Justiça alemã afirma que ataque perto de sinagoga foi de extrema-direita
A chanceler alemã, Angela Merkel, prometeu "tolerância zero" ante o ódio; atirador fez vídeo ao vivo antes do ataque
AFP
Publicado em 10 de outubro de 2019 às 11h55.
Última atualização em 10 de outubro de 2019 às 15h13.
As principais autoridades da Alemanha se reuniram nesta quinta-feira (10), na sinagoga de Halle, cenário de um atentado que deixou dois mortos na véspera, com membros da comunidade judaica, que deseja mais proteção e ações contra a extrema-direita.
A chanceler Angela Merkel prometeu "tolerância zero" ante o ódio. "Os representantes do Estado de direito devem utilizar todas as vias este fornece para combater o ódio, a violência (...) tolerância zero", declarou em Nuremberg durante um discurso para metalúrgicos.
O presidente do país, Frank-Walter Steinmeier, foi o primeiro a visitar a sinagoga, ao lado de um representante do Congresso Judaico Mundial, Maram Stern, e do presidente do Conselho Central dos Judeus da Alemanha, Josef Schuster.
Este último considerou escandaloso que a sinagoga atacada não tivesse a proteção da polícia na quarta-feira, quando os judeus celebravam uma de suas festas mais sagradas, o Yom Kippur, o Dia do Perdão.
Na quarta-feira à noite, a chanceler Angela Merkel participou em uma vigília de homenagem e luto na grande sinagoga de Berlim e condenou o ataque.
"Precisamos de atos e não apenas de palavras para proteger os locais de oração", denunciou o presidente do Congresso Judaico Mundial, Ronald Lauder.
"Devemos sobretudo criar uma frente unida contra os neonazistas e outros grupos extremistas. O fato de que eles estão ganhando espaço 75 anos depois do Holocausto fala por si só", completou.
O procurador federal Peter Frank afirmou que o agressor queria cometer um massacre. "O que aconteceu ontem (quarta-feira) foi terrorismo", destacou.
Ataque de extrema-direita
A ministra da Justiça da Alemanha, Christine Lambrecht, confirmou a natureza de extrema-direita do ataque.
"Stephan B. cometeu um massacre movido por racismo e antissemitismo", frisou Peter Frank, a respeito do autor do ataque, que se deslocou "fortemente armado" à sinagoga e deixou escrito um manifesto que esclareceu as intenções do ataque.
De acordo com o procurador-geral, Stephan Balliet pretendia criar uma "repercussão global" e encorajar outros ultradireitistas a cometerem mais ataques.
A ministra da Justiça ressaltou que a violência ultradireitista é uma das maiores "ameaças enfrentadas" pela sociedade e que o estado de direito deve empregar todas as ferramentas disponíveis para combatê-la de forma consciente.
Ataque ao vivo
Na quarta-feira, um alemão de 27 anos, identificado pela imprensa como Stephan Balliet, entrou armado na sinagoga de Halle, a 170 km de Berlim, e matou duas pessoas.
O atirador vestia roupas militares e usava um capacete no qual havia instalado uma câmera para gravar o ataque. Sua intenção era cometer um massacre no templo, onde estavam quase 80 pessoas.
Filho único de pais divorciados, abandonou o curso de Química pouco depois de iniciar os estudos por uma operação no estômago. Morava com a mãe a 40 km da sinagoga e passava o dia na internet, de acordo com o pai.
Uma porta trancada a chave resistiu aos tiros e impediu que o agressor concretizasse seu plano.
"Hoje, Deus queria que vivêssemos", escreveu nas redes sociais uma das fiéis presentes na sinagoga, Rebecca Blady.
O agressor matou então, ao que tudo indica por acaso, uma pessoa que passava pelo local e depois um cliente de um restaurante turco próximo. A polícia feriu o atirador e ele foi detido.
A princípio, o homem agiu sozinho e de maneira bastante improvisada. O ataque parece inspirado pelo que foi executado por um extremista de direita australiano em março contra várias mesquitas de Nova Zelândia, que deixou 51 mortos.
O ataque do agressor de Halle foi exibido ao vivo durante 35 minutos pela plataforma Twitch e foi assistido, em tempo real, por mais de 2.000 pessoas e compartilhado nas redes sociais.
Antes do atentado, o autor também publicou uma espécie de manifesto antissemita, no qual expressa a intenção de "matar tantos antibrancos como possível, de preferência judeus", de acordo com o observatório de terrorismo SITE e o jornal Die Welt.
A comunidade judaica da Alemanha tem 225.000 pessoas e cresceu após a chegada de muitos judeus da ex-União Soviética no início dos anos 1990. Seus líderes alertam sobre o aumento dos atos antissemitas no país.
No ano passado, o número de ataques antissemitas alcançou quase 1.800, um aumento de 20% na comparação com o ano anterior, de acordo com a polícia.
O movimento neonazista é a origem de boa parte dos ataques, em um contexto de auge da extrema-direita na Alemanha, que deseja acabar com a cultura de arrependimento nacional pelos horrores executados pelo nazismo.
O atentado aconteceu depois do assassinato em junho de Walter Luebcke, um político local favorável aos migrantes e membro do partido da chanceler Angela Merkel, a CDU. O principal suspeito é um membro de um grupo neonazista. O ataque também recordou as mortes de vários migrantes na Alemanha em ações de um pequeno grupo neonazista chamado NSU, a partir do ano 2000.