'O que está em jogo é o futuro do dinheiro', diz BCE sobre cripto do FB
Membro do conselho do Banco Central Europeu, Fabio Panetta mostrou preocupação com a maior agilidade dos projetos privados de inovação financeira
Gabriel Rubinsteinn
Publicado em 27 de novembro de 2020 às 15h33.
O vazamento da notícia de que o Facebook deve lançar a Libra em janeiro de 2021, parece ter feito soar o alarme de bancos centrais ao redor do mundo. Logo depois do anúncio, um alto funcionário do Banco Central Europeu (BCE) mostrou preocupação sobre a falta de celeridade dos projetos públicos de inovação financeira: "O que está em jogo é nada menos do que o futuro do dinheiro", disse Fabio Panetta.
Membro do conselho do BCE, Panetta falou nesta sexta-feira (27) em conferência sobre o futuro dos meios de pagamento, convocada pelo Bundesbank, o banco central alemão. Para ele, a revolução iminente nos pagamentos "exige que estejamos prontos para reinventar o dinheiro soberano".
"À medida em que o dinheiro privado se torna digital, o dinheiro soberano também precisa ser reinventado. Isso exige que o dinheiro do banco central permaneça disponível em todas as circunstâncias — na forma de dinheiro, é claro, mas também potencialmente como um euro digital", prosseguiu.
Olaf Scholz, ministro da Economia da Alemanha, também cobrou maior agilidade nos processos de inovação financeira da União Europeia: "No euro digital, temos que trabalhar muito. Não podemos apenas esperar para ver. Precisamos ser capazes de decidir, devemos fazer algo agora sobre o euro digital."
Depois, comentando especificamente sobre a stablecoin do Facebook, Panetta afirmou: "Os usuários de stablecoins precisam estar propensos a encarar maiores riscos de crédito, mercado e liquidez, e as próprias stablecoins, em si, são mais vulneráveis a execuções, com implicações potencialmente sistêmicas."
Segundo ele, os riscos poderiam ser mitigados se o emissor da stablecoin pudesse investir seus ativos de reserva na forma de depósitos sem risco no banco central, pois isso eliminaria os riscos de investimento que, em última análise, recaem sobre os ombros dos detentores do criptoativo.
"Entretanto, isso não seria aceitável, pois seria o mesmo que terceirizar o fornecimento de dinheiro do banco central", disse Panetta. "Isso poderia colocar em risco a soberania monetária se, como resultado, o dinheiro privado — no caso, a moeda estável — substituísse amplamente o dinheiro soberano como meio de pagamento. O dinheiro seria então reduzido a um 'produto', oferecido em troca do pagamento de uma taxa ou adesão a uma plataforma", completou.
Atualmente, a entidade tenta reunir apoio para a criação do euro digital, uma CBDC como as que vêm sendo estudadas e testadas em diversos países, inclusive da União Europeia, mas também de outros lugares, como China, Brasil e países da África e Caribe.
O BCE e os bancos centrais nacionais europeus iniciaram a experimentação preliminar em quatro frentes, segundo Panetta: "Primeiro, vamos testar a compatibilidade entre o euro digital e os serviços de liquidação do banco central existentes, como o TIPS", disse Panetta. "Depois, exploraremos a interconexão entre tecnologias descentralizadas, como DLTs, e os sistemas centralizados. Terceiro, investigaremos o uso de blockchains dedicados ao pagamento com identidade eletrônica. E, por último, avaliaremos as funcionalidades dos dispositivos de hardware que poderiam habilitar transações offline, garantindo privacidade."
A Libra Association, que tem sede em Genebra (SUI) e foi criada pelo Facebook para desenvolver, emitir e gerenciar seu criptoativo próprio, planeja lançar uma moeda digital lastreada em dólar — um plano muito mais simples do que o originalmente divulgado, que incluía emitir uma série de stablecoins lastreadas por diversas moedas tradicionais individuais, com um token indexado. Com a nova proposta, o lançamento do projeto se torna mais ágil e simples.