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Agro é pop: lei cria fundos de investimento em terras e ativos agrícolas

Projeto altera a lei de fundos imobiliários para criar nova indústria de fundos agrícolas. Pequenos investidores poderão ter participação em ativos como terras, imóveis rurais e títulos de crédito do agro

Ativos rurais, como fazendas produtoras de grãos, poderão ser parte dos novos fundos de investimento (Alexis Prappas/Exame)
BA

Bianca Alvarenga

Publicado em 23 de março de 2021 às 06h05.

Última atualização em 23 de março de 2021 às 11h29.

A agropecuária tem sido destaque em meio à crise econômica causada pela pandemia do coronavírus. Enquanto a economia brasileira recuou 4,1% em 2020, o setor agrícola cresceu 2%. Os preços das commodities, como soja e carne, estão em alta no mercado internacional, o que tem puxado um desempenho consistente das empresas do setor.

Apesar do desempenho acima da média, o investidor brasileiro ainda tem pouco acesso às empresas e ativos do setor agropecuário. Na bolsa de valores, por exemplo, apenas quatro empresas do setor agrícola estão listadas, e apenas as grandes companhias do setor da indústria de carnes (JBS, Marfrig e Minerva) estão no principal índice, o Ibovespa.

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Mas isso pode mudar em breve. Foi aprovada a lei que cria os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro). O projeto, aprovado pelo Congresso no início do mês, altera a lei que criou os Fundos de Investimento Imobiliário (FII), em 1993.

A proposta é que o investidor possa investir em ativos agrícolas, da mesma forma que os FIIs permitem aplicações em imóveis comerciais, shoppings e galpões.

"Assim como os fundos imobiliários, os fundos do agro poderão ter desde ativos físicos, como terras de plantio e estruturas de armazenamento de grãos, até ativos financeiros de crédito, como os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA)", explica Rafaela Aiex Parra, sócia do escritório Araúz & Advogados.

Os fundos contarão com três classes de ativos principais: imóveis rurais (terras, plantações, imóveis de logística do agro), direitos creditórios (títulos de securitização com lastro em ativos do setor) e cotas de fundos de investimento.

A diversidade dos ativos é uma maneira de diluir o risco na carteira dos gestores e de dar mais oportunidades de financiamento para os empresários do setor agro. Apenas as grandes empresas conseguem captar recursos no mercado de capitais. A esmagadora maioria (e principalmente os pequenos e médios produtores) só têm acesso ao mercado de dívida, buscando financiamento com os grandes bancos.

"O mercado de capitais financiou mais de 1 mil projetos imobiliários nos últimos cinco anos. O agronegócio, embora seja muito maior que o setor de imóveis, encontrou funding no mercado para apenas 350 empresas", conta Juliana Mello, sócia da securitizadora Fortesec.

Ela explica que embora títulos como os CRAs já ofereçam aos investidores pessoa física a possibilidade de apostar em empresas do setor agro, em geral esses títulos exigem um investimento mais alto, acima dos 100 mil reais, para uma única aquisição. Isso torna os CRAs acessíveis à maior parte do público apenas por fundos de crédito privado.

Dinâmica dos fundos

Ao contrário dos fundos imobiliários, que são fundos de condomínio fechado (ou seja, não permitem o resgate das cotas), os fundos do agronegócio poderão ser abertos ou fechados.

"Os fundos abertos tendem a ser os que investem em títulos como LCA, CRA, CPR (Cédula de Produto Rural) e CDCA ( Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio). Já os fundos com ativos físicos, como fazendas, devem ser fechados", explica Arthur Vieira de Moraes, especialista em FIIs daEXAME Invest Pro.

Ele diz que os fundos abertos devem ser um impulso inicial para o Fiagro, já que leva um tempo para a criação de um mercado secundário que permita a estruturação de fundos fechados.

Outro ponto importante da lei é que há um benefício fiscal para a transferência de ativos para o patrimônio do fundo. Antes da criação do Fiagro, o dono de uma fazenda que quisesse transferir seu bem para o patrimônio de um fundo, em troca de cotas, deveria pagar o Imposto de Renda.

Com a nova lei, essa troca acontece sem desconto do imposto. O dono do ativo só pagará o IR quando decidir se desfazer de suas cotas. Embora pareça bastante técnica, essa questão será muito importante para o crescimento dos fundos. Trata-se de um incentivo para a diversificação do portfólio dos gestores.

A propósito, o perfil dos ativos tende a ser um desafio extra para o setor. Gestoras que hoje atuam com fundos de estratégias diferentes já começam a se preparar para administrar ativos do agronegócio.

"É um tipo de ativo que não basta ficar sentado no ar condicionado lendo relatórios. O trabalho é mais intensivo, é necessário viajar pelo Brasil, conhecer os ativos e entender na ponta quais as necessidades e oportunidades dos empreendimentos agro", diz Lucas Elmor, sócio da gestora Hectare.

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Melhora da governança

Durante a tramitação do projeto, diversas críticas quanto à capacidade de administração dos ativos agrícolas foram levantadas. A principal delas foi a possibilidade de investidores estrangeiros aplicarem em fundos que serão donos de terras brasileiras -- vale lembrar que, por lei, cidadãos de outros países não podem comprar ou arrendar terras no Brasil.

O Fiagro foi a alternativa encontrada pelo setor para permitir que recursos de fora cheguem ao agro, sem que haja interferência na soberania nacional.

"O Fiagro vai ser o melhor veículo de liquidez para as empresas. Mas para conseguir acessar o dinheiro dos fundos, os empresários terão que entender que a governança é muito importante", diz Rodrigo Amato, CEO da M2M, empresa de tecnologia especializada no depósito de ativos financeiros.

Os fundos terão o compromisso de acompanhar o cumprimento das leis de preservação ambiental, por exemplo, o que deve fortalecer a adesão do pequeno e médio empresário do agro às boas práticas de sustentabilidade e governança.

Próximos passos

O prazo de sanção presidencial do texto venceu na semana passada, o que leva a nova lei para a sanção integral e automática. O caminho, agora, será uma promulgação pelo Senado ou pelo próprio presidente da República, Jair Bolsonaro.

Após a promulgação, caberá à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) impor as regras do jogo: como os fundos serão organizados, quais investidores terão acesso a eles e como funcionará a negociação de cotas. No caso dos fundos imobiliários, essa organização demorou mais de um ano. A expectativa do setor é que para o Fiagro esse processo seja mais ágil.

"No caso do CRA, a CVM permitiu que o mercado seguisse as normas impostas para o CRI, para que houvesse agilidade nas emissões. Esperamos o mesmo agora, com o Fiagro", diz Juliana, da Fortesec.

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