Em fase de aprovação no Brasil, como o remdesivir atua contra covid-19?
Medicamento da Gilead Sciences é capaz de parar a reprodução do vírus no corpo humano; no Brasil, pode ficar disponível no SUS uma vez que for aprovado
Tamires Vitorio
Publicado em 29 de setembro de 2020 às 10h28.
Última atualização em 29 de setembro de 2020 às 16h02.
O antiviral experimental remdesivir é considerado oprimeiro tratamento promissor na luta contra o novo coronavírus , doença que já deixou mais de um milhão de mortos no mundo todo. Aprovado para uso comercial em alguns países e para uso emergencial em outros, no Brasil a medicação teve os testes clínicos aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas ainda não pode ser utilizado em pacientes infectados pelo vírus.
Segundo a farmacêutica americana Gilead Sciences, já existe no órgão regulatório o pedido para a aprovação do uso da medicação de forma emergencial no país, assim como aconteceu nos Estados Unidos --- e, para conseguir alcançar o máximo de pessoas, também existe um pedido para a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) incorporar a medicação no Sistema Único de Saúde (SUS) , uma vez que ela for aprovada para utilização.
Em entrevista à EXAME , Rita Manzano Sarti, médica infectologista e diretora médica da Gilead, afirmou que ainda não se pode prever quando a aprovação acontecerá. Por aqui, os testes do remdesivir são realizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), mas a Gilead está de olho em testar novas formas da medicação no Brasil. "Um estudo sobre o uso da droga inalatória e também para uso pediátrico deve começar no ano que vem, assim que também for aprovado e conseguirmos definir quais serão os centros de pesquisa", explica Sarti.
Atualmente, o remdesivir é administrado de forma intravenosa nos países em que seu uso é aprovado. Em junho, em uma carta aberta, o presidente da Gilead, Daniel O’Day, afirmou que a versão inalável do antiviral "permite uma administração mais fácil fora do hospital, em estados menos avançados da doença" e pode ser feita com a utilização de um nebulizador.
Para Eric Bassetti, gastroenterologia e diretor médico associado da Gilead, a versão inalável da droga traz exatamente esses benefícios para a população. "A vantagem de utilizar a versão inalatória é não ter que estar em hospitais e o paciente poder usar isso em casa", diz Bassetti.
O que é o remdesivir?
Inicialmente criado pela farmacêutica americana para tratar doenças como hepatite C e RSV (um vírus que, assim como o coronavírus, causa infecções respiratórias), o remdesivir (em qualquer formato) é capaz de imitar uma parte do RNA viral da covid-19, o que o faz ser uma prevenção necessária para que o RNA não se instaure de forma mais grave no organismo humano. Dessa forma, o vírus não consegue se reproduzir ou se replicar e todo o processo de infecção se torna mais lento.
O medicamento já foi testado para uso em casos de Ebola e de SARS e MERS --- mas nunca foi aprovado para o uso nesses casos.
Em agosto, a Gilead afirmou que a medicação foi responsável por uma redução de 62% na mortalidade em casos do novo coronavírus . A análise foi feita com base no ensaio SIMPLE-Grave, em Fase 3 de testes, que incluiu 312 pacientes tratados com a medicação e outros 818 com características parecidas, mas que receberam os tratamentos padrão contra a covid-19.
Em pacientes tratados com o remdesivir, a a taxa de mortalidade ficou em 7,4% no 14º dia da infecção. Já o outro grupo teve uma taxa de mortalidade de 12,5%. Os resultados da análise comparativa também mostraram que 74,4% dos pacientes tratados com remdesivir se recuperaram na segunda semana, versus 59% dos pacientes que recebem tratamento padrão.
Uma outra pesquisa realizada em março, mas divulgada em julho, mostrou que o remdesivir tem uma eficácia melhor logo no início da doença. Realizado com 500 pessoas de forma duplo-cega (quando nem o paciente e nem o médico sabem qual medicação está sendo administrada) e com dois grupos (um que foi medicado com o remdesivir e outro com placebo), o estudo mostra que, uma vez que o paciente está no hospital, mas com quadros leves a moderados, houve uma redução de 78% da mortalidade. Em casos mais graves, no entanto, o remdesivir não foi capaz de reduzir as taxas de mortalidade da doença.
Além do remdesivir
