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Kirchner deixará legado complexo a sucessor na Argentina

Cristina Kirchner deixará um cenário político, econômico e social altamente complexo para o próximo chefe do Executivo, seja governista ou opositor

Cristina Kirchner: presidente deixará o poder no dia 10 de dezembro, alimentando o sonho de voltar em 2019 (Ueslei Marcelino/Reuters)
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Da Redação

Publicado em 17 de outubro de 2015 às 15h14.

Buenos Aires - Cristina Kirchner deixará ao vencedor das próximas eleições presidenciais na Argentina um cenário político, econômico e social altamente complexo, um caldeirão de conflitos com o qual o próximo chefe do Executivo, governista ou opositor, se verá obrigado a lidar.

Após 12 anos de kirchnerismo no poder e oito de gestão presidencial, no dia 10 de dezembro Cristina Kirchner deixará para trás a Casa Rosada alimentando o sonho de voltar, em 2019, e com o desafio de manter a força do núcleo kirchnerista para garantir a sobrevivência do que seu governo gosta de chamar de "o modelo".

A oito dias do pleito, uma pesquisa publicada neste sábado pelo jornal "Clarín" outorga ao candidato governista, Daniel Scioli, 38,3% em intenções de voto, insuficiente para ser eleito no primeiro turno no próximo dia 25 de outubro, e situa o líder da coalizão opositora Cambiemos, Mauricio Macri, em segundo lugar.

Se essas previsões se confirmarem, pela primeira vez desde a reforma constitucional de 1994, o futuro presidente argentino seria eleito em um segundo turno, previsto para 22 de novembro.

De qualquer forma, Cristina deixará para trás uma gestão de altos e baixos marcada pela deterioração progressiva da economia na etapa final de seu mandato.

Abraçada à bandeira dos direitos humanos, Cristina manteve o compromisso de seu marido e antecessor, o falecido ex-presidente Néstor Kirchner, de colocar os repressores da ditadura militar no banco dos réus.

Além disso, transformou a Argentina no primeiro país da região a aprovar o casamento gay, mas não conseguiu diminuir os altos índices de pobreza que, faltando estatísticas oficiais, organismos privados cifram em 28%.

Do outro lado está a deterioração de uma economia que deixou de crescer a níveis chineses para esgotar-se, com uma inflação superior a 20%, e um florescente mercado negro de divisas.

Seu sucessor receberá uma economia sem crescimento, com problemas fiscais, monetários, de financiamento e investimento, agravados por um orçamento de difícil execução e leis que condicionarão a próxima gestão, como a restrição da venda das ações do Estado em empresas.

"Houve uma primeira etapa positiva, mas depois não, com uma intensificação dos enfrentamentos, cegueira nos erros e isolamento", declarou à Agência Efe o analista Patrício Giusto, que considera que, no geral, "a herança é negativa" e o balanço seria "uma grande oportunidade perdida".

"Cristina está deixando uma herança pesada ao próximo presidente, mesmo se for Daniel Scioli (candidato governista)", comentou Giusto, analista da empresa Diagnóstico Político.

Além da situação econômica, Giusto cita a nomeação de kirchneristas do núcleo duro em postos-chave, como a Secretaria de Inteligência e o Ministério Público, que dificilmente poderão ser removidos pelo novo governo, e outros assuntos espinhosos, como o atraso tarifário e o litígio com os fundos especulativos, e até um sindicalismo dividido que é foco de um conflito latente.

O "poder residual" do kirchnerismo no parlamento é, segundo Jorge Arias, da empresa de consultoria Polilat, outro dos fatores a levar em conta que pode dificultar a aprovação de leis impulsionadas pelo próximo governo, mesmo no caso de triunfo de Scioli, um peronista de raiz não kirchnerista.

Seja qual for o resultado eleitoral, os analistas preveem uma batalha pelo controle do Partido Justicialista (peronista), o maior movimento político da Argentina, com correntes que vão da direita à esquerda e que, historicamente, se está no poder, é conduzido por quem ocupa a presidência.

Hoje, no 70º aniversário do dia da lealdade peronista, políticos governistas e opositores lembraram nas redes sociais a mobilização popular que deu lugar ao peronismo e Scioli participará de um grande ato na populosa cidade de La Matanza, na província de Buenos Aires, um das fortificações do kirchnerismo.

"Hoje o líder é Cristina. Mas, se Scioli vencer, vai tentar assumir a liderança, porque é peronista e porque ser presidente o obriga a isso", antecipou Giusto.

O papel de Cristina Kirchner também será um fator de pressão para seu sucessor. Poucos a veem retirando-se totalmente do cenário político.

"É muito provável que passe a um plano mais discreto, mas tenho certeza que tem intenção de continuar sendo protagonista da política e provavelmente com o sonho de voltar em 2019", apostou Giusto.

Se o governo perder, Cristina tentará liderar a oposição, embora, segundo Arias, não conte com bases amplas dentro do enorme espectro do peronismo.

O kirchnerismo guarda também o trunfo dos movimentos político-sociais, alimentados nos últimos anos com recursos do Estado, com "capacidade para ganhar as ruas" e "gerar caos" e cuja atuação dependerá "do poder do talão de cheques do próximo governo", acrescentou Arias.

Giusto também não descarta maiores conflitos sociais e considera improvável uma "lua-de-mel" nos primeiros meses do novo governo.

