Obrador: o candidato quer estimular programas sociais e reduzir a pobreza no México, que afeta mais de 53 milhões de pessoas, com mais de sete milhões de cidadãos na pobreza extrema (Goran Tomasevic/Reuters)
AFP
Publicado em 2 de julho de 2018 às 08h39.
Última atualização em 2 de julho de 2018 às 09h29.
"Não vou falhar com vocês", prometeu Andrés Manuel López Obrador após sua grande vitória na eleição presidencial do México, que leva a esquerda ao poder na segunda maior economia da América Latina pela primeira vez em sua história recente.
"Sou muito consciente de minha responsabilidade histórica", disse López Obrador, de 64 anos, ao lado da esposa e dos filhos, diante de dezenas de milhares de simpatizantes na emblemática praça central da capital mexicana.
"Quero entrar para a história como um bom presidente do México", afirmou, enquanto a multidão gritava "Sim, foi possível".
Em sua terceira tentativa consecutiva de chegar à presidência, AMLO, como é conhecido entre os mexicanos, se apresentou como o candidato antissistema e recebeu mais de 53% dos votos, de acordo com estimativas oficiais baseadas em uma mostra cuja tendência é irreversível.
López Obrador tem mais de 30 pontos de vantagem sobre Ricardo Anaya, candidato apoiado por uma coalizão de direita e esquerda (PAN, PRD e Movimento Cidadão). José Antonio Meade, aspirante do governista Partido Revolucionário Institucional (PRI), aparece muito atrás em terceiro lugar.
A apuração dos votos avança lentamente e continuará nesta segunda-feira, enquanto o país assiste a partida entre México e Brasil pelas oitavas de final da Copa do Mundo da Rússia-2018.
López Obrador, 64 anos, conseguiu capitalizar o cansaço da população após seis anos de governo de Enrique Peña Nieto, um mandato marcado pela corrupção e por denúncias de violações dos direitos humanos.
Em seu projeto de nação para 2018-2024, que começará em sua posse no dia 1 de dezembro, o candidato eleito destaca o apoio ao campo, a revisão dos contratos milionários da reforma energética, um governo "austero, sem luxos ou privilégios" e a redução dos salários dos altos funcionários públicos em até 50%.
Tudo para estimular programas sociais e reduzir a pobreza no México, que afeta mais de 53 milhões de pessoas, com mais de sete milhões de cidadãos na pobreza extrema.
O problema é que muitos mexicanos e analistas criticam a falta de propostas concretas e o que chamam de retórica "populista".
"O principal desafio genérico de López Obrador é cumprir o que ofereceu e ofereceu uma utopia (...) Não vai conseguir fazer milagres", disse o historiador mexicano José Antonio Crespo.
Muitos mexicanos que votaram nele expressam dúvidas sobre seu programa, ao mesmo tempo que ressaltaram a necessidade de uma mudança.
Uma das maiores dúvidas diz respeito à relação de AMLO com o presidente americano Donald Trump e, sobretudo, como dois modelos tão antagônicos conviverão dos dois lados do Rio Bravo, em temas vitais como a migração e as negociações de um renovado Tratado de Livre-Comércio.
Trump disse que "está ansioso para trabalhar" com o novo presidente mexicano.
"Há muito trabalho por fazer que beneficiará Estados Unidos e México", tuitou Trump, cuja política anti-imigração e contra o livre comércio abalou a relação bilateral.
López Obrador afirmou que buscará uma relação de "amizade e cooperação" com os Estados Unidos.
Para os analistas o panorama é incerto.
"AMLO não pagará pelo muro, isto é certo. Mas AMLO deu mostras claras de que deseja ter uma boa relação com os Estados Unidos. Ele não fez campanha contra Trump. Do lado de Trump é muito imprevisível", opina Mark Weisbrot, codiretor do Centro de Pesquisas em Economia e Política.
As eleições encerraram a campanha eleitoral mais violenta da história recente do México, com pelo menos 145 políticos assassinados desde setembro (48 eram pré-candidatos, ou candidatos).
Um número significativamente maior do que o registrado em 2012, quando nove políticos e um candidato foram assassinados.
Durante o dia de votação, uma militante do Partido do Trabalho (PT) foi assassinada no estado de Michoacán (oeste) e dois membros do PRI morreram no estado de Puebla.
Os candidatos do Movimento de Regeneração Nacional (Morena), a coalizão liderada por López Obrador, que atualmente não governa nenhum estado, venceram em seis dos nove estados em disputa, de acordo com as pesquisas de boca de urna. O resultado muda definitivamente o mapa político nos 32 estados do México, que até agora eram governados em sua maioria por PRI e PAN.
Além do presidente, quase 89 milhões de mexicanos estavam registrados para escolher governadores, prefeitos e deputados locais e federais, entre os mais de 18.000 cargos em disputa.
De acordo com o instituto Mitofsky, Morena e seus aliados, o Partido do Trabalho e o conservador Encontro Social, conseguiriam juntos mais de 250 das 500 cadeiras na Câmara, o que significa a maioria entre os deputados. No Senado, entre 56 e 70 das 128 cadeiras, o que não garante a maioria até o momento.
López Obrador precisará, portanto, estabelecer alianças em um país dividido.