Elizabeth Dunn: “refugiados são bons para a economia”
O drama dos imigrantes na Europa só faz crescer. Apenas na ilha gregas de Lesbos, 46.000 pessoas estão detidas num campo de refugiados à espera de uma definição. Não sabem se retornarão à Turquia, ou se serão reassentados em alguma das limitadas vagas na Europa. São apenas 160.000 disponíveis – enquanto a Turquia, sozinha, já […]
Da Redação
Publicado em 15 de junho de 2016 às 19h35.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h29.
O drama dos imigrantes na Europa só faz crescer. Apenas na ilha gregas de Lesbos, 46.000 pessoas estão detidas num campo de refugiados à espera de uma definição. Não sabem se retornarão à Turquia, ou se serão reassentados em alguma das limitadas vagas na Europa. São apenas 160.000 disponíveis – enquanto a Turquia, sozinha, já recebeu mais de 2,5 milhões de pessoas nos últimos dois anos.
Sobre o tema, EXAME Hoje entrevistou a geógrafa Elizabeth Dunn, da Universidade de Indiana. Ela é especialista em situações de grave transformação social. Durante 16 meses, entre 2009 e 2012, realizou trabalho de campo em assentamentos na Geórgia, que abrigaram cerca de 30.000 migrantes. Sua experiência pessoal lhe mostrou que campos de refugiados simplesmente não funcionam. A seguir, suas possíveis soluções para a crise europeia.
Desde que foi firmado o acordo com a Turquia, sob a alegação de que as entradas ilegais precisavam acabar, a chegada de migrantes pela Grécia diminuiu. É possível dizer que esse tipo de política de controle tem dado certo?
O acordo entre União Europeia e Turquia não está funcionando. O objetivo é ajudar refugiados a se reassentar com segurança. O acordo especifica um tráfego de um-por-um: para cada refugiado que a União Europeia manda de volta para a Turquia, eles deveriam aceitar um de lá. Mas a União Europeia não tem tido condições de processar tantos pedidos de asilo e, sob lei internacional, os casos precisam ser analisados individualmente. Enquanto isso, refugiados estão começando a se aventurar por uma rota ainda mais perigosa: saindo da Líbia ou do Egito e cruzando o Mediterrâneo para chegar à Itália. A Organização Internacional de Migração aponta que, só na semana passada, 1.000 pessoas morreram afogadas.
Há o drama dos imigrantes, e o desafio da economia das nações que os recebem. O fluxo intenso de migrantes pode mesmo desestabilizar um país?
Depende da maneira como esses países, e o resto dos países da região, lidam com o reassentamento. A União Europeia poderia, de fato, distribuir melhor o fardo da crise, apoiando financeiramente a Grécia e começando a reassentar pessoas em países como Polônia, Hungria, Dinamarca e assim por diante. Com bons programas de integração, como a Alemanha tem proposto, refugiados podem ser um grande trunfo econômico, porque eles trazem ajuda financeira e movimentam o mercado de bens locais e de serviços. O fato de que os refugiados estão empobrecidos e frustrados é porque a política da União Europeia os desumaniza.
De que benefícios os países europeus poderiam usufruir se decidissem se abrir para os imigrantes?
Muitos países da Europa precisam de imigrantes. A Alemanha percebeu isso. A população alemã é desproporcionalmente velha e, sem trabalhadores jovens, a economia vai estagnar. E eles precisam de jovens trabalhadores para dar suporte aos aposentados. Lugares como Síria e Afeganistão, onde a população é desproporcionalmente jovem, são uma grande fonte de novos trabalhadores. Enquanto eles estão trabalhando, eles também estão gastando – o que significa um mercado novo e fresco para os bens produzidos na Europa.
Por outro lado, países como Portugal, que estão realmente interessados em receber pessoas, não estão sendo bem-sucedidos nessa tarefa. O que poderia explicar isso?
Há dois problemas. Primeiro, refugiados miram em países ricos, não países de renda média como Portugal. E o país não fez um bom trabalho de marketing para se mostrar como um lugar onde empregos podem ser criados. Segundo, há um desencontro de habilidades. Portugal pediu por trabalhadores do campo, como fazendeiros e silvicultores. Mas os sírios que têm dinheiro suficiente para viajar até Portugal, onde é mais difícil chegar por rota marítima, tendem a ser arquitetos, programadores, médicos. Se a União Europeia melhorasse a ponte aérea, os refugiados de mais baixa renda poderiam ter Portugal como opção.
A senhora passou 16 meses, entre 2009 e 2012, estudando um campo de refugiados da Geórgia e descobriu que essa não é uma boa política. Por que os campos não funcionam?
Campos de refugiados não são bons para refugiados. Eles geralmente estão longe dos centros de emprego e não há muitas oportunidades no campo, então as pessoas não podem começar a trabalhar. As crianças têm acesso limitado à educação. E a média de permanência num campo de refugiados hoje é de 17 anos. Então, campos se tornam uma armadilha: as pessoas acabam gastando rápido todos os seus recursos e, logo, elas não têm mais dinheiro para sair. Desemprego, educação de má qualidade, serviços de saúde escassos e praticamente nada para fazer – isso não é bom para pessoas.
Que outras políticas poderiam ser colocadas em prática para receber melhor os refugiados e para aproveitar o que eles podem oferecer?
Apesar de todas as suas falhas, o plano da Alemanha está no caminho certo. Eles estão reassentando pessoas rapidamente em comunidades de acolhimento, oferecendo ajuda para que possam aprender a língua local e encontrar uma casa, dando a elas permissões de trabalho e incentivando que encontrem uma ocupação. Um refugiado afegão que está esperando que seu pedido de asilo seja aprovado na Alemanha me contou: “eu só quero ser uma pessoa de verdade de novo, em vez de ser simplesmente um refugiado”.
Países como Hungria e Áustria construíram muros para impedir a entrada de imigrantes. Que consequências isso pode provocar?
Primeiro, Hungria, Áustria e Polônia (e outros países que recusaram refugiados) simplesmente não estão cumprindo a parcela que lhes cabe de compartilhamento do fardo da crise. Quando nativos desses países precisaram de refúgio, lhes foi dado. Quando eles precisaram de dinheiro da União Europeia, eles receberam. E, agora, quando é sua vez de ajudar pessoas e contribuir para minimizar uma crise que está tomando conta de toda a União Europeia, eles se recusam a ajudar. Sem oferecer ajudar para encontrar uma solução para a crise, húngaros, poloneses e austríacos estão sobrecarregando os alemães, o que não é justo.
(Camila Almeida)