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Ações baratas e com "margem de segurança": o jogo dos gestores no Brasil do juro alto

Clave Capital, Absolute Investimentos e BTG Pactual discutiram portfólio na renda variável durante o CEO Conference  

O Brasil foi um dos primeiros países a começar a subir os juros para conter a disparada da inflação pós-pandemia (Germano Luders/Exame)

O Brasil foi um dos primeiros países a começar a subir os juros para conter a disparada da inflação pós-pandemia (Germano Luders/Exame)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 14 de fevereiro de 2023 às 13h29.

Última atualização em 14 de fevereiro de 2023 às 13h40.

Com a taxa Selic em 13,75% e persistentes dúvidas em relação ao modo como o governo pretende conduzir temas como inflação, gastos públicos e independência de instituições, gestores de ações têm um desafio: sobreviver e entregar rentabilidade via uma classe de ativos que é prejudicada nesse cenário. Para lidar com o momento, alguns entre os mais experientes profissionais vêm preferindo o play safe, o "jogo seguro": ações de empresas de qualidade, baratas na bolsa de valores, com melhores condições de enfrentar concorrentes e passar de forma mais distante por ruídos de natureza política e econômica. Essa foi uma das mensagens dos gestores André Caldas (Clave Capital), Christian Faricelli (Absolute Investimentos) e Laercio Henrique (BTG Pactual) durante o CEO Conference, evento realizado pelo BTG.

O Brasil foi um dos primeiros países a começar a subir os juros para conter a disparada da inflação pós-pandemia, um movimento que ocorreu no mundo todo em diferentes escalas e velocidades. Embora isso seja necessário, a consequência de decisões dessa natureza é um enxugamento de liquidez de ativos como as ações, já que o investidor é desestimulado a tomar risco. Com a inflação mostrando arrefecimento, o próximo passo para que os juros no Brasil caiam — e o mercado de ações possa ter novo impulso — é o próprio governo mostrar comprometimento com a agenda fiscal de redução de gastos.

Segundo André Caldas, da Clave, os juros no Brasil subiram há um tempo e já vêm gerando impactos na economia, provocando uma contração esperada enquanto realiza o controle da inflação. Para que o próximo passo seja a queda saudável da taxa, porém, é preciso ancorar as expectativas para a inflação, o que significa ter uma agenda de gastos controlada e com previsibilidade. Sem isso, a curva de juros tende a permanecer num ponto “pouco amigável para a bolsa”.

“Não dá para afirmar que a bolsa está barata se o custo de oportunidade está alto para alocar sem risco [via investimentos indexados à Selic, como títulos públicos]. A grande pergunta e a cereja do bolo é ter a certeza que tem espaço do lado fiscal para ter corte de juros e aí tem valor a ser destravado na bolsa na nossa visão”, afirmou Laercio Henrique.

Para Christian Faricelli, da Absolute, um conjunto de empresas em setores como commodities e utilidade pública, onde está o segmento de energia, por exemplo, oferece oportunidades com boa relação entre risco e retorno no momento, considerando o atual (e deprimido) nível de preços. Para outros setores, porém, isso não se aplica, como é caso de consumo doméstico, em que nem todas as oportunidades são óbvias e muitas vêm de um histórico de valuations (avaliação de preço) altíssimos do período de juros baixos da economia.

Cenário parecido estão os bancos públicos, em que também há valuations atraentes para uma alocação, mas um risco adicional ligado ao governo que não vale a pena correr no momento. “Banco do Brasil está barato, mas preferimos Itaú Unibanco, que é privado, está barato e veio com resultado muito bom no quarto trimestre”, afirma Laercio. “A assimetria ali é muito boa, com um crescimento de lucro de 15% e um P/E [relação entre preço e lucro, uma medida de valuation] de 6,5 vezes.”

Questionados sobre o modo como encaram o fluxo de recursos estrangeiros para o Brasil, os gestores também reafirmaram que a questão fiscal continua sendo relevante do ponto de vista de alocações para longo prazo. Isso porque, sem visibilidade de que haverá uma condução consistente dessa agenda, os recursos aplicados aqui terão um comportamento de trade, ou seja, mais suscetíveis ao curto prazo. “Investidor estrangeiro que vem para o Brasil não está visitando empresas, é puramente um trade global. Apesar do cenário globalmente construtivo, isso pode mudar rapidamente e, da mesma forma que ele entrou com o dinheiro, ele sai”, diz Faricelli.

“Existe uma boa vontade do lado da comunidade internacional conosco. Tem um grande tema de dólar fraco globalmente, uma reversão da tendência da pandemia, e isso consequentemente traz fluxo para emergentes”, afirma Laercio. “O ambiente internacional é favorável, o que falta é confiança com o nosso dever de casa na parte econômica.”

*Juliana Machado é analista CNPI e integra o time de análise de fundos de investimento do BTG Pactual. É jornalista formada pelo Mackenzie, com pós-graduação em economia brasileira pela Fipe-USP. Atuou com análise e seleção de fundos de investimento na EXAME e escreveu por quatro anos para o Valor Econômico, nas áreas de governança corporativa e bolsa de valores.

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