Crise do coronavírus levará 28,7 mi à pobreza na América Latina, diz ONU
Argentina e Brasil, as maiores economias da América do Sul, terão os maiores aumentos dos índices de pobreza por conta da crise do coronavírus
Estadão Conteúdo
Publicado em 15 de maio de 2020 às 11h08.
Última atualização em 15 de maio de 2020 às 16h19.
A pandemia chegou à América Latina em um momento de baixo crescimento econômico e levará neste ano 28,7 milhões de pessoas à pobreza , um aumento de 4,4% com relação a 2019, e mais 15,9 milhões à extrema pobreza, crescimento de 2,6%. Segundo a Cepal, agência da ONU criada para coordenar o desenvolvimento regional, 214 milhões de latino-americanos viverão na pobreza no fim de 2020 - 34,7% da população -, com 83,4 milhões na extrema pobreza.
O Banco Mundial define a pobreza extrema como viver com menos de US$ 1 por dia e pobreza como viver com até US$ 2 por dia. Para analistas, a piora econômica na América Latina foi agravada pela pandemia, mas é consequência de erros políticos e problemas preexistentes.
"Com o grau de concentração de renda que a América Latina tem, um dos piores do mundo, não há dúvida nenhuma que o impacto será muito forte. A pandemia agravou problemas que já existiam porque mesmo antes da crise, a Cepal previa um crescimento médio de apenas 1,6% na região", afirma o professor de relações internacionais da ESPM Leonardo Trevisan.
O cenário é consequência da queda de 5,3% do PIB e do aumento de 3,4% do desemprego na região, segundo projeção da Cepal. As maiores economias do bloco devem ser as mais afetadas: Argentina e Brasil terão os maiores aumentos dos índices de pobreza.
Em toda a América Latina, porém, o maior aumento da pobreza extrema será registrado na Nicarágua, país que vem navegando às cegas pela pandemia. Até agora, o governo do presidente Daniel Ortega relatou apenas 25 casos de covid-19 e 8 mortes - números vistos com desconfiança, especialmente quando comparados aos dois vizinhos. Honduras registrou 2,2 mil casos e a Costa Rica, 830.
Aos 74 anos, Ortega governa a Nicarágua há mais de 13 anos. Antes da pandemia, ele já vinha tendo dificuldades em se manter no poder e enfrentava protestos de estudantes que pediam sua renúncia. Com a chegada do coronavírus, o horizonte econômico ficou ainda mais obscuro e o presidente nicaraguense decidiu não arriscar: ignorou o surto e pediu que a população o continuasse a viver como se nada estivesse acontecendo.
Na Nicarágua, os ônibus sempre viajam superlotados e quase ninguém usa máscara de proteção. Nos bancos e nos supermercados mais caros a temperatura é medida, um frasco de álcool em gel fica na entrada e um tapete com solução de cloro ajuda a desinfetar os pés dos clientes. Mas, nos mercados populares, frequentados pela maioria da população, não há distanciamento social. O mesmo ocorre nos jogos de beisebol e partidas de futebol - as competições não pararam no país.
Os nicaraguenses desconfiam que o governo esteja ocultando a real dimensão da pandemia. Ordens de enterros imediatos, proibição de velórios, presença de policiais e de funcionários do Ministério da Saúde nos funerais, além de pessoas mortas de forma súbita nas ruas têm deixado a população em alerta.
No Departamento de Chinandega, o Observatório Ciudadano Covid-19 contabilizou a morte de 16 pessoas, entre 14 de março e 4 de maio. "Das últimas 10 mortes, 2 tiveram diagnóstico de enfarte, sem vínculo com o vírus. As outras 8 ocorreram em circunstâncias suspeitas, com fortes indícios de covid-19", explica um relatório da entidade publicado esta semana.
Segundo a organização, as autoridades deram ordem de enterro imediato, proibição de velório ou funerais relâmpagos realizados com a presença de autoridades policiais e de saúde.
Enquanto isso, o governo de Ortega segue em silêncio, sem explicar as causas do aumento repentino de óbitos. (Colaborou Fernanda Simas)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.