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Busca de vacinas pelo setor privado "não é boa ideia", diz Arminio Fraga

Ex-presidente do BC diz que tentativa de aquisição de doses por empresas "é compreensível", mas não deve ser feito com atual escassez.

Arminio Fraga: economista acredita que Bolsonaro já perdeu apoio de parte do empresariado (Germano Lüders/Exame)
AO

Agência O Globo

Publicado em 28 de janeiro de 2021 às 20h27.

O economista Arminio Fraga , ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos, disse nesta quinta-feira que a tentativa de aquisição de vacinas por empresas privadas não é uma boa ideia neste momento da pandemia.

Para ele, a oferta insuficiente de vacinas no mundo obriga o respeito à ordem de vacinação por grupos prioritários. O economista aponta como solução a melhor coordenação do plano de imunização no país.

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Ao participar de edição extra da Live do Valor nesta quinta-feira, Arminio considerou que o governo de Jair Bolsonaro já perdeu o apoio de parte do empresariado, insatisfeita com a gestão do combate à pandemia.

Arminio ressaltou que “é compreensível” a busca de vacinas contra a covid-19 pelo setor privado, mas considerou tal iniciativa indesejável neste momento.

— É compreensível. Mas não acho uma boa ideia. Estamos vivendo um momento de escassez global. É preciso que haja uma coordenação para que as prioridades possam ser obedecidas — disse Arminio durante o evento on-line do jornal Valor Econômico.

Para ele, a entrada de empresas nessa negociação poderia ter influência no preço dos insumos.

"Não é justo alguém entrar num leilão (de vacinas) para algo que é um bem público".

Segundo Arminio, o processo de compra de vacinas é relativamente simples, ficando o desafio maior na distribuição.

— Não é algo complicado. Deve ter um número finito de empresas, é só deixar isso centralizado. A questão é a distribuição, que o SUS já se mostrou capaz (em outros períodos)” — afirmou Arminio, na entrevista conduzida pela colunista do Valor Maria Cristina Fernandes.

Apoio do empresariado ao governo é menor

O ex-presidente do Banco Central afirmou que o apoio que o governo Bolsonaro já teve entre o empresariado não é mais o mesmo. Durante a live, Arminio reconheceu que pelo menos uma parte dos empresários é favorável ao impeachment do presidente.

Perguntado se acredita que o atual governo já perdeu apoio do empresariado, respondeu:

—Eu diria que sim. Eu não vou falar, todo mundo morre de medo, é da natureza da coisa, mas acho que a turma já entendeu que aquela promessa de governo liberal na economia e mais manso nos temas de costumes, que isso já era.

Ele ainda completou, indicando ver o empresariado em busca do centro político:

— Qualquer um bem informado a essa altura do jogo vai dizer: “espera aí, vamos evitar os extremos”. Acho que o empresariado é muito firme em cair fora dos extremos, (em ver que) os dois (extremos) estão dando totalmente errado, “vamos procurar alguma coisa aqui no meio, procurar um pêndulo, mas um pêndulo mais curtinho, mais civilizado”.

Divisão sobre impeachment

Questionado se o pensamento predominante no meio empresarial é a favor ou contra a continuidade do atual governo, disse:

— Eu não vejo o empresariado como sendo uma coisa monolítica, ainda acho que tem muita gente dizendo: “não (ao impeachment), vai dar dor de cabeça, pode gerar um comportamento perigoso, deixa estar, vamos resolver isso daqui a dois anos”. Tem outros que dizem “não, não dá para aguentar, é demais, é melhor resolver isso agora, inclusive para a economia”.

Ele ressaltou que não tem evidências concretas para embasar sua percepção:

— Não tenho uma pesquisa, mas que há um movimento bastante relevante e que está mobilizando as pessoas, disso eu não tenho dúvida.

Sentimento crescente na sociedade

Questionado em outros momentos da live sobre os processos de impeachment contra Bolsonaro, Arminio evitou dar opiniões mais incisivas, mas reconheceu que esse é um sentimento crescente na sociedade:

"Há um descontentamento bastante relevante do empresariado, não tenho dúvidas de que esse tema está mobilizando as pessoas".

E acrescentou:

— O que está acontecendo agora não é sustentável ou desejável. O que viria depois, nós não sabemos. Pode ser que o debate (sobre impeachment) avance, mas não sei. Pode ser que economia não ajude e os riscos cresçam.

Eleição no Congresso não é garantia para Bolsonaro

Segundo ele, a chance de os novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, que serão eleitos a segunda-feira, estarem alinhadas a Bolsonaro pode dar algum alento ao governo de Bolsonaro, mas não garante um caminho tranquilo para ele até 2022 nem sua reeleição.

— A eleição dos dois favoritos do governo (na Câmara e no Senado) daria alguma margem de manobra ao presidente. Isso não significa que ele não tenha de lidar com esses enormes desafios do país — observou. — É difícil isso se ligar com as chances de reeleição em 2022.

Recuperação comprometida sem auxílio emergencial

Num momento em que a pandemia se alastra e não há mais auxílio emergencial, encerrado em dezembro, a atividade econômica deve ficar comprometida, observou:

— Recuperação em V foi inflada pelo auxílio emergencial. Agora fica a sensação que vamos entrar num buraco.

Falar em reduzir gastos em saúde assusta

O economista considerou positiva a afirmação do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que a vacinação em massa é essencial para a recuperação da economia.

Embora reforce a necessidade de ajuste das contas públicas, considerou temerária a declaração do ministro sobre possíveis cortes em gastos como os com saúde em plena pandemia:

"Falar em reduzir gastos com saúde neste momento assusta muito. Mas isso foi plantado lá atrás (crise fiscal), agora é hora de tomar decisões difíceis".

Ele questionou o andamento de Propostas de Emenda à Constituição (PECs), como a chamada PEC Emergencial, como estratégias que poderiam ajudar neste processo:

— Dinheiro para a saúde precisa vir rápido, e (com) esse movimento no Congresso, de aprovação de PECs, não vem. Não dá para dar esse crédito ao governo.

Teto de gastos deve ser reavaliado

Ainda na seara fiscal, o ex-presidente do BC afirmou que o teto de gastos deveria ser repensado.

— O teto foi desenhado para estimular um número grande de reformas, que em geral não aconteceram. O teto foi ficando disfuncional — afirmou, lembrando que essa discussão sempre aparece quando o governo tem dificuldades de fazer ajuste nas contas.

E continuou:

— Vai ser necessário reancorar o lado fiscal, reintroduzindo metas para o saldo primário e flexibilizando um pouco o teto, que deveria crescer menos do que o PIB, mas com algum espaço de manobra.

Falta a confiança do mercado

Arminio defendeu ações com a revisão de incentivos tributários, embora reconheça que não seria suficiente para adequar as contas públicas ao teto.

O economista lembrou que, em situações em que o aumento do gasto público é inevitável, o governo precisa adotar uma posta de equilíbrio para dar uma boa sinalização ao mercado, como forma de preservar as condições de financiamento.

— Para ter credibilidade e gastar mais, ainda que seja um gasto temporário, o governo deveria ter feito esforço (fiscal) dobrado.

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