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'Lula deve manter pressão até que Maduro não suporte mais', diz ex-candidato Edmundo González

Do exílio na Espanha, ex-adversário de Maduro nas urnas, que alega ter vencido eleições, garante que voltará ao país para assumir o poder e pede mais pressão internacional

Edmundo Gonzáles Urrutia, candidato opositor de Nicolás Maduro nas eleições presidenciais da Venezuela em 2024 (AFP/AFP)

Edmundo Gonzáles Urrutia, candidato opositor de Nicolás Maduro nas eleições presidenciais da Venezuela em 2024 (AFP/AFP)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 20 de outubro de 2024 às 12h41.

Numa pequena sala de um prédio de coworking no bairro de Salamanca, em Madri, o homem que, segundo informações divulgadas pela oposição venezuelana e confirmadas por especialistas em processos eleitorais de vários países, obteve quase 8 milhões de votos nas últimas eleições, lidera os esforços fora do país para tentar reverter o que hoje parece inevitável: a terceira posse de Nicolás Maduro, no dia 10 de janeiro.

Sem perder a pose e o tom de diplomata, Edmundo González Urrutia trabalha diariamente no exílio para conseguir que a comunidade internacional redobre as pressões sobre a ditadura venezuelana, sem perder a esperança em esforços diplomáticos, sobretudo nos promovidos conjuntamente por Brasil e Colômbia.

—Se pudesse dizer algo ao presidente Lula neste momento, diria que mantenha a pressão até que Maduro sinta que não pode suportar mais, até que ele mude sua posição — disse ao GLOBO.

O ex-candidato garantiu que retornará a seu país para assumir o poder, porque “Maduro sai ou sai”. Pela primeira vez, González também revelou detalhes dos 32 dias em que esteve refugiado na Embaixada da Holanda em Caracas, antes de exilar-se na Espanha:

— Muitas vezes, comíamos juntos [com o embaixador], víamos TV, algum filme. Mas tudo quando toda a equipe ia embora. Muitas vezes, o embaixador me trazia a comida.

O senhor pediu esta semana que a comunidade internacional aumente a pressão sobre a ditadura venezuelana. Que tipo de pressão a oposição espera?

Conversei com o chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell. Precisamos de mais pressão internacional, e não apenas por parte dos EUA. Eles [os americanos] estão numa situação muito particular, pelo processo eleitoral. Mas, para nós, a questão venezuelana deve ser bipartidária. Republicanos e democratas devem nos apoiar.

Como pode ser elevada a pressão? Afetar contratos do setor petroleiro seria uma opção, para asfixiar o país financeiramente? É algo que se ouve em conversas informais…

Neste momento, estamos falando de pressão através de sanções personalizadas. Por exemplo, o presidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Elvis Amoroso, foi alvo de sanções individuais, mas que foram suspensas antes das eleições por parte da UE. Num gesto político, o bloco poderia repor as sanções contra ele, que foi artífice da fraude mais escancarada que tivemos na história democrática.

A oposição não está pedindo que os EUA suspendam contratos no setor de petróleo?

Não gostaria de entrar na questão das sanções no setor de petróleo, ou econômicas. Insisto na questão das sanções personalizadas, para forçar Maduro a entender que somente através de eleições transparentes poderemos sair desta crise. Se isso não acontecer, a Venezuela entrará novamente num processo de êxodo insustentável. Começaremos a ver migrantes indo para a Colômbia, para o Brasil. Já estamos vendo isso acontecer. Está só começando.

Quando o senhor fala em eleições transparentes, refere-se ao pleito de 28 de julho, ou a oposição aceitaria realizar novas eleições, como cogitaram representantes do governo brasileiro?

Não, não, não. Essa proposta é inviável. A única eleição para nós é a na qual 8 milhões de venezuelanos votaram a favor de uma transição democrática.

Brasil e Colômbia lideraram um esforço para criar um espaço de mediação entre chavismo e oposição. O senhor considera que essa tentativa fracassou?

Não, acho que pode continuar. São processos que não têm uma data de início e de término. A mediação pode ter altos e baixos, e esperamos que possa chegar a um ponto positivo. O foco central é convencer Maduro de que ele deve respeitar a vontade popular. Mas não estamos falando em repetir eleições, os votos estão lá, as atas eleitorais estão lá. Os membros do Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) viram as atas, e qualquer pessoa que quiser pode vê-las.

Brasil e Colômbia não falam mais em atas…

Milhões de venezuelanos e amigos internacionais da Venezuela estão esperando que a vontade popular seja reconhecida. Esse é o ponto central da nossa proposta, e é o que a comunidade internacional está esperando. Maduro deve entender que ele perdeu, os resultados mostram isso.

O que o senhor diria ao Brasil e à Colômbia neste momento?

Muitas negociações não são públicas, os governos não dizem “estamos fazendo isso ou aquilo”. Conversas estão acontecendo, e isso vai continuar. Todos queremos que continuem. Se pudesse dizer algo ao presidente Lula neste momento, diria que mantenha a pressão até que Maduro sinta que não pode suportar mais, até que ele mude sua posição.

As manifestações parecem ter perdido força na Venezuela…

Talvez, em consequência da repressão. Foi uma repressão muito forte, são mais de 2 mil pessoas presas. Um relatório da missão da ONU indicou recentemente que a ditadura cometeu excessos, crimes contra a Humanidade. Prenderam crianças com deficiências físicas, mulheres grávidas. São os mesmos métodos das ditaduras nos anos 1970. Estamos voltando às ditaduras que assolaram a América Latina.

Na semana passada,o Brasil se absteve em uma votação em Genebra sobre a renovação do mandato da missão especial da ONU sobre direitos humanos na Venezuela. Como o senhor recebeu essa informação?

Eu entenderia, se isso estivesse justificado pelo fato de que o Brasil é um mediador. É a única explicação. Como você pode mediar num conflito se se coloca de um lado? Visto dessa forma, faz sentido.

O senhor diz que voltará a Caracas e será empossado no dia 10 de janeiro. Como acha que isso será possível, nas atuais circunstâncias?

Num voo da Iberia, talvez.

Perante quem o senhor faria seu juramento como presidente?

Perante o povo venezuelano, que votou em mim, para respeitar a vontade de 8 milhões de venezuelanos.

Podemos ter um cenário no qual Caracas seja palco de duas cerimônias de posse, uma oficial e uma paralela?

Apenas um de nós tem legitimidade de origem, a legitimidade do voto popular. E sabemos quem é. Vou respeitar a vontade da soberania popular.

Como foi sua saída da Venezuela?

Fiquei 32 dias na Embaixada da Holanda, quase ninguém sabia onde eu estava. Minha esposa foi duas vezes me visitar. Na última, passou a noite lá e viajamos para a Espanha.

Como foi o traslado da Embaixada da Holanda para a da Espanha?

As casas estão praticamente uma do lado da outra. Era bem perto. Fui de carro.

O senhor foi embaixador na Argentina, na Argélia… Alguma vez imaginou refugiar-se numa embaixada?

Nunca pensei em chegar a isso. E nunca tinha participado de um processo eleitoral. Terminei aqui por meu compromisso com a democracia. E aqui estamos, viajando, falando com a comunidade internacional. Tenho muito a agradecer, sobretudo ao embaixador da Holanda em Caracas.

Como foi a vida nesses 32 dias?

Muito complicada, mas, claro, muito tolerável. Complicada porque eu estava hospedado no segundo andar da residência, para que ninguém me visse. Tinha um quarto e uma sala para trabalhar. Descia só quando os funcionários iam embora. Absolutamente ninguém sabia que eu estava lá, apenas o embaixador. Muitas vezes, comíamos juntos, víamos TV, algum filme. Mas tudo acontecia quando a equipe ia embora. Muitas vezes, o próprio embaixador me trazia a comida. Caminhava no jardim, apenas de noite. E tem uma parte do jardim com janelas, onde eu não ia.

O senhor já conhecia o embaixador?

Sim, sempre tivemos um relacionamento cordial, nos conhecíamos há muitos anos.

O senhor telefonou pessoalmente e pediu refúgio?

Outros falaram por mim. Nesses 32 dias, tivemos longas conversas. O embaixador me informava, trazia os jornais do dia, as notícias. Que situação! Há muitas coisas pelas quais tenho que agradecer ao governo da Holanda.

Quando a ditadura venezuelana lhe concedeu o salvo-conduto para sair do país, foi uma surpresa, e alguns analistas afirmam que a decisão tentava dividir a oposição…

Desde o começo, desde que me refugiei numa embaixada, estava claro que eu era mais útil fora do país do que dentro. Dentro da Venezuela estava muito limitado. Eu sabia o que estava fazendo, os riscos que corria, sabia que podia acabar preso.

Como é hoje sua relação com María Corina Machado?

Nos falamos todos os dias, combinamos ações, para isso existem linhas telefônicas. Ela é a líder da oposição venezuelana, a vencedora das primárias [de outubro de 2023].

O senhor pretende que a comunidade internacional o reconheça como presidente?

Vários governos já o fizeram, e desejamos que boa parte da comunidade internacional faça esse reconhecimento. Eu estou convencido de que assim será. Maduro sai ou sai.

O senhor garante que a partir de 10 de janeiro Maduro não será mais presidente? Ou o país poderia ter dois presidentes?

Isso não está previsto em nossa Constituição.

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