Tela do Twitter: empresas há muito suspeitam que as postagens dos clientes em sites de microblogging, como o Twitter, podem ajudar a promover seus produtos (Damien Meyer/AFP)
Da Redação
Publicado em 11 de maio de 2016 às 15h07.
Meses antes da mais recente temporada do seriado Game of Thrones, os fãs se voltaram ao Twitter para compartilhar seu entusiasmo. Tuítes como "Tenho certeza que em abril o Inverno chegará!" e "Que clã irá governar o Trono de Ferro nesta primavera?" demonstram a animação sobre os próximos episódios. Evidentemente, a HBO está extasiada com essa atividade.
Seja sobre um novo episódio de um programa de TV ou o último iPhone, as empresas há muito suspeitam que as postagens dos clientes em sites de microblogging, como o Twitter, podem ajudar a promover seus produtos. Essa ideia tem levado empresas a oferecer vantagens, como acesso antecipado, amostras grátis ou upgrades para aqueles usuários que acreditam ser influentes em comunidades on-line.
No entanto, por parte das empresas, isso é essencialmente um palpite. "Intuitivamente, pode-se esperar que o conteúdo gerado por usuários produza algum efeito. Do contrário, por que as empresas estariam fazendo isso?", disse Song Yao, professor assistente de marketing da Kellogg School.
Esses microblogs criados por usuários são muito difíceis de estudar. Embora uma empresa possa colocar estrategicamente seus próprios tuítes, é impossível saber — ou mais importante, testar — o impacto dos tuítes dos clientes. Uma vez que a maioria dos produtos é promovida em várias formas, pode ser difícil atribuir o sucesso a anúncios tradicionais em comparação a conteúdo gerado por usuários.
"É impossível dizer que os altos índices de Game of Thrones são o resultado de tuítes de usuários. Isso é apenas uma preferência intrínseca que direciona tanto o rating do programa quanto o conteúdo do Twitter", diz Yao.
No entanto, um escândalo no mundo real criou um experimento natural inteligente que possibilitou desmembrar o impacto de conteúdo gerado por usuários no sucesso de um produto.
Juntamente com Stephan Seiler, da Universidade de Stanford, e Wenbo Wang, da Universidade de Hong Kong para Ciência e Tecnologia, Yao analisou uma situação incomum: o que acontece com um programa de TV quando comentários gerados por usuários desaparecem porque partes de uma plataforma de microblogging são temporariamente desligadas?
De golpe político a dados de mercado
Em fevereiro de 2012, Wang Lijun, vice-prefeito de uma cidade no sudoeste da China, revelou detalhes do assassinato de um empresário e posterior encobrimento pelo Consulado dos Estados Unidos na China.
O escândalo suculento — cheio de histórias de deserção, corrupção oficial e consequências políticas — alimentou rumores que se espalharam rapidamente no Sina Weibo, plataforma de microblogging chinesa semelhante ao Twitter.
Para conter a fofoca, o governo colocou um bloqueio parcial no Sina Weibo. Todos os comentários gerados por usuários — sobre o escândalo ou não — foram desligados por três dias.
Assim, por exemplo, um canal de televisão poderia postar que um programa iria ao ar em um determinado momento, e um usuário poderia retuitar esse fato. Mas os usuários não poderiam acrescentar que eles pretendiam assistir ou que estavam animados sobre um episódio específico.
"Os programas de TV eram totalmente irrelevantes para o escândalo, mas também foram afetados", diz Yao. "Durante esses três dias, houve muito menos atividade de microblogging".
Esse acontecimento proporcionou uma oportunidade perfeita de estudar o impacto de postagens geradas por usuários na audiência da TV.
Os pesquisadores acompanharam o conteúdo criado pelos usuários do Sina Weibo antes, durante e após o bloqueio em 24 cidades do continente e em Hong Kong. Ao mesmo tempo, observaram as avaliações de 166 programas de TV e analisaram como a censura afetou os ratings da audiência.
O poder do microblogging
O apagão do Weibo gerou um efeito significativo. Os programas com uma presença normalmente bastante alta do Weibo sofreram o maior impacto. Os episódios desses programas apresentaram ratings significativamente mais baixos durante o bloqueio de três dias em comparação com os níveis de audiência normais.
Esses mesmos programas não foram afetados, em grande parte, antes ou após do bloqueio. Foram afetados somente os episódios levados ao ar durante o período de censura do Sina Weibo.
