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Repaginada, a velha discussão fiscal volta ao centro do debate

Passado o pior momento da crise, será imperativo reajustar o curso do navio para o rumo anterior de ajuste nas contas públicas

ECONOMIA: ainda não está claro se o governo estenderá ou não o auxílio emergencial. (André Coelho/Getty Images)
JR

Janaína Ribeiro

Publicado em 7 de agosto de 2020 às 18h45.

Nestes últimos dias, tem vindo a público que o governo estuda estender o auxílio- emergencial. O que à primeira vista parece uma ótima ideia dado que, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a distribuição do auxílio-emergencial de R$ 600 fez o Brasil registrar entre maio e junho o menor percentual de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza nos últimos 40 anos.

Porém, embora concorde que o momento peça por políticas econômicas expansionistas, há alguns pontos que devemos ter em mente. O governo Bolsonaro foi eleito sob a bandeira econômica de ajuste nas contas fiscais, que foram bastante sacrificadas nos governos anteriores, justamente pelo excesso de assistencialismo. Não à toa, tivemos a Reforma da Previdência em 2019, que foi muito positiva nesse aspecto, assim como uma agenda futura para evitarmos problemas com a dívida pública mais para frente.

Em 2020, as contas fiscais sofreram um baque, por razões justas – o enfrentamento dos efeitos da pandemia na economia. Não havia outra solução a não ser entrar com estado de calamidade e gastar muito para enfrentar o desconhecido. Com isso, as despesas do governo saltaram em 6 meses dos já incômodos ~19% do PIB para 24% do PIB, com queda na arrecadação, gerando um déficit primário de 6,4% do PIB.

Porém passado o pior da crise, será necessário reajustar o curso do navio para o rumo anterior de ajuste nas contas públicas. Assim, a decisão sobre por quanto tempo e qual valor será estendido o benefício deve ser muito bem planejada pelo governo, mesmo que traga benesses a economia no curto prazo.

Há outra questão começando a ser discutida -- que me parece ainda prematura: alguns começam a levantar dúvidas, de que o benefício seja usado para ganhar votos nas próximas eleições. Isso porque segundo uma pesquisa eleitoral do Banco XP de junho, na população que ganha até dois salários mínimos, e portanto onde estão os beneficiários, houve aumento de 4pp na avaliação de ótimo/bom do governo de abril em junho, assim como na região Nordeste do País (onde o percentual de classe mais vulnerável é maior) que mostrou aumento de 3pp no mesmo período.

Lembrando que não foi batido até a presente o martelo sobre a extensão do auxílio ou de atitudes assistencialistas acima das praticadas ao redor do mundo em resposta da atual crise. Mas esse incomodo político, caso ganhe força nos formadores de opinião levaria temor aos mercados financeiros. Basicamente, porque seria um indício de excesso de gastos, quase populismo (???), uma característica que vimos recorrentemente na política brasileira desde 2006; mas que sempre foi repudiada pelo governo atual.

Já aprendemos com a história recente que, excesso de gastos nos deixaram de presente inflação alta por conta de forte impulso ao consumo, sem contraparte de investimentos, e que geraram baixo crescimento. Além de sabermos que o resultado não é satisfatório, desta vez, num caso de escolhas dessas práticas, a grande diferença seria que não temos contas fiscais gordinhas e fartura no mercado internacional que permita peripécias de gastos, inflando o consumo.

Assim, repito: passado o pior momento da crise, será imperativo reajustar o curso do navio para o rumo anterior de ajuste nas contas públicas. E nesse sentido a reforma tributária pode ajudar, assim como a continuidade dessa agenda de reformas.

Fernanda Consorte – economista-chefe do Banco Ourinvest

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Nestes últimos dias, tem vindo a público que o governo estuda estender o auxílio- emergencial. O que à primeira vista parece uma ótima ideia dado que, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a distribuição do auxílio-emergencial de R$ 600 fez o Brasil registrar entre maio e junho o menor percentual de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza nos últimos 40 anos.

Porém, embora concorde que o momento peça por políticas econômicas expansionistas, há alguns pontos que devemos ter em mente. O governo Bolsonaro foi eleito sob a bandeira econômica de ajuste nas contas fiscais, que foram bastante sacrificadas nos governos anteriores, justamente pelo excesso de assistencialismo. Não à toa, tivemos a Reforma da Previdência em 2019, que foi muito positiva nesse aspecto, assim como uma agenda futura para evitarmos problemas com a dívida pública mais para frente.

Em 2020, as contas fiscais sofreram um baque, por razões justas – o enfrentamento dos efeitos da pandemia na economia. Não havia outra solução a não ser entrar com estado de calamidade e gastar muito para enfrentar o desconhecido. Com isso, as despesas do governo saltaram em 6 meses dos já incômodos ~19% do PIB para 24% do PIB, com queda na arrecadação, gerando um déficit primário de 6,4% do PIB.

Porém passado o pior da crise, será necessário reajustar o curso do navio para o rumo anterior de ajuste nas contas públicas. Assim, a decisão sobre por quanto tempo e qual valor será estendido o benefício deve ser muito bem planejada pelo governo, mesmo que traga benesses a economia no curto prazo.

Há outra questão começando a ser discutida -- que me parece ainda prematura: alguns começam a levantar dúvidas, de que o benefício seja usado para ganhar votos nas próximas eleições. Isso porque segundo uma pesquisa eleitoral do Banco XP de junho, na população que ganha até dois salários mínimos, e portanto onde estão os beneficiários, houve aumento de 4pp na avaliação de ótimo/bom do governo de abril em junho, assim como na região Nordeste do País (onde o percentual de classe mais vulnerável é maior) que mostrou aumento de 3pp no mesmo período.

Lembrando que não foi batido até a presente o martelo sobre a extensão do auxílio ou de atitudes assistencialistas acima das praticadas ao redor do mundo em resposta da atual crise. Mas esse incomodo político, caso ganhe força nos formadores de opinião levaria temor aos mercados financeiros. Basicamente, porque seria um indício de excesso de gastos, quase populismo (???), uma característica que vimos recorrentemente na política brasileira desde 2006; mas que sempre foi repudiada pelo governo atual.

Já aprendemos com a história recente que, excesso de gastos nos deixaram de presente inflação alta por conta de forte impulso ao consumo, sem contraparte de investimentos, e que geraram baixo crescimento. Além de sabermos que o resultado não é satisfatório, desta vez, num caso de escolhas dessas práticas, a grande diferença seria que não temos contas fiscais gordinhas e fartura no mercado internacional que permita peripécias de gastos, inflando o consumo.

Assim, repito: passado o pior momento da crise, será imperativo reajustar o curso do navio para o rumo anterior de ajuste nas contas públicas. E nesse sentido a reforma tributária pode ajudar, assim como a continuidade dessa agenda de reformas.

Fernanda Consorte – economista-chefe do Banco Ourinvest

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