Fundos imobiliários acumulam queda de até 30% desde o início de 2020, mas gestores veem boas perspectivas de recuperação | Foto: Germano Lüders/EXAME (Germano Lûders/Exame)
Bianca Alvarenga
Publicado em 29 de setembro de 2021 às 06h15.
Para o investidor que cumpriu a migração da renda fixa para a renda variável, o caminho tem sido penoso. Com a inflação em alta e os juros seguindo pelo mesmo rumo, os principais índices que medem o desempenho da bolsa e dos fundos imobiliários têm apresentado perdas que são sentidas diretamente no valor do patrimônio.
Depois de terminar o ano de 2020 com perda de quase 12%, o IFIX, índice que mede a variação das cotas dos principais Fundos de Investimento Imobiliário (FII), acumula desvalorização de 5,5% desde o início deste ano.
Os fundos que investem em imóveis (os chamados fundos de tijolo) foram os mais penalizados, com destaque negativos para os FIIs de shoppings e escritórios, que perderam até 30% do valor na crise, segundo um levantamento feito pela gestora Hedge Investments.
É fato que a vacinação avançou e as lojas e escritórios já estão autorizados a funcionar normalmente, mas a janela de perdas do final do primeiro trimestre deste ano, quando o Brasil viveu outra onda de casos e mortes por covid-19, continua pesando para o preço das cotas.
A volta gradual da normalidade tem ajudado a recompor as receitas de shoppings e lajes corporativas, mas essa retomada foi ofuscada pelo avanço dos juros e da inflação, um quadro que tira a atratividade dos fundos imobiliários e dá mais destaque às aplicações da renda fixa.
A exceção são os fundos de papel que investem em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) atrelados ao IPCA ou ao CDI. Lembrando: os CRIs são papeis de dívidas emitidos por empresas que desejam financiar seus projetos imobiliários.
Os FIIs de papeis também perderam valor nos últimos meses, mas seguem com captação positiva no ano: quase metade dos cerca de 31 bilhões de reais aplicados em fundos imobiliários em 2021 foi para os fundos de CRIs. Em 2019, por exemplo, a categoria correspondia a apenas 27% das captações.
"Isso acontece porque os CRIs têm regras mais rígidas, que não permitem renegociação. O credor deve pagar o indexador acordado, e se não pagar pode ser multado ou até perder o ativo principal", diz André Freitas, sócio e fundador da gestora Hedge Investments.
A alta do IPCA e da Selic, portanto, acaba turbinando os dividendos de boa parte dos fundos de papeis, o que gera um fluxo de investimentos para essa categoria.
"O CRI gera uma correção monetária mensal, de acordo com a inflação de dois meses atrás. Ou seja: o FII que tinha um ativo que valia 100, por exemplo, no mês seguinte vai ter um patrimônio de 100,5. Os gestores podem distribuir essa inflação como rendimento aos cotistas", explica Brunno Bagnariolli, sócio e gestor responsável pela área de real estate da gestora Mauá Capital.
Já o cenário para os fundos de tijolo é mais desafiador, como lembra Freitas, da Hedge. Ele diz que os contratos de alugueis dos ativos físicos dos fundos de tijolo também podem ser corrigidos pela inflação, mas que isso não acontece de forma imediata, como nos fundos de CRI.
Além disso, muitos shoppings e escritórios concederam descontos na hora de reajustar os alugueis, em razão da pandemia, e estão recebendo menos recursos do que regra o contrato.
No cálculo dos economistas, a taxa Selic e o IPCA terminarão 2021 acima dos 8% ao ano. Enquanto a provável trajetória dos juros é de alta nos próximos meses, a inflação deve atingir seu pico no terceiro trimestre, com o IPCA acima dos 10% em 12 meses, e então iniciará um caminho de lenta redução.
Diante dessa expectativa, muitos investidores colocam na balança a decisão de se desfazer de suas cotas de FIIs para migrar para a renda fixa -- mesmo que isso, em muitos casos, signifique sair dos fundos em um contexto de baixa e entrar nos títulos de renda fixa em um momento de alta.
Os especialistas ouvidos pela EXAME Invest dizem que essa pode ser uma má decisão, especialmente se a venda das cotas significar a realização do prejuízo.
O sócio da Hedge lembra que muitos brasileiros passaram a investir em FIIs na virada de 2019 para 2020, quando os juros estavam em queda e a economia dava sinais de um crescimento mais robusto. O recorde do IFIX foi atingido justamente nessa janela, nos primeiros dias de 2020.
Embora a pandemia tenha atropelado todas as projeções, os especialistas acreditam que o pior ficou para trás. Dados levantados pela Hedge mostram que a diferença entre o dividendo médio distribuído pelos FIIs e o índice IMA-B (que mede a rentabilidade da renda fixa, principalmente de títulos públicos) está em 4,6%, o maior da história.
Ou seja: o prêmio recebido pelo investidor para manter o dinheiro em FIIs, em vez de buscar títulos mais seguros na renda fixa, ainda é atrativo. Veja abaixo:
Olhando para a frente, o Banco Central deve enfrentar uma pressão extra para reduzir os juros a partir do ano que vem, em razão do alto desemprego e da necessidade de estímulo para a recuperação da economia. Sendo assim, o momento atrativo para a renda fixa também pode ter um prazo de validade relativamente curto, contando a partir de agora.
"O investidor está vendendo suas cotas de FIIs em baixa para comprar uma renda fixa que está com prêmios já reduzidos. Ou seja: temos visto muita gente realizando perdas em fundos de imobiliários para comprar títulos de menor risco, sem saber que o quadro favorável para os juros e inflação pode se reverter em breve", alerta Bagnariolli, da Mauá.
Ele diz que a retomada da economia deve normalizar os rendimentos dos fundos de tijolo, ao passo em que os fundos de papeis seguirão com retornos atrativos, seja pela janela de inflação mais alta ou pelo próprio fato de as emissões de CRIs estarem mais aquecidas.
"O mercado é alimentado por movimentos cíclicos. O investidor deve evitar entradas em momentos de alta e, principalmente, evitar saídas em momentos da baixa", diz o especialista.