As cidades com maiores proporções de usuários do Weibo também relataram maiores quedas nos ratings dos episódios. Ao contrário das cidades continentais, Hong Kong, que não ficou sujeita à censura e que possui mais usuários do Twitter do que o Sina Weibo, não sentiu grandes impactos do bloqueio.
"Descobrimos que os ratings só caíram em cidades com alta penetração do Weibo e somente para os programas com alta atividade no Weibo", diz Yao.
Os pesquisadores também queriam verificar outra possível variável. "O que aconteceria se a atenção das pessoas fosse realmente desviada para o escândalo, e elas não estivessem mais interessadas em assistir à TV naquele momento porque o escândalo era muito mais interessante?" indaga Yao.
Para eliminar essa explicação, a equipe usou o índice de pesquisa do Baidu, uma métrica semelhante às tendências do Google, para medir o interesse das pessoas no escândalo político.
A atividade da pesquisa relacionada ao escândalo, por exemplo para o termo "Wang Lijun", apresentou picos em três momentos fundamentais: quando a notícia surgiu pela primeira vez, quando o seu chefe, Bo Xilai, foi afastado do cargo, e quando Bo foi preso e acusado de suborno e corrupção.
No entanto, o bloqueio do Sina Weibo não coincidiu com nenhum desses eventos. Assim, é improvável que as pessoas estivessem simplesmente concentradas no escândalo em vez de atentas aos novos episódios, diz Yao. "É muito convincente o que temos como evidência".
Impacto surpreendente
Em seguida, os pesquisadores quantificaram o impacto das postagens geradas por usuários nos rakings. O aumento em 100% na quantidade de conteúdo gerado por usuários (como ir de zero à restauração de todo o conteúdo, como aconteceu durante e após o evento de censura) aumentou em 2% os ratings de audiência.
"Esse parece ser um número relativamente pequeno, mas é um impacto realmente significativo", diz Yao. "Se não houver mais nada acontecendo, a flutuação dos ratings de um episódio para outro é de cerca de 9%, de modo que o "efeito Weibo" responde por cerca de 20% das flutuações normais".
Esses resultados são especialmente empolgantes porque é geralmente muito difícil quantificar o sucesso do conteúdo gerado por usuários. A maioria das empresas de marketing normalmente busca os testes clássicos A/B para experimentar abordagens diferentes. No entanto, isso é impossível com tuítes gerados por usuários.
"Sem a evidência dessa experiência natural, não poderíamos chegar a essa conclusão sobre o conteúdo gerado por usuários com tanta certeza", diz Yao. "Não esperava que o efeito seria tão grande. Nesse sentido, nosso estudo confirma que esse é um método de marketing bastante impactante e eficaz".
Alavancagem de tuítes de usuários
Os resultados vão muito além de um único episódio de um programa de TV, mesmo que seja o Game of Thrones.
Como os anúncios tradicionais, tuítes gerados por usuários parecem funcionar de duas maneiras: por meio do fornecimento de informações e pela persuasão de terceiros para compartilhar a empolgação de quem postou. As empresas podem alavancar cada dimensão dos tuítes de maneiras diferentes, sugere Yao.
Pelo fato de a equipe descobrir que o conteúdo gerado por usuários antes de um programa apresenta um grande impacto nos ratings — mais, na verdade, do que os tuítes durante o programa — suas descobertas podem ser usadas em publicidade junto ao consumidor tradicional.
Ao lançar um novo produto, envolver os usuários no compartilhamento de informações — possivelmente oferecendo acesso antecipado ou versões de teste aos consumidores mais influentes — pode aumentar a conscientização sobre o produto.
"No caso de um produto estável — digamos, Coca-Cola ou Pepsi — o tuíte em si pode conter alguma informação", diz ele. "Mas as empresas podem trabalhar em outra dimensão: Como posso convencer os consumidores em uma determinada comunidade a consumir este produto?"
"Suspeitamos que o tuíte funcionará de forma mais eficaz em uma categoria em rápido movimento. Se há um novo produto, ou um filme, ou um negócio diário como um Groupon, a mídia social pode ajudar a disseminar rapidamente as informações", acrescenta.
Independentemente do produto, ter melhores monitores de conteúdo e sentimento gerados por usuários pode ajudar nos esforços de marketing, diz Yao. "As empresas devem pensar em como criar uma comunidade ativa e como incentivar a criação de conteúdo gerado por usuário".
Texto publicado com a permissão da Northwestern University (em representação da Kellogg School of Management). Publicado originalmente no Kellogg Insight.