Economia

Venezuela pode tirar força do Mercosul, dizem analistas

Bloco ficará mais instável ao incorporar as posições ideológicas do novo membro; benefícios podem vir nas áreas de infra-estrutura e energia

Os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, Lula, do Brasil, e Néstor Kirchner, da Argentina (da esq. para a dir.) se abraçam (--- [])

Os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, Lula, do Brasil, e Néstor Kirchner, da Argentina (da esq. para a dir.) se abraçam (--- [])

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h17.

Por trás dos números grandiosos que marcaram a entrada da Venezuela no Mercosul, oficializada na terça-feira (4/7), estão muitos riscos para Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, membros do bloco. De acordo com analistas, o novo integrante traz consigo não apenas consumidores, mas também uma pesada carga política e uma força que pode desestabilizar o já complicado jogo político existente no grupo.

Nas contas divulgadas pelo governo brasileiro, a Venezuela leva o Mercosul a atingir 76% da América do Sul, 250 milhões de habitantes, Produto Interno Bruto (PIB) de mais de 1 trilhão de dólares e um comércio global superior a 300 bilhões de dólares. Administrar o fluxo de produtos que percorrem todo o bloco já não vinha sendo tarefa fácil, a ponto de o presidente paraguaio Nicanor Duarte reclamar maiores benefícios para os países pequenos do grupo, Paraguai e Uruguai. A chegada de uma nova voz no bloco, para Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington, deve tumultuar ainda mais as discussões.

"A expansão do Mercosul neste momento é muito complicada. Há uma evidente situação de desconforto com quatro membros, com cinco ficará ainda mais difícil", afirma Barbosa. Mas ainda que a perspectiva para as relações internas não pareça promissora, o dilema principal está nas relações externas, diz o ex-embaixador. Para ele, o presidente venezuelano Hugo Chávez pode impregnar o Mercosul com sua retórica antiamericana. "O problema maior é a possível politização do bloco. Ou o Mercosul se ajusta à Venezuela ou a Venezuela se ajusta ao Mercosul", diz. As atitudes de Chávez contrárias aos Estados Unidos podem até prejudicar interesses comerciais do bloco, afirma o Barbosa, ao impedirem a concretização ou ampliação de acordos com aliados americanos.

A forte posição ideológica venezuelana, marcada a ferro na América do Sul por meio da influência sobre vizinhos, como na questão energética boliviana, também pode mudar a lógica do Mercosul, na opinão do ex-embaixador. "O Mercosul foi baseado na aliança estratégica de Brasil e Argentina. Agora, essa união fica esmaecida, dá espaço para a Venezuela tomar as rédeas das iniciativas". O Brasil já mostrou, inclusive, que pretende apoiar demandas do vizinho liderado por Chávez, ao defender a entrada da Venezuela no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas. O aviso de Barbosa é de que, se prevalecer a agenda venezuelana na pauta do Mercosul, há o risco de o bloco perder credibilidade diante de outros países. "O Mercosul não vai desaparecer, mas pode se tornar cada vez mais irrelevante no cenário internacional".

Além disso, a proximidade entre Chávez e o presidente argentino Néstor Kirchner deve ganhar espaço dentro do Mercosul e tirar poder de comando do Brasil. Prova de que a relação entre Argentina e Venezuela crescerá foi o anúncio de que os países lançarão juntos títulos públicos chamados "bônus do Sul", realizado também na última terça-feira.

Vantagens

Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai estão de olho nos pouco menos de 30 milhões de habitantes venezuelanos. Mas estes não poderão comprar imediatamente produtos vindos dos outros membros do Mercosul sem pagar impostos de importação. Isso só deve acontecer a partir de 2010 para artigos argentinos e brasileiros e a partir de 2014 para artigos uruguaios e paraguaios. Os prazos devem ser flexibilizados no caso de alguns setores e também valem para a venda de produtos da Venezuela para os outros membros do bloco. "Não há dúvida de que a Venezuela é importante do ponto de vista comercial. Mas o mercado livre só vai funcionar na prática daqui a oito anos", diz Rubens Barbosa.

Michel Alaby, presidente da Associação de Empresas Brasileiras para a Integração de Mercados (Adebim), também ressalta que o incremento no fluxo comercial do Mercosul por conta da entrada da Venezuela ainda está longe no horizonte, mas lembra que a chegada do novo membro pode trazer outros benefícios.

Ele acredita que os países do Mercosul devem ganhar uma maior integração física, expandindo malhas rodoviárias e ferroviárias e encontrando novos caminhos para o escoamento de exportações para a América do Sul. "Será possível melhorar a infra-estrutura, o que pode permitir a substituição de importações venezuelanas de produtos dos Estados Unidos, por exemplo, por produtos brasileiros". Outra área que deve mostrar avanço é a energética, na opinião do presidente da Adebim, já que Chávez poderia ver os vizinhos membros do bloco como novos pontos de investimento. "Temos a possibilidade de ganhar novas refinarias no Brasil", afirma Alaby.

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