A velha-nova estratégia varejista
O varejo físico tem se adaptado e se tornado uma força para as grandes empresas do setor no fortalecimento e engajamento da marca
Publicado em 6 de junho de 2024 às, 14h03.
*Anita Scal e Abner Melo
No primeiro trimestre deste ano, os resultados das varejistas listadas em bolsa demonstraram uma melhora que, apesar de gradual e lenta, contrasta com o um ano de 2023 marcado por inadimplência, alto endividamento e baixo crescimento de receita. Em sua grande maioria, as varejistas se concentraram em diminuir as despesas operacionais, focando suas atuações nos segmentos que mais possuem diferenciais competitivos, e eliminando suas unidades menos lucrativas.
Ao mesmo tempo, financeiramente, continuam a buscar a desalavancagem para apresentarem resultados qualitativamente melhores. Em que pese do compasso de espera, muito atrelado à incerteza das taxas terminais de juros, no Brasil e no exterior, as varejistas estão transformando seus negócios num contexto de digitalização do varejo e mudanças no perfil do consumidor.
Nos últimos anos, a despeito do aumento da participação do online, o varejo físico tem se adaptado e se tornado uma força para as grandes empresas do setor no fortalecimento e engajamento da marca.
Além de possuir um caráter personalíssimo, o varejo físico se conecta com o cliente de uma forma humanizada, se diferenciando do caráter impessoal do online. Mais do que um mero canal de vendas, a loja física mantém seu caráter de prateleira, mas se torna também a via pela qual a marca conquista e fideliza seu cliente, transportando-o para uma experiencia sensorial e emocional que, quando bem trabalhada, é capaz de aumentar as vendas de forma persistente inclusive dentro do canal online.
Recentemente, transações importantes realçaram a tendência do varejo físico como uma alavanca para grandes marcas. A marca de luxo Prada adquiriu o imóvel que abriga sua loja conceito (flagship) na 5ª Avenida , em Nova Iorque, uma das avenidas mais famosas no varejo de alto luxo e que possui o metro quadrado mais caro do mundo, pelo valor de 425 milhões de dólares.
Além disso, anunciou investimentos de 1 bilhão de euros nos próximos cinco anos para criar espaços que combinam moda, acessórios, comida e arte, transformando suas lojas em destinos-experiencia, uma estratégia que busca oferecer um ambiente imersivo no universo da marca.
Já a Kering, proprietária da Gucci, investiu 1,3 bilhão de euros na compra de um edifício histórico no bairro da moda de Milão, na Via Monte Napoleone. A empresa está expandindo sua presença em locais icônicos para revitalizar a marca e atrair consumidores que buscam experiências únicas em compras de luxo. Esse movimento reflete a importância de estar presente em locais estratégicos e altamente desejáveis, criando impacto duradouro nos clientes.
As altas cifras pagas pelos gigantes de moda se justificam pela escassez de espaços nessas localizações tradicionais para o consumo de alto padrão de varejo, como a 5ª Avenida, em Nova York, ou a Monte Napoleone, em Milão. Essas marcas não podem se dar o “luxo” não estar nesses locais de prestígio. Por isso, nesses casos, até mesmo adquirem imóveis próprios para perpetuar o conceito da marca em regiões icônicas para os segmentos em que atuam.
No Brasil, temos visto marcas buscando se diferenciar através da abertura de lojas conceitos. A Anacapri, empresa do grupo Arezzo, abrirá uma flagship na famosa rua Oscar Freire, em São Paulo, em um imóvel que terá quatro andares e um subsolo para apoio logístico. A loja não se limitará à venda de calçados: terá um espaço para café e um andar inteiro dedicado à realização de eventos.
De sua parte, a Decolar, empresa de turismo que nasceu no mundo digital, recentemente abriu suas primeiras oito lojas físicas entre outubro e novembro de 2023. A empresa reconhece que os consumidores não estão mais limitados ao físico ou ao digital, mas sim transitando entre ambos. A espanhol Inditex, dona da Zara, na contramão do mercado, busca abrir novas lojas de até 9 mil m², em detrimento das lojas menores. No Shopping Pátio Higienópolis, no ano passado, a marca abriu sua loja conceito e uma das maiores do Brasil. Encerrou o ano com 53 lojas no país, com um aumento ano contra ano de 37% em seu Ebtida.
Na vanguarda desta “velha-nova” tendência do varejo, o Fundo Rio Bravo Renda Varejo buscou formar um portfólio que tivesse como principal caraterística a localização privilegiada, em que a escassez e a dominância histórica pudesse ser atrativos importantes para as marcas optarem por se posicionarem no imóvel. Alinhado com essa estratégia, em fevereiro deste ano, o Fundo adquiriu um imóvel localizado na Al. Gabriel Monteiro da Silva, que se localiza próximo à Avenida Rebouças, à Avenida Faria Lima e à Avenida Brasil, para a construção de uma loja conceito (flagship) para a empresa de cerâmica Portobello, que irá operar com a bandeira Portobello Shop. A localização é considerada extremamente valorizada por profissionais de arquitetura, uma vez que lá é possível encontrar mais de 140 lojas de alto padrão voltadas para o segmento de casa e construção.
Outros ativos que completam a lista do portfólio, que chega a representar 25% dos ativos investidos do fundo, são: dois imóveis localizados na Avenida Paulista, que abriga a loja conceito da Centauro e uma agência do Santander; um imóvel na Avenida Rebouças locado para o GPA, que opera no imóvel com a bandeira Pão de Açucar; rua Oscar Freire, locado para a Renner; rua Haddock Lobo, locado para o Coco Bambu; e o Investment Center do Itaú no Leblon. Através do mapa ao lado, conseguimos verificar que o Fundo formou de maneira ativa um portfólio localizado no principal eixo de São Paulo, adquirindo know-how e vantagem comparativa para as negociações de novos empreendimentos e com novas marcas.
* artigo de Anita Scal, sócia e diretora de Investimentos Imobiliários, e Abner Melo analista de Portfolio da Rio Bravo. Este artigo faz parte da Carta Estratégias de maio, relatório mensal distribuído pela Rio Bravo a seus clientes e reproduzido com exclusividade pela EXAME Invest.