Rússia alerta ONU sobre "bomba suja"; EUA avalia doar sistema de defesa à Ucrânia
A Otan afirmou na segunda-feira que não havia indícios de que Kiev estaria se preparando para usar a arma radioativa e acusou Moscou de usar a falsa denúncia como pretexto para escalar a guerra
Estadão Conteúdo
Publicado em 25 de outubro de 2022 às 17h42.
Última atualização em 25 de outubro de 2022 às 17h52.
A Rússia planeja levar ao Conselho de Segurança da ONU nesta terça-feira, 25, a sua acusação, sem provas, de que a Ucrânia estaria planejando um ataque com "bomba suja", mesmo depois de o Ocidente ter descartado as alegações como falsa. A Otan disse na segunda-feira, 24, que não havia indícios de que Kiev estaria se preparando para usar a arma radioativa e acusou Moscou de usar a falsa denúncia como pretexto para escalar a guerra.
Segundo a agência Reuters, Moscou enviou à ONU uma carta em que detalha a sua acusação. À agência, diplomatas confirmaram a intensão russa de levar o tema a uma reunião fechada do Conselho de Segurança. Na carta, o embaixador russo na ONU, Vassili Nebenzia, disse ao secretário-geral, António Guterres, que Moscou vai considerar o uso da bomba como um ato de terrorismo nuclear.
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A acusação foi inicialmente feita no domingo, pelo ministro da Defesa russo, Serguei Shoigu, a homólogos da França, Reino Unido e Estados Unidos. Em resposta, diplomatas desses três países disseram que Moscou poderia estar planejando uma bandeira falsa ao acusar o uso da bomba. "A Rússia não deve escalar o conflito na Ucrânia com afirmações de que Kiev planeja detonar uma 'bomba suja' em seu próprio território para culpar Moscou", advertiu o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.
Nesta terça, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, reforçou a alegação e chamou o Ocidente de tolo por desmenti-la. "Segundo as informações das quais dispomos, duas organizações ucranianas têm instruções específicas para criar a chamada 'bomba suja'", reiterou o tenente-general Igor Kirillov em comunicado.
O ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, insistiu: "Não se trata de informações vazias [...] Há sérias suspeitas de que isso está planejado. Temos enorme interesse em evitar uma provocação tão terrível como essa".
Segundo o Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC) dos EUA, uma "bomba suja" é uma mistura de explosivos, como dinamite, com pó radioativo. Ao ser detonada, a explosão transporta o material radioativo para a área ao redor. Apesar do material radioativo presente, elas não são armas nucleares e não têm nenhuma semelhança com as bombas atômicas usadas pelos EUA em Hiroshima e Nagasaki em 1945. A explosão em si da bomba tem mais probabilidade de causar danos aos seres humanos do que o material radioativo que ela carrega.
Ucrânia convida AIEA
Logo após a acusação russa, a Ucrânia disse que convidou técnicos da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) da ONU para inspecionar as instalações citadas." A Ucrânia não tem nada a esconder", disse o ministro das Relações Exteriores ucraniano, Dmitro Kuleba.
A AIEA, por meio de nota, confirmou o convite e reiterou que a agência já tem inspetores nos locais e não viu atividades que indicassem a preparação para uso de "bombas sujas". "A AIEA está ciente das declarações feitas pela Federação Russa no domingo sobre supostas atividades em duas instalações nucleares na Ucrânia", disse o diretor-geral da AIEA, Rafael Mariano Grossi.
"A AIEA inspecionou um desses locais há um mês e todas as nossas descobertas foram consistentes com as declarações de salvaguardas da Ucrânia", disse. "Nenhuma atividade ou material nuclear não declarado foi encontrado lá". Ainda assim, a agência disse que está se preparando para visitar os locais nos próximos dias.
O presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, também negou as acusações russas. "Se a Rússia ligar e disser que a Ucrânia está supostamente, preparando algo, isso significa uma coisa: a Rússia já preparou tudo isso", rebateu ele em um vídeo. O temor dos ucranianos e dos líderes ocidentais é de que Moscou utilize a acusação para justificar o uso de armas nucleares táticas na Ucrânia.
Na segunda-feira, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, avisou que haverá consequências caso a Rússia utilize "bombas sujas" ou qualquer outro tipo de arma nuclear na guerra na Ucrânia.
Ainda nesta terça, a operadora de energia nuclear da Ucrânia disse que as forças russas estavam realizando um trabalho secreto na maior usina nuclear da Europa. A Energoatom, empresa estatal ucraniana que opera as quatro usinas nucleares do país, disse que as forças russas realizaram trabalhos secretos de construção na última semana na usina ocupada de Zaporizhzhia. Oficiais russos que controlam a área não darão acesso à equipe ucraniana que administra a usina ou monitores da ONU que lhes permitiria ver o que os russos estão fazendo, disse a empresa em comunicado.
Equipamentos de defesa aérea
Os EUA estão considerando enviar equipamentos de defesa aérea Hawk mais antigos para a Ucrânia, segundo fontes anônimas disseram à agência Reuters. O envio servirá para ajudar Kiev a se defender contra ataques russos de drones, em meio a ampliação do uso de drones kamikaze irananiano, e mísseis de cruzeiro.
Os mísseis Hawk são uma atualização dos sistemas de mísseis Stinger —um sistema de defesa aérea menor e de menor alcance—que os EUA já enviaram diversas vezes para a Ucrânia. Os interceptadores são baseados em uma tecnologia da era da guerra do Vietnã, mas foram atualizados diversas vezes desde então. É um sistema de defesa de baixa e média atitude, antecessor ao Patriot, de longo alcance e que os EUA não têm intenção de fornecer a Kiev por enquanto.
Os EUA defendem que os aliados construam rapidamente uma rede de defesa aérea para a Ucrânia, usando equipamentos compatíveis com a Otan, alguns ultramodernos, outros mais antigos, para proteger os objetivos estratégicos ucranianos dos ataques russos.
Esse esforço ganhou maior urgência depois do forte ataque de mísseis por parte da Rússia em retaliação à destruição de uma ponte na Crimeia. O ataque russo tem danificado instalações de energia e outras infraestruturas críticas da Ucrânia.
"O que os líderes ucranianos descreveram como sua maior necessidade no momento é capacidade de defesa aérea", disse o secretário americano da Defesa, Lloyd Austin, um dia depois de uma reunião dos 50 países aliados para coordenação de seu apoio militar a Kiev, em 12 de outubro. A defesa aérea e até o envio de caças é um pedido antigo do presidente Zelenski ao Ocidente.
Para estabelecer o escudo antiaéreo solicitado pelo presidente ucraniano, porém, é necessário criar o que os militares chamam de defesa terra-ar de múltiplas camadas. "São sistemas de curto alcance e baixa altitude; depois, sistemas de médio alcance e de média altitude; e, finalmente, sistemas de longo alcance e de alta altitude", afirmou o chefe do Estado-Maior americano, general Mark Milley, em conversa com jornalistas há duas semanas.
Esses três níveis permitirão proteger alvos estratégicos ucranianos, como grandes cidades, infraestruturas cruciais, ou centros de poder, contra mísseis balísticos, mísseis de cruzeiro e até drones. A Espanha foi a primeira a responder positivamente ao pedido dos americanos e disse que enviará quatro sistemas Hawk para a Ucrânia, anunciou Austin, saudando uma "resposta muito, muito rápida".