Mercado critica novo modelo energético
Medidas provisórias mantêm caráter intervencionista, põem setor à mercê de pressões políticas e podem afastar investimentos, afirmam especialistas. Governo promete energia mais barata
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h11.
Promessa de energia elétrica mais barata para o consumidor final, tanto empresarial quanto residencial. Em troca, regulamentação mais rígida e maior presença do poder público, o que pode inibir investidores. Esse é, basicamente, o pacote oferecido pelo governo com o novo modelo do setor elétrico, apresentado nesta quinta-feira (11/12), no Palácio do Planalto, pelo núcleo duro do governo Lula. Além do próprio presidente da República e da ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, estavam lá o vice-presidente José Alencar e os ministros da Casa Civil, José Dirceu, e da Fazenda, Antônio Palocci. "Não queremos buscar a tarifa mais barata de forma populista", afirmou Dilma. "Queremos a tarifa mais barata possível."
O novo modelo confere amplo poder de decisão ao Ministério das Minas Energia. Caberá à pasta de Dilma planejar, coordenar e executar toda a política setorial. Apesar de ter sido elaborado ao longo de quase um ano de trabalho, o novo modelo não traz propostas apresentadas pelos investidores privados e foi mal recebido pelo mercado. "O setor empresarial ficou à margem das discussões mais profundas com a equipe do governo", diz Cláudio Sales, presidente da Câmara Brasileira de Investidores em Energia elétrica (CBIEE). "Fizemos várias contribuições, mas em nenhum momento fomos chamados para discutir nossas propostas." A Câmara reúne os 15 maiores investidores privados do país. Na lista estão VBC Energia, Tractebel, Grupo Rede, Duke Energy, EDP e EDS.
Segundo Sales, o documento final é quase uma réplica da primeira versão apresentada pelo ministério em julho. O ponto mais crítico da proposta, questionado pelo setor privado, permanece inalterado: o caráter intervencionista. Grande parte da regulamentação do mercado ficará a cargo do Ministério das Minas e Energia. O novo modelo não será discutido pelo Congresso Nacional, uma vez que foi apresentado pelo governo na forma de duas Medidas Provisórias, assinadas hoje por Lula. O ministério também ficará com o poder de fazer as concessões de novas usinas geradoras, esvaziando o poder da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). "Governos são suscetíveis às pressões políticas", diz Sales. "Não existe nada mais contraproducente do que colocar o setor elétrico à mercê das intempéries da política." Para o executivo, o resultado divulgado nesta quinta preocupa: A centralização nas mãos do governo desencoraja o investimento privado. A ministra refuta a classificação do modelo como "estatizante". "Estamos remontando uma estrutura que havia sido desmantelada. As funções que estamos assumindo sempre foram de responsabilidade da União", disse ela.
O economista Sérgio Conti, da Tendências Consultoria discorda. "O novo modelo não dá segurança para o investidor no logo prazo", diz o economista. "O maior problema é o seu caráter intervencionista. Há duas semanas, a Tendências lançou o estudo Setor Elétrico Brasileiro Cenários de Crescimento e Requisitos para a Retomada de Investimentos. O trabalho levava em conta as versões do novo modelo que circularam no mercado e chamava à atenção para os riscos de o governo concentrar o poder de regulação. "O melhor modelo é aquele que assegura investimentos privados", disse Gustavo Loyola, sócio da Tendências e ex-presidente do Banco Central ao divulgar o estudo. "A proposta que está aí não se sustenta porque não atrai investimentos."
O caráter centralizador, na avaliação de Conti, anula até mesmos alguns pontos positivos do novo modelo. Entre eles estaria a assinatura de contratos com prazos entre 15 e 20 anos para o fornecimento da chamada energia nova energia fornecida por usinas geradoras novas, que têm um preço mais elevado em relação à energia de usinas antigas, que já amortizaram os custos iniciais. "O prazo mais longo, teoricamente seria uma vantagem", diz Conti. "Mas a regulação fica nas mãos do governo, e por isso não há como garantir que as regras não serão alteradas no meio do caminho."
Redução nas tarifas
Embora tenha evitado definir prazos, a ministra Dilma afirmou que reduções reais das tarifas (e não apenas elevações menores) deverão ocorrer a partir de 2005. A implementação do novo modelo começa no dia 12 de dezembro, sexta-feira, com a publicação de duas medidas provisórias no Diário Oficial, e deverá ocupar o primeiro trimestre de 2004. Uma transição completa, porém, demorará a ocorrer. O governo respeitará os contratos bilaterais (entre geradoras e distribuidoras) fechados pelas regras do modelo antigo, e alguns deles ainda deverão durar cerca de 10 anos.
Os principais pontos do novo modelo são os seguintes: