Tem sido particularmente rígida a avaliação de casos suspeitos de irregularidades (Rafael Neddermeyer/Fotos Públicas)
Estadão Conteúdo
Publicado em 24 de julho de 2018 às 16h59.
Última atualização em 24 de julho de 2018 às 17h13.
Rio - A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) está fechando o cerco contra irregularidades em fundos de previdência fechados. Na minuta de instrução que colocou em audiência pública nesta terça-feira, 24, além de propor restrições para investimentos dos chamados Regimes Próprios de Previdência dos Servidores (RPPS), abriu espaço para que os agentes do mercado avaliem também a possibilidade de estender as medidas para Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), nome técnico dos chamados fundos de pensão.
Além disso, tem sido particularmente rígida na avaliação de casos suspeitos de irregularidades que envolvem essas entidades, como na decisão que retirou do mercado por um ano a Vórtx DTVM, a Orla DTVM e a Argus Classificadora de Risco de Crédito, envolvidos em uma emissão de debêntures suspeita de irregularidades da Venture Capital Participações e Investimentos.
"A CVM está particularmente interessada em receber manifestações do mercado acerca da possibilidade de estender tais limitações a fundos com a participação relevante de outros tipos de cotistas específicos, como as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC)", declarou a autarquia no comunicado ao mercado sobre a audiência pública.
A ideia de aumentar as barreiras de investimentos para fundos de pensão não é nova e ganhou força após a operação Greenfield e a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Fundos de Pensão. Hoje mesmo, o colegiado julga o BNY Mellon em um caso envolvendo um fundo de investimento do Postalis (fundo de pensão do Correios).
Os gestores e as próprias entidades, principalmente as maiores, têm trabalhado ativamente para evitar tais medidas, o que explica a decisão da autarquia de não impor tais restrições e abrir espaço para o debate.
Na minuta para os Regimes Próprios dos Servidores, as medidas visam prioritariamente fazer com que essas entidades busquem fundos de varejo. Os gestores de fundos com mais de 15% do patrimônio nas mãos desses investidores terão várias limitações adicionais. Não poderão, por exemplo, comprar papéis de securitizadoras não registradas nem participar de ofertas públicas sob o regime de esforços restritos, nas quais o registro é dispensado.
"O porcentual (15%), à primeira vista baixo, busca estimular que os RPPS invistam em fundos ofertados ao mercado em geral e objeto de análise por parte de outros investidores. A constituição de veículos de investimento específicos para esse tipo de investidor tem se mostrado potencialmente problemática, haja vista a incidência maior de irregularidades nessas estruturas, conforme se tem evidenciado por meio da atividade de supervisão das ofertas submetidas ao rito de esforços restritos", afirma a CVM no comunicado.
O caso da Vórtx, da Orla e da Argus na emissão de debêntures da Ventura Participações explica tais medidas. O relatório da área técnica mostra que os agentes são alvo de várias investigações por realizar ofertas mediante a divulgação de informações que não se afiguram verdadeiras, consistentes, corretas e suficientes. Isso levou o colegiado a suspender os agentes por um ano. Como não puderam atuar no cancelamento das operações, já que as ofertas registrada nos termos da instrução CVM nº 476, com esforço restrito e dispensadas de registro, em tese, não podem ser canceladas, a autarquia está atuando na ponta dos investidores.
A decisão de suspensão dos agentes, porém, foi considerada controversa por advogados que acompanham a CVM. A avaliação é que a área técnica e o colegiado estão preocupados em passar uma imagem de força e testar os limites domercado, mas corre o risco de sufocar o mercado e judicializar suas ações.
"A CVM quer diminuir a impressão de que age muito depois do fato. As gestoras estão morrendo de medo porque uma decisão dessa quebra a empresa", diz um advogado que acompanha os julgamentos da CVM.
Para quem atua na defesa das empresas, há espaço para questionar as decisões na própria CVM e até judicialmente. A decisão da Ventura Participações, por exemplo, equipara gestores e administradores, quando a responsabilidade é principalmente do gestor, o que pode ser questionado na Justiça.
Apesar das críticas, a expectativa é que aumente a pressão sobre o mercado. Uma parceria firmada no fim de junho coloca a Anbima para atuar ao lado da CVM, como já faz a B3, por meio da BSM, e endereça um dos principais problemas da CVM: a falta de pessoal para realizar todas as ações de fiscalização.