Manifestantes em uma barricada na Praça da Independência, em Kiev: acordo prevê concessões à oposição (Louisa Gouliamaki/AFP)
Da Redação
Publicado em 21 de fevereiro de 2014 às 13h26.
Kiev - Um dia depois de um banho de sangue em Kiev, o presidente ucraniano, Viktor Yanukovich, e os líderes opositores assinaram um acordo para acabar com a crise na Ucrânia, que inclui eleições antecipadas, uma reforma constitucional e um governo de unidade nacional.
O acordo, assinado na presença de mediadores europeus, prevê concessões à oposição, que ocupa há três meses a Praça da Independência em Kiev, onde mais de 70 pessoas morreram desde terça-feira em confrontos com a polícia.
"Anuncio o início de um processo de eleição presidencial antecipada", afirmou mais cedo o presidente em um comunicado, sem especificar a data.
"Inicio também o processo de retorno à Constituição de 2004" e a formação de um "governo de unidade nacional", completou.
Pouco depois, o Parlamento ucraniano decidiu pelo retorno à Constituição de 2004, que estabelece poderes limitados ao presidente e outorga aos legisladores o direito de nomear ministros.
A reforma constitucional foi aprovada por ampla maioria.
O líder opositor Oleg Tiagnibok confirmou a assinatura do acordo com o presidente ucraniano, informou a agência Interfax.
Depois de tomar conhecimento das propostas de Yanukovich, os três principais líderes opositores se reuniram antes de um encontro com Yanukovich, informou a porta-voz do ex-boxeador Vitali Klitschko.
O presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, pediu a aplicação do acordo concluído em Kiev.
"O acordo é um compromisso necessário para iniciar o indispensável diálogo político que permita à Ucrânia sair da crise. Agora todas as partes têm a responsabilidade de passar das palavras ao atos", disse.
As delegações europeias não haviam descartado a possibilidade da assinatura de um acordo "temporário", mas expressaram muita prudência.
As negociações estavam em uma fase "delicada", afirmou o ministro polonês das Relações Exteriores, Radoslaw Sikorski.
"Momento delicado a respeito do acordo para solucionar a crise na Ucrânia. Todas as partes devem lembrar que um compromisso não pode satisfazer em 100% a todos", escreveu o ministro no Twitter.
O papa Francisco e os cardeais de todo o mundo reunidos no Vaticano fizeram um apelo para o "fim rápido da violência" na Ucrânia e o retorno da "concórdia e da paz".
O acordo foi alcançado após longas negociações com a presença dos ministros das Relações Exteriores da França, Alemanha e Polônia, além de um representante da Rússia.
Na Praça da Independência, epicentro dos protestos, os manifestantes consolidaram as barricadas e os estoques de tijolos e coquetéis molotov durante a manhã. Os policiais recuaram quase 100 metros.
No total, 20.000 manifestantes permaneciam nas barracas e nas barricadas, ou escutavam discursos, cantos e orações em um palco montado no local.
O ministério do Interior acusou alguns manifestantes de um ataque armado contra policiais para tentar romper a barreira de segurança e abrir passagem até o Parlamento de Kiev.
Mas os manifestantes negaram e acusaram a polícia de ter utilizado bombas de efeito moral.
Segundo o balanço mais recente do ministério da Saúde, 77 pessoas morreram desde terça-feira nos confrontos com a polícia, que usou munição real.
Outras 577 pessoas ficaram feridas e 369 permanecem hospitalizadas.
"Os atiradores assassinaram os manifestantes de maneira muito profissional disparando no coração, cérebro ou carótida", afirmou ao 'Kanal 5' a médica Olga Bogomolets.
O comandante adjunto do Estado-Maior do exército ucraniano, Yuri Dumanski, pediu demissão nesta sexta-feira em protesto contra as tentativas de envolvimento do exército no conflito.
"Envolver o exército atualmente no conflito civil pode provocar grande número de mortos", declarou.
O acordo provavelmente não será considerado satisfatório por todos os manifestantes presentes na Praça da Independência, que exigem a renúncia do presidente.
A líder opositora Yulia Timoshenko, na prisão, disse que a "destituição de Yanukovytc e as ações judiciais contra ele pela morte de civis deveriam ser a única exigência do povo, da oposição e da comunidade internacional".
Os ministros europeus das Relações Exteriores concordaram com uma primeira série de sanções econômicas contra os que têm as "mãos manchadas de sangue", entre elas o cancelamento de vistos e o congelamento de bens.
O vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, advertiu a Yanukovich para a possibilidade de sanções contra os funcionários que ordenaram tiros contra os manifestantes opositores.
A crise na Ucrânia começou em novembro, quando o governo decidiu suspender subitamente as negociações de associação com a UE e estreitar relações com a Rússia.