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O câmbio escancara o tamanho da nossa fragilidade

O cenário de taxa de câmbio mais baixa ou voltando a patamares pré-pandemia está cada vez mais longínquo

 (Nelson A Ishikawa/Getty Images)
(Nelson A Ishikawa/Getty Images)
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Fernanda Consorte

Publicado em 6 de outubro de 2021 às, 14h20.

Por Fernanda Consorte

Entramos no último trimestre do ano, e estou com a sensação de que se eu buscasse um texto meu no primeiro trimestre deste ano seria ainda válido. Salvo a evolução positiva (não resolução) da pandemia, as condições econômicas seguem parecidas, com os mesmos conteúdos verborrágicos do governo e problemas fiscais. Talvez uma evidência maior de reprovação e tentativas de medidas populistas. Tanto que seguimos com uma taxa de câmbio ao redor de US$/R$ 5,30.

Porém setembro trouxe um novo sabor. As condições na China pioraram. E quando se fala em China, os países emergentes, sobretudo nós, ficam atentos. De fato, o caso da gigante Evergrande atravessa momentos difíceis que a deixam à beira da falência (um suprime chinês?). A empresa tem uma dívida enorme que gira em torno de US$ 300 bilhões. As ações da empresa caíram 80% até agora este ano, coincidindo com o aperto regulatório imposto no ano passado pelas autoridades chinesas. E, nesse cenário, o Brasil, que fornece uma parte relevante do minério de ferro usado para erguer os arranha-céus no país, está no topo da lista dos potenciais prejudicados.

Vale mencionar que casas de pesquisa econômica de renome revisaram para baixo a expectativa do PIB da China para este ano. E, acreditem, qualquer 0,1% no PIB chinês faz diferença no Brasil e é refletido na taxa de câmbio. O Brasil é um país grande, mas frágil. E situações como essa só expõe essa nossa fragilidade.

Dessa forma, hoje, considerando as mazelas do cenário doméstico, (inflação, questões fiscais em aberto, eleições desafiadoras, tudo isso num caldeirão com possibilidade de medidas expansionistas de cunho populista) o cenário de taxa de câmbio mais baixa ou voltando a patamares pré-pandemia está cada vez mais longínquo.

Recentemente, soltamos um relatório no banco em que trabalho colocando 4 possíveis cenários para a taxa de câmbio nos próximos 12 meses e, em nenhum deles, meus colegas, vemos a chance de o real valer perto de R$ 4,50 por exemplo, mesmo tudo dando muito certo.

Em resumo, partindo do patamar médio atual (US$/R$ 5,30), supomos um caminho com esperança de não ser tão catastrófico. Ou seja, o cenário externo também segue sem grandes solavancos, inclusive em relação à política monetária dos EUA que deve retirar seus estímulos de forma gradual e a China que não segue a desaceleração esperada.

Da mesma forma, a eficiência da vacinação é confirmada no Brasil e no mundo. Porém as eleições nos trarão mais incertezas diante do ambiente polarizado. Esse ambiente mais incerto impede a possibilidade de discussões de reformas estruturais; aqui vemos um Congresso congelado à espera dos resultados das eleições de outubro de 2022. Isso compromete a recuperação econômica, diante da ausência de investimentos e confiança do empresariado, e a taxa de câmbio pode se depreciar um pouco mais - algo entre US$/R$ 5,30-5,70.

Porém caso o cenário externo siga surpreendendo negativamente e o cenário interno seja agravado pela crise política e institucional e não haja espaço para o surgimento de uma terceira via para as eleições de 2022; a coisa pode piorar e muito. Pois continuaríamos com um ambiente político difícil, com constantes quedas de braço entre Legislativo e Executivo, sem clima algum para a agenda de reformas. Além disso, o governo atual se vê ainda mais coagido, gerando aptidão para medidas populistas, com aumento de gastos públicos com intuito de angariar votos. A combinação desses fatores provocaria piora no cenário econômico com choque na confiança dos agentes diante do aumento dos gastos fiscais, inflação e juros num ambiente de baixo crescimento. Com isso, há uma pressão adicional na taxa de câmbio, que poderia ficar entre US$/R$ 6,00 – 6,30.

Esse último não é nossa expectativa, mas tudo pode acontecer. Somos mais frágeis do que possamos perceber.

Fernanda Consorte é Economista-chefe do Banco Ourinvest