Economia

Dólar e juros americanos dão o tom em 2005, diz economista

Para Heron do Carmo, eleito nesta semana presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo, a relação do Brasil com o Fundo Monetário Internacional poderá ser determinada pela evolução de moeda, juros e déficit americanos. Mas, para ele, uma cri

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h16.

A economia brasileira ligou o farol alto, e agora busca condições para acionar o farol de milha. Para Heron do Carmo, eleito nesta semana presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo durante 2005, o país está superando o "desassossego de curto prazo", o que comprovaria que a país evoluiu em seus fundamentos econômicos. Segundo ele, é necessário agora alongar ainda mais esse horizonte de preocupações para períodos de quatro anos, pelo menos.

Segundo Carmo, um dos temas fundamentais de 2005 será o comportamento do dólar frente às outras moedas e qual será o ritmo imposto pelo Federal Reserve (Fed), o banco central americano, à elevação dos juros. Essas variáveis, a seu ver, vão pesar na decisão do governo brasileiro de manter ou não algum tipo de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Quanto à elevação de juros empreendida pelo banco central brasileiro, Carmo afirma que a utilização do IGP como indexador de contratos de concessão de serviços públicos implica em rigidez para o sistema de metas de inflação além de não assegurar equilíbrio econômico-financeiro aos contratos. "A eficácia do aumento de juros sobre a inflação fica reduzida, porque parte do índice simplesmente não responde a juro", diz. Uma solução seria adotar índices setoriais. "Um setor que dependa muito de aço e de insumos da indústria química provavelmente teve seus custos aumentados até acima do IGP."

Abaixo, leia entrevista exclusiva concedida ao Portal EXAME.

Portal EXAME - Que aspectos devem predominar na agenda econômica brasileira em 2005?

Heron do Carmo - Tem uma questão fundamental que é o tratamento dado ao acordo com o FMI [Fundo Monetário Internacional]. Naturalmente isso está muito associado a meu ver ao cenário econômico internacional, principalmente à questão de qual será a resposta do governo americano a esse processo de desvalorização do dólar, se o Fed [Federal Reserve, banco central americano], responderá com um aumento mais agressivo da taxa de juros ou não. Isso tem implicações fundamentais. É tão importante que a simples possibilidade de o Fed aumentar a taxa de juros [em um ritmo mais forte] já afetou significativamente o risco Brasil.

EXAME - Qual a intensidade das repercussões sobre a economia brasileira caso haja uma aceleração dos aumentos de juros nos Estados Unidos?

Carmo - Uma primeira conseqüência seria que provavelmente, em um cenário como esse, o governo optaria por um novo acordo com o FMI, ou pelo menos (não se sabe a possibilidade institucional de se obter isso) uma garantia do FMI de que continuará apoiando o Brasil.

Outro efeito seria uma alteração da taxa de crescimento mundial, e mudanças nos preços de commodities. Isso tudo afetaria a economia brasileira, mas não de forma tão significativa como outras crises afetaram. Mas teria algum impacto, até porque nós já estamos no terceiro ano de governo e o próximo já é ano eleitoral, e isso pode ter implicações do ponto de vista de política eleitoral.

Se nós tivermos uma situação baseada em um acordo explícito ou tácito entre os grandes players do mundo, Estados Unidos, China, países da região do euro, isso naturalmente fará que tenhamos uma evolução mais tranqüila associada à desvalorização do dólar e ao ajuste do déficit fiscal americano, com impactos menores sobre a economia brasileira. O Brasil poderá possivelmente crescer em torno de 4%, dentro do previsto, com inflação caindo e com a perspectiva de continuidade desse crescimento para 2006. Ou seja, uma crise afetará a economia brasileira, mas sem que o país tenha um desempenho pior do que o resto do mundo, como aconteceu em ocasiões passadas. Em outras crises o Brasil nitidamente sofreu mais do que o resto do mundo.

Cada vez mais eu diria que é como se a economia brasileira tivesse ligado o farol alto. Não está ainda com farol de milha mas está com farol alto. Nós vivíamos muito naquele desassossego de curto prazo. A questão sempre era a inflação do mês, como evoluiriam os dados conjunturais a cada trinta dias. Agora já estamos preocupados com o cenário mais a médio prazo o trimestre, o ano. Isso mostra que a economia brasileira evoluiu em termos de fundamentos. O que é necessário, talvez, é alongar ainda mais esse prazo, ou seja, pensarmos em termos do que deve acontecer neste governo, no próximo, assim por diante.

EXAME - É possível fixar limites ideais da taxa de câmbio tanto para cima, a ponto de não afetar a inflação, quanto para baixo, a ponto de não prejudicar os exportadores?

Carmo - Sou contra uma determinação fora do mercado. É claro que há uma série de medidas institucionais que estão sendo analisadas, e a mudança de regulamentação do câmbio é uma medida que pode contribuir. Mas nós temos uma oportunidade que é aumentar o nível de reservas internacionais, algo que também está associado ao acordo com o FMI. É uma medida que pode dar sustentação à taxa de câmbio, para que o real não se valorize de forma a comprometer as exportações. Mas eu prefiro que não sejam adotadas medidas na contramão do mercado.

O que você pode é atenuar o efeito da ação do mercado sobre a taxa de câmbio, mas não propriamente adotar medidas que depois possam deixar um ônus para o futuro. Eu prefiriria que continuasse a política cambial pautada pelo mercado e as autoridades econômicas adotando medidas dentro da regra do jogo, até porque há uma questão que pode contribuir para pelo menos amenizar essa valorização do real, que é a possibilidade de a taxa de juros a partir de meados de 2005 começar a apresentar quedas. Isso naturalmente contribuirá para desvalorizar o real. Além disso temos a possibilidade de o Tesouro continuar comprando dólares para reforçar as reservas cambiais.

EXAME - Pelo regime de metas de inflação, o governo luta para alterar as expectativas do mercado, puxando os juros para cima. Simultaneamente, tem de respeitar contratos de concessão vigentes que estabelecem o IGP-DI como indexador. Com as altas das tarifas públicas, o governo realimenta a inflação que combate. Como escapar dessa sinuca?

Carmo - Eu escrevi alguns artigos pela Fipe defendendo índices setoriais cuja aplicação não seria uma indexação de simplesmente repassar o índice para o contrato. Em cada contrato você teria um fator x em que poderia ser repassado até mais do que a inflação a depender da situação, ou menos. Seria um avanço no sentido de desindexar a economia, por incrível que possa parecer. Porque o problema é você usar um índice geral que não garante necessariamente equilíbrio econômico-financeiro de contrato privado, porque cada setor tem suas peculiaridades. Basta ver que um setor que dependa muito de aço e de insumos da indústria química provavelmente teve seus custos aumentados até acima do IGP.

Isso deve ser feito de forma pactuada, porque não é desinteressante para as concessionárias, que teriam mais segurança quanto ao longo prazo. No curto prazo, foi interessante utilizar o IGP principalmente no momento em que houve a desvalorização cambial. Daqui para diante, já que o real passou até a se valorizar, eu diria que talvez fosse mais interessante substituir de forma pactuada o IGP por índices específicos que poderiam ser calculados pela FGV. Não vejo nenhuma dificuldade maior nisso.

A utilização do IGP cria uma rigidez para o sistema de metas de inflação. Podemos ter até uma situação em que a própria eficácia do aumento de juros sobre a inflação é reduzida. Por definição, parte do índice simplesmente não responde a juro, você pode levar a taxa para o nível que você quiser.

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