Coronavírus: doença tem forte impacto sobre resultados financeiros (Hiroshi Watanabe/Getty Images for National Geographic Magazine)
Guilherme Guilherme
Publicado em 9 de junho de 2020 às 16h33.
Última atualização em 9 de junho de 2020 às 18h35.
O desempenho das companhias de capital aberto no Brasil frustrou as expectativas dos investidores no primeiro trimestre. Pelo menos 40 das 72 empresas do Ibovespa, principal índice da B3, apresentaram lucros inferiores às projeções do mercado, segundo dados compilados pela Bloomberg. Para analistas, o pior está por vir.
Até o começo desta semana, o lucro das empresas veio de 30% a 40% menor do que o estimado por analistas. A queda pode ser ainda maior se forem consideradas as empresas que ainda não divulgaram seus balanços financeiros referentes ao exercício. O prazo limite para a entrega foi prorrogado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para o final de junho, devido ao novo coronavírus.
As empresas que ainda não divulgaram balanços nessa temporada são BR Distribuidora, Dommo Energia, Helbor, IRB, Engie, Equatorial Energia, Ecorodovias, Tupy, Centauro, CVC e São Martinho.
Segundo levantamento da Sabe (Sistema de Análise de Balanços Empresariais) Invest, as perdas acumuladas de 238 companhias que divulgaram balanço até o último dia 2 de junho alcançaram 77,876 bilhões de reais. No mesmo período do ano passado, a soma dos resultados líquidos dessas mesmas empresas foi de 52,669 bilhões de reais em lucros.
As perdas do período foram impulsionadas principalmente pelo prejuízo líquido de 48,5 bilhões de reais da Petrobras, que optou por fazer a revisão contábil - o chamado impairment - obrigatória do ano no exercício do primeiro trimestre.
Somente 3 dos 22 setores do levantamento da Sabe apresentaram resultados melhores do que no primeiro trimestre do ano passado. É o caso da mineração, liderada pela Vale, que reportou lucro de 984 milhões de reais de janeiro a março, revertendo o prejuízo de um ano antes, quando o balanço sofreu forte impacto do rompimento da barragem de Brumadinho.
Os outros dois setores foram construção civil e tecnologia da informação, este último encabeçado principalmente por Valid e Totvs.
Telecomunicações e energia elétrica também tiveram desempenho acima da grande maioria das empresas, com queda dos lucro de apenas 10% e 17%, respectivamente. “Atividades ligadas a serviços essenciais apresentaram uma retração menos acentuada no período”, disse Bruno Lima, analista de renda variável da Exame Research.
Ainda de acordo com a Sabe Invest, o endividamento das empresas aumentou 20,5% de janeiro a março, para 2,1 trilhões de reais, considerando apenas as 230 empresas que tinham reportado os balanços até o dia 30 de maio.
Eric Barreto, professor do Insper, lembra que diante da desvalorização de mais de 30% do real desde o início do ano, a geração de caixa em moeda americana pelas empresas será de suma importância para reduzir os riscos em um período de alta volatilidade do câmbio.
“As companhias aéreas, por exemplo, são historicamente afetadas por todo tipo de variação cambial, mas neste momento, sem a entrada de qualquer tipo de receita, só restam dívidas a ser pagas”, diz o especialista.
Para especialistas ouvidos pela EXAME, a pandemia do novo coronavírus deve fazer estragos ainda maiores nos resultados do segundo trimestre, após efeitos limitados no primeiro quarto do ano.
“O que assusta é que o coronavírus só impactou a segunda quinzena de março. Se o primeiro trimestre foi ruim, a tendência é que o segundo seja horroroso”, Luiz Guilherme Dias, presidente da Sabe.
Barreto pondera, entretanto, que os setores de consumo essencial, como proteína animal e supermercados, devem continuar apresentando um desempenho melhor. No primeiro trimestre, grupos como o GPA, dono do Pão de Açúcar e do Extra, reportaram resultados abaixo do esperado por analistas, mesmo diante do aumento da demanda do brasileiro, que está consumindo mais dentro do lar.
“Supermercadistas se estruturaram para receber uma demanda maior, com aumento de custos como contratações e estoques. O segundo trimestre para estas empresas deve vir melhor”, diz o especialista.
No entanto, a expectativa é que, no segundo semestre, os resultados comecem a apresentar melhora. O lucro das empresas listadas na B3 deve crescer 10% na segunda metade do ano em relação ao mesmo período de 2019, conforme projeções consolidadas pela Bloomberg.
Para atingir essa projeção, entretanto, o mercado considera que não haverá uma segunda onda de infecções pelo coronavírus ao redor do mundo.
“O mercado estima que os efeitos da pandemia ficarão concentrados no primeiro semestre deste ano”, diz Lima. O mesmo vale para 2021: o consenso entre analistas da Bloomberg é de um aumento de 40% dos lucros das companhias abertas em relação ao consolidado de 2019. “Já estamos vendo sinais de recuperação.”