Carrefour Brasil adquiriu de 30 lojas da rede Makro no país, como parte da estratégia de acelerar a expansão do Atacadão, sua marca de atacarejo.
A movimentação mostra que o formato, que mistura vendas no atacado e no varejo, foi o que mais cresceu durante a crise econômica e deve continuar relevante mesmo com a retomada da economia. A aquisição foi anunciada ontem, 16. Como resposta, as ações do Carrefour Brasil subiram 3,65% hoje.
A segunda maior aquisição do grupo Carrefour desde que chegou ao Brasil, há mais de 40 anos, evidencia também o novo cenário de crescimento do setor. Com tendências de crescimento mais suaves do que as vistas nos últimos anos, movimentos de fusões e aquisições devem se tornar mais frequentes, analisa o banco Itaú.
"Congratulamos a transação do Carrefour com o Makro, mas também a vimos como uma evidência adicional de que as oportunidades de crescimento orgânico se tornaram menos atraentes", diz o banco Itaú em relatório.Para o banco, a transação agressiva poderia gerar cerca de 1 bilhão de reais em valor à varejista.
Para Sandra Peres, analista da Terra Investimentos, o atacarejo deve continuar sendo um formato forte no médio prazo. Tanto o Carrefour quanto o Grupo Pão de Açúcar, através da bandeira Assaí, investem na abertura de novas lojas. O Assaí abriu 19 lojas nos últimos 12 meses até setembro, ficando com 153 unidades.
Já o Carrefour abriu 12 unidades nos nove primeiros meses do ano. Em 2019, o Carrefour Brasil atingiu vendas brutas de 62 bilhões de reais – 42 bilhões de reais apenas pela marca Atacadão.
"Ainda não vemos sinais de desaceleração no atacarejo. Apesar disso, os grandes grupos, como Carrefour e GPA, também estão investindo em formatos de proximidade, para também oferecer comodidade ao consumidor", diz Peres.
No ano passado, o atacarejo correspondia a um terço do mercado de distribuição de alimentos, competindo lado a lado com hipermercados e supermercados. Há cinco anos, a fatia do atacarejo era de 20%, segundo dados da Nielsen. Daniela Bretthauer, analista da Eleven Research, acredita que essa fatia pode chegar a até 50%.
“O pequeno comerciante sabe que o preço baixo do atacarejo é um dos elementos mais importantes para o seu negócio. E o consumidor final vai continuar fazendo suas grandes compras de volume, de itens como sucos, arroz e feijão, no atacarejo, por conta do preço”, diz ela.
Dificuldades do Makro
O Makro, apesar de ser o terceiro maior atacarejo brasileiro atrás de Carrefour e Grupo Pão de Açúcar, já vinha enfrentando dificuldades há algum tempo.
Segundo a Eleven Research, o crescimento médio de receita do Makro no Brasil no período entre 2013-2017 foi de apenas 3%, enquanto o Atacadão mostrou uma evolução de vendas mais que três vezes superior a este valor no mesmo período.
"Não está claro se o controlador - o grupo holandês SHV - pretende vender as outras lojas que opera na América Latina (total de 167 lojas com presença na Argentina, Venezuela e Peru) ou até mesmo o restante das lojas no Brasil, porém é claro que Brasil era a operação onde encontrava maior competição", diz a corretora em relatório.
Para o Credit Suisse, a transação precisa ser vista com cuidado. Segundo estimativas do banco, as lojas adquiridas operam com margens Ebitda negativas.
O último dado disponível, de 2017, indicava que as margens do Makro eram negativas em 0,5% e as lojas mais lucrativas do Makro estariam no estado de São Paulo. Assim, as unidades adquiridas, todas fora do estado, estariam entre as de pior rentabilidade da empresa.
Por isso, a aquisição tem riscos de execução e poderia deteriorar os atuais níveis de lucratividade do Carrefour por um tempo, diz o relatório do Credit Suisse.
Localização
Mais do que estar interessado na marca Makro, o Carrefour estava de olho na localização das lojas do Makro. Para o Carrefour, comprar unidades já prontas é uma forma interessante de acelerar a abertura de lojas, que fica na média de 20 novas unidades por ano, também por um custo bastante reduzido em relação a levantar uma loja nova do chão, dizem analistas.
As novas lojas foram adquiridas pelo valor de R$ 1,95 bilhão. Dos 30 pontos comerciais, 22 são propriedade integral do Makro e oito são alugados, localizados em 17 estados do país.
A transação envolveu ainda a compra de 14 postos de gasolina. As lojas adquiridas, que somam 165.000 m² de área de venda, apresentaram em 2019 vendas brutas de aproximadamente R$ 2,8 bilhões. Segundo o Carrefour, os espaços possuem complementaridade geográfica com as 187 lojas já existentes do Atacadão.
A empresa prevê que as vendas devem aumentar em mais de 60% com a conversão da marca e a otimização dos custos.
“O risco de execução dessa transformação é muito baixo. O Carrefour vai ter que fazer alguns investimentos em reforma e conversão, que acredito que devem ser baixos, e logo vai conseguir aumentar a rentabilidade dessas lojas. Porque o Atacadão é uma máquina”, diz Bretthauer.