Recuperação de florestas auxilia agricultores, diz Juliano Salgado, VP do Instituto Terra
O Instituto Terra, fundado por Lélia Deluiz Wanick Salgado e Sebastião Salgado, transforma áreas degradas em florestas preservadas e produtivas. Veja a entrevista exclusiva com Juliano Salgado, vice-presidente do Instituto
Marina Filippe
Publicado em 17 de julho de 2022 às 08h00.
Última atualização em 18 de julho de 2022 às 13h50.
Neste domingo, 17, é comemorado o Dia da Floresta, em busca de conscientização sobre a importância de manter as matas em pé. Entre as organizações que fazem esse trabalho está o Instituto da Terra, fundado pelo fotógrafo Sebastião Salgado e sua esposa Lélia Deluiz Wanick Salgado há 24 anos, que realiza estudos e práticas de regeneração de solo degradado, bem como o desenvolvimento de nascentes.
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Ao longo dos anos, o Insituto também auxilia na renda das famílias da região. "Conversando com os fazendeiros, a gente nota que a volta da água e das florestas têm um efeito muito positivo na renda das famílias, aumentando, por exemplo, em 30%", diz Juliano Salgado, vice-presidente do Instituto.
Ao todo foram 700 hectares de florestas restauradas na Mata Atlântica da Fazenda Bulcão, em Aimorés (MG). O local também tem grande biodiversidade e mais de 240 espécies.Veja a entrevista completa com Juliano Salgado.
Como era a região do Instituto da Terra antes deste trabalho começar?
A região do médio Rio Doce, onde está o Instituto Terra, já foi coberta de Mata Atlântica considerada uma região tropical. Há 24 anos, quando começamos a trabalhar lá, a região já tinha mudado muito, sido desmatada e coberta de pasto para a alimentação de bovinos. O regime hídrico tinha sido afetado e chovia intensamente de novembro até março, mas com poucas chuvas no resto do ano.
Hoje em dia, 20 anos depois do início da coleta dos dados, chove metade do que chovia numa curva que é decrescente de forma constante. Isso afeta muito, tanto as culturas agrícolas, a produção da região, como a vida das pessoas que dependem dessas culturas, pois é uma estrutura social de médias e pequenas propriedades.
Quais adaptações do Instituto mudam a região?
Nós temos dentro do Instituto uma floresta replantada de 700 hectares. Essa floresta foi feita com uma grande biodiversidade e todas as espécies que antigamente já estavam lá. Então, a ideia não foi somente de cobrir aquela área de árvore. Foi trazer a biodiversidade de volta.
Hoje nós temos onças, onças com filhotes, famílias de onças, macacos, lobos, jaguatiricas, mostrando que esse é um pequeno bioma totalmente restaurado com uma cadeia alimentar completa, inteira. Isso é um sinal que nós conseguimos trazer a vida de volta. Mas, nós também reparamos que muitas das espécies que originalmente se encontravam lá não conseguiram sobreviver a esse regime hídrico afetado pela mudança climática, por essa chuva escassa, que diminuiu 50%.
Quais impactos do aquecimento global são sentidos na floresta?
Os efeitos do aquecimento global têm se mostrado muito duros, inclusive para os agricultores da região, onde as terras tendem a perder valor e a produtividade. Isso faz com que a situação social se torne cada vez mais difícil.
E para reagir a essa situação de degradação das condições de vida dos agricultores, tivemos que adaptar técnicas, que hoje nos permitem recuperar água do solo, a criação de pequenas barragens para retenção de água dentro das propriedades e a conexão de pequenas estações de água de reuso nas casas para limpar a água.
O Instituto Terra tem capacidade de reverter o cenário dessas famílias. Quando se volta a essas terras poucos anos depois, a gente vê pequenas matas em volta de cada uma das nascentes, matas de 500 a 600 árvores. A gente nota que numa propriedade onde não havia água nenhuma, de repente, tem duas, três, quatro nascentes que voltaram, e sai um pequeno córrego dessa propriedade.
Conversando com os fazendeiros, a gente também nota que essa água e as pequenas florestas têm um efeito muito positivo na renda das famílias, aumentando, por exemplo, em 30%.
Como o Instituto mapeia as mudanças da região?
Nossos cientistas, agrônomos, engenheiros florestais têm se aprimorado para entenderem como manter uma floresta viva num ambiente tão degradado. Nosso primeiro trabalho foi de aprimorar as espécies. E hoje nós podemos dizer que o Instituto Terra é uma das poucas, senão a única organização do Brasil capaz de replantar floresta em regiões áridas.
Quais os resultados mais relevantes e recentes das ações?
Restauramos uma Mata Atlântica de 700 hectares na RPPN da Fazenda Bulcão, que criamos em Aimorés (MG) por meio de restauração, com uma biodiversidade muito grande de mais de 240 espécies, e uma cadeia da fauna totalmente restaurada.
O Instituto Terra tem também um projeto de educação muito importante no qual mais de 80 mil pessoas aprenderam técnicas de restauração e agricultura regenerativa. E hoje temos uma demanda muito grande por parte dos agricultores por aumento de produtividade e recuperação de áreas.
Qual a importância da área de pesquisas aplicadas e como essa área pode contribuir também para fora do instituto?
Estamos há 24 anos estudando equilíbrios e aperfeiçoando a ciência de se reconstituir uma floresta num ambiente tão degradado quando este no qual se encontra o Instituto Terra e que, por sinal, é representativo da maior parte do território agrícola nacional. É uma ciência muito importante em relação a maior parte da agricultura brasileira.
A segunda área do nosso desenvolvimento científico se encontra hoje em conseguir demonstrar que o modelo desenvolvido pelo Instituto Terra de plantio de árvore para recuperar água, para aumentar a produtividade, é um modelo que cria renda e vai desenvolver a agricultura, que vai desenvolver a região, que é um modelo alternativo de desenvolvimento agrícola a esse que a gente conhece tradicionalmente.
Como o setor privado pode se envolver mais nas questões ambientais e climáticas?
O Instituto Terra está acostumado a trabalhar com empresas que participam de projetos de replantio e recuperação de água, além de fomento à educação e à ciência. Nossa estrutura está pronta para acolher parceiros que têm vontade de participar de um projeto que vai dar escala à recuperação ambiental.
Estamos prontos para acolher dentro deste projeto todas as empresas que querem encontrar uma alternativa à maneira que nós produzimos e tentar encontrar uma que possa ser uma das soluções para lutar contra os efeitos do aquecimento global. Por outro lado, nós plantamos árvores todo ano.
No ano passado plantamos pouco menos de 200 mil árvores. Este ano estamos nos preparando para plantar o dobro deste número, pouco menos de 400 mil árvores. Cada vez que nós plantamos uma árvore, nós também contamos com a participação de parceiros, que ajudam a gente a financiar esse plantio de árvores.
Quais são os próximos passos do Instituto?
Até hoje nós recuperamos mais ou menos duas mil nascentes na nossa região, em pouco mais de 15 anos. E estamos nos preparando para recuperar 4.500 nascentes nos próximos cinco anos. Estamos também começando um novo programa para dar escala a utilização de sistemas silvipastoris, de agricultura sombreada, agricultura sombreada para o gado, para o café, para o cacau, para a agricultura de subsistência e todo tipo de agricultura.
Nós notamos que quando se introduz a árvore dentro do mix de produção agrícola a gente aumenta muito a produtividade e o fazendeiro ganha mais dinheiro. Mas, a gente também está fazendo um serviço para toda a comunidade, trazendo a água de volta.
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