Peru começa a julgar impeachment de seu presidente por áudios vazados
O Peru já teve quatro presidentes investigados por corrupção na "Lava-Jato peruana", e o presidente Martín Vizcarra vinha tentando ser uma voz reformista
Carolina Riveira
Publicado em 18 de setembro de 2020 às 13h40.
Última atualização em 18 de setembro de 2020 às 18h39.
O Congresso do Peru começou a julgar nesta sexta-feira, 18, um pedido de impeachment do presidente Martín Vizcarra. A votação deve ser encerrada ainda hoje. Segundo levantamento do jornal El Comercio com os congressistas, a tendência é que o impeachment seja negado e Vizcarra siga no cargo.
O pedido de impeachment aconteceu após o vazamento de alguns áudios de Vizcarra na semana passada. Seu governo teria feito a contratação irregular de um cantor ao custo de algumas dezenas de milhares de dólares. E, nos áudios, o presidente aparece pedindo para que assessores mintam sobre o caso.
Até então, Vizcarra, que é de centro-direita, vinha com popularidade alta pelas medidas anticorrupção que vem tentando implementar desde que chegou ao cargo há dois anos.
“Os áudios expostos, sem dúvida, afetam essa imagem anticorrupção. O entorno do presidente já era alvo de questionamentos, como com seu ex-ministro dos Transportes”, diz Samuel Rotta, vice-diretor executivo da organização peruana Proética, capítulo da Transparência Internacional no Peru.
Quem lidera a sessão de hoje -- e os esforços para derrubar Vizcarra -- é o opositor Manuel Merino, que é presidente do Congresso e também assumiria o poder em caso de saída do presidente. Merino é de centro-direita e quase desconhecido pelos peruanos.
A sessão começou por volta das 12 horas de Brasília, com a presença de Vizcarra e de seu advogado de defesa. A maioria dos parlamentares acompanha a votação pela internet em virtude da pandemia do novo coronavírus. São necessários 87 votos, de um total de 130 cadeiras, para destituir Vizcarra.
O Peru é um dos países mais afetados pelos esquemas de corrupção da Odebrecht . O caso de Vizcarra não tem relação com a empreiteira brasileira, mas os escândalos envolvendo os presidentes anteriores marcaram profundamente o país.
Dentre os ex-presidentes recentes no Peru, quatro foram denunciados pelos escândalos relacionados à Odebrecht. Parte da oposição, dessa forma, calculou que afastar Vizcarra agora agravaria a situação do país em meio à pandemia e à insegurança institucional, e levam em conta também a popularidade do presidente. O Peru tem novas eleições já no ano que vem.
Vizcarra assumiu o Peru em 2018, mas não foi eleito diretamente: ele era vice na chapa de Pedro Pablo Kuczynski (2016-18), o PPK, que renunciou ao cargo e terminou sendo preso depois pela Justiça peruana.
PPK estava envolvido em escândalos de corrupção, incluindo com a Odebrecht. Ex-banqueiro, ele havia sido eleito em 2016 com a promessa de uma agenda anticorrupção e com base em sua imagem de economista liberal.
“Os problemas do áudio de Vizcarra, nesse contexto, dificilmente são comparáveis aos subornos multimilionários dos quais participaram os ex-presidentes”, diz Rotta.
O Peru, em parte em esforços liderados por Vizcarra, vem aprovando nos últimos anos reformas de financiamento de eleições e no Judiciário. Os embates com o Congresso por causa dessas reformas têm sido constantes.
Enquanto isso, em meio à pandemia, o Peru também sofre com uma das piores taxas de mortalidade por coronavírus do mundo. Especialistas do país afirmam que o caso se deve ao sistema de saúde ruim e com pouco investimento.
(Com AFP)