Ciência

Terapia reverte surdez em ratos e traz esperança para humanos

Cobaias que gradualmente perderiam sua audição tiveram esse processo freado, dando esperança para humanos com histórico genético desfavorável

Surdez: terapia genética reverte surdez em ratos e traz esperança a humanos (Pawel_Czaja/Thinkstock)

Surdez: terapia genética reverte surdez em ratos e traz esperança a humanos (Pawel_Czaja/Thinkstock)

Victor Caputo

Victor Caputo

Publicado em 23 de dezembro de 2017 às 08h00.

Última atualização em 23 de dezembro de 2017 às 08h00.

Ratos com perda de audição foram impedidos de ficar completamente surdos graças a uma técnica de edição de DNA. O procedimento, descrito em um estudo publicado na revista Nature, é o primeiro desse tipo a obter sucesso em testes in vivo, e a principal esperança para o tratamento também de humanos —especialmente em famílias com histórico genético do problema.

A cura da surdez em ratos é mais um feito científico assinado pela ferramenta de edição genética da moda, a CRISPR-Cas9. Seu primeiro grande sucesso data de 2016, quando um grupo chinês editou glóbulos brancos de um paciente com câncer de pulmão e devolveu ao organismo, para que ele próprio fosse capaz de lutar contra o tumor. No mês passado, os cientistas deram um importante salto nesse sentido, passando a utilizá-la para editar o DNA dentro do corpo.

Ao invés de testar diretamente com cobaias humanas, o experimento atual apostou em uma espécie conhecida como “rato Beethoven”. Essa variedade de roedor, comum em testes de laboratório, é editada geneticamente para possuir uma característica importante: perder gradativamente sua capacidade de audição desde o nascimento — referência, claro, ao compositor alemão Ludwig von Beethoven, que ao fim da vida, conta-se, compunha suas peças já completamente surdo.

A melhor forma de imaginar o funcionamento da CRISPR-Cas9 é pensando nela como uma “tesoura molecular”. Injetada no corpo de uma cobaia, a ferramenta é capaz de recortar um trecho do código genético de um gene e substituí-lo, sem comprometer a parte saudável.

A mutação inconveniente, que acontece em um gene chamado “Tmc1”, atua de forma simples: destruindo pequenos pêlos do interior do ouvido, necessários para a audição. Sem essas estruturas, que vibram com a chegada do som e fazem o  cérebro interpretar os barulhos, a cobaia, pouco a pouco, vai ficando incapaz de escutar.

Os pesquisadores, então, injetaram a CRISPR Cas-9 nos dois ouvidos dos ratos Beethoven, um dia depois de seu nascimento. Uma vez instalada no organismo, a ferramenta cortava o pedaço de DNA responsável pelo problema. “Assim, o gene mutante não conseguia mais comprometer as células dos pêlos, ou causar a sua morte”, explica David Liu, um dos autores da pesquisa, em entrevista à NPR. Com os pêlos devidamente no lugar, os ratos paravam de perder sua audição com o tempo.

Um mês depois da mudança, os ratos tratados já conseguiam escutar de forma muito mais acurada. Enquanto as orelhas que passaram por terapia genética estavam muito mais atentas, ouvindo sons equivalentes “a uma conversa baixa”, aquelas que não enfrentaram a terapia precisavam de estímulos mais altos, “da altura de um triturador de lixo”, conta Liu, para responder — um ganho surpreendente, estimado em 15 dB.

A ideia é que a técnica consiga combater esse tipo raro de mutação também em humanos, permitindo que bebês que tenham nascido com perda progressiva de audição não terminem a vida completamente surdos. Sabe-se que crianças que nascem com essa mutação no Tcm1 perdem completamente a capacidade de ouvir em 10 ou 15 anos, no máximo. É necessário ainda mais esforços de pesquisa na área, destacam os cientistas, para que a técnica seja oficialmente testada em humanos.

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