"Pela situação econômica e social, por ter uma inflação anual superior a 20%, a primeira coisa que o próximo presidente terá que enfrentar são negociações salariais duríssimas", ressaltou.

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Buenos Aires - Cristina Kirchner deixará ao vencedor das próximas eleições presidenciais na Argentina um cenário político, econômico e social altamente complexo, um caldeirão de conflitos com o qual o próximo chefe do Executivo, governista ou opositor, se verá obrigado a lidar.

Após 12 anos de kirchnerismo no poder e oito de gestão presidencial, no dia 10 de dezembro Cristina Kirchner deixará para trás a Casa Rosada alimentando o sonho de voltar, em 2019, e com o desafio de manter a força do núcleo kirchnerista para garantir a sobrevivência do que seu governo gosta de chamar de "o modelo".

A oito dias do pleito, uma pesquisa publicada neste sábado pelo jornal "Clarín" outorga ao candidato governista, Daniel Scioli, 38,3% em intenções de voto, insuficiente para ser eleito no primeiro turno no próximo dia 25 de outubro, e situa o líder da coalizão opositora Cambiemos, Mauricio Macri, em segundo lugar.

Se essas previsões se confirmarem, pela primeira vez desde a reforma constitucional de 1994, o futuro presidente argentino seria eleito em um segundo turno, previsto para 22 de novembro.

De qualquer forma, Cristina deixará para trás uma gestão de altos e baixos marcada pela deterioração progressiva da economia na etapa final de seu mandato.

Abraçada à bandeira dos direitos humanos, Cristina manteve o compromisso de seu marido e antecessor, o falecido ex-presidente Néstor Kirchner, de colocar os repressores da ditadura militar no banco dos réus.

Além disso, transformou a Argentina no primeiro país da região a aprovar o casamento gay, mas não conseguiu diminuir os altos índices de pobreza que, faltando estatísticas oficiais, organismos privados cifram em 28%.

Do outro lado está a deterioração de uma economia que deixou de crescer a níveis chineses para esgotar-se, com uma inflação superior a 20%, e um florescente mercado negro de divisas.

Seu sucessor receberá uma economia sem crescimento, com problemas fiscais, monetários, de financiamento e investimento, agravados por um orçamento de difícil execução e leis que condicionarão a próxima gestão, como a restrição da venda das ações do Estado em empresas.

"Houve uma primeira etapa positiva, mas depois não, com uma intensificação dos enfrentamentos, cegueira nos erros e isolamento", declarou à Agência Efe o analista Patrício Giusto, que considera que, no geral, "a herança é negativa" e o balanço seria "uma grande oportunidade perdida".

"Cristina está deixando uma herança pesada ao próximo presidente, mesmo se for Daniel Scioli (candidato governista)", comentou Giusto, analista da empresa Diagnóstico Político.

Além da situação econômica, Giusto cita a nomeação de kirchneristas do núcleo duro em postos-chave, como a Secretaria de Inteligência e o Ministério Público, que dificilmente poderão ser removidos pelo novo governo, e outros assuntos espinhosos, como o atraso tarifário e o litígio com os fundos especulativos, e até um sindicalismo dividido que é foco de um conflito latente.

O "poder residual" do kirchnerismo no parlamento é, segundo Jorge Arias, da empresa de consultoria Polilat, outro dos fatores a levar em conta que pode dificultar a aprovação de leis impulsionadas pelo próximo governo, mesmo no caso de triunfo de Scioli, um peronista de raiz não kirchnerista.

Seja qual for o resultado eleitoral, os analistas preveem uma batalha pelo controle do Partido Justicialista (peronista), o maior movimento político da Argentina, com correntes que vão da direita à esquerda e que, historicamente, se está no poder, é conduzido por quem ocupa a presidência.

Hoje, no 70º aniversário do dia da lealdade peronista, políticos governistas e opositores lembraram nas redes sociais a mobilização popular que deu lugar ao peronismo e Scioli participará de um grande ato na populosa cidade de La Matanza, na província de Buenos Aires, um das fortificações do kirchnerismo.

"Hoje o líder é Cristina. Mas, se Scioli vencer, vai tentar assumir a liderança, porque é peronista e porque ser presidente o obriga a isso", antecipou Giusto.

O papel de Cristina Kirchner também será um fator de pressão para seu sucessor. Poucos a veem retirando-se totalmente do cenário político.

"É muito provável que passe a um plano mais discreto, mas tenho certeza que tem intenção de continuar sendo protagonista da política e provavelmente com o sonho de voltar em 2019", apostou Giusto.

Se o governo perder, Cristina tentará liderar a oposição, embora, segundo Arias, não conte com bases amplas dentro do enorme espectro do peronismo.

O kirchnerismo guarda também o trunfo dos movimentos político-sociais, alimentados nos últimos anos com recursos do Estado, com "capacidade para ganhar as ruas" e "gerar caos" e cuja atuação dependerá "do poder do talão de cheques do próximo governo", acrescentou Arias.

Giusto também não descarta maiores conflitos sociais e considera improvável uma "lua-de-mel" nos primeiros meses do novo governo.

"Pela situação econômica e social, por ter uma inflação anual superior a 20%, a primeira coisa que o próximo presidente terá que enfrentar são negociações salariais duríssimas", ressaltou.

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