Covid-19 suspende sonho americano de revolucionar o setor de energia
Gás de xisto, que passava por um aumento galopante da produção, é fortemente afetado pela forte retração da demanda
Ligia Tuon
Publicado em 22 de abril de 2020 às 13h39.
Apontado como uma das fontes mais promissoras de gás natural nos Estados Unidos, o gás de xisto , encontrado em pequenas bolhas em rochas, começou a sentir o baque da queda do preço internacional do petróleo. A commodity passa por uma crise sem precedentes. Com a demanda em baixa, em função do impacto da pandemia do coronavírus na economia global, os investidores estão pagando para para se livrar dos barris de petróleo, que vem registrando preços negativos. O mercado de gás também está sendo fortemente atingido. O revés histórico no setor de óleo levou a cotação do xisto a recuar fortemente.
Novas perfurações foram paralisadas e poços de exploração foram fechados. A expectativa é que a produção de gás de xisto seja reduzida em 20%, a maior queda da história. Antes da crise provocada pelo coronavírus, a agência de energia americana previa que o xisto representaria por 20% de toda a produção de gás americana. Há vinte anos, a produção era de apenas 1%. Agora, essas previsões estão sendo revistas. Até a expectativa para o longo prazo pode mudar. O governo americano acreditava que em 2046 cerca de 45% de todo o fornecimento de gás natural veria da produção de xisto.
Neste momento, há fortes indícios de que a queda na produção do gás de xisto possa deixar milhares de americanos desempregados. Os produtores de xisto não sabem se haverá mercado para o produto, com a queda mundial no consumo de petróleo e gás. Alguns analistas acreditam que levará tempo até a produção do xisto se recuperar, o que poderá colocar em pausa o sonho americano de uma revolução no mercado de energia.
O choque no setor de petróleo não deixa muitas esperanças para o gás natural. As petrolíferas nos Estados Unidos estão demitindo cerca de 50.000 trabalhadores, além de reduzir salários. As companhias menores correm o risco de fechar as portas. Muitas empresas estão desativando poços de petróleo. A situação é bastante preocupante. O endividamento do setor já chegou a 190 bilhões de dólares, um recorde.
O que parecia altamente improvável até um mês atrás corre o risco de se tornar realidade. Existe uma possibilidade tangível de que o faturamento das companhias do setor de energia evapore nos próximos meses. Com isso, cerca de 7 bilhões de dólares em liquidez iriam para o espaço.
O Texas, epicentro da indústria de petróleo e gás nos EUA – e um dos mais ricos do país --, a dor deverá ser ainda maior. O setor tem fama de pagar salários maiores do que a média de outros mercados e ter uma demanda constante por novos profissionais. Agora, esse cenário poderá mudar.
Companhias como a Armstrong Energy tem externado a gravidade do problema. Com os barris a um preço negativo, não vale a pena continuar investindo em produtividade nos campos de petróleo e gás. Em locais com poços mais antigos, isso pode significar a morte da produção. Para retomar a produção depois de uma pausa, o custo seria tão alto que talvez não faça sentido.
Os poços convencionais, mais antigos, já estão começando a desligar a torneira. A expectativa é que deixem de produzir 1,75 milhão de barris por dia, uma enormidade.
Na indústria de xisto, a grande preocupação é a suspensão da perfuração em novos poços. Como a produtividade costuma cair cerca de 60% em um ano, é preciso ter sempre um planejamento da exploração em novas reservas de gás.
O setor vê com maus olhos o atual cenário. A consultoria IHS prevê que a produção de petróleo deva cair para 10,1 milhão de barris por dia até o final do ano. A queda deve continuar no ano que vem e em 2022. A solução para salvar a indústria de xisto e petróleo é a chegada de novos investimentos no setor, o que por enquanto parece improvável. Se nada mudar, o gás de xisto, a grande esperança dos Estados Unidos se tornarem uma potência mundial na produção de gás natural, como já são em relação ao petróleo, terá que esperar um pouco mais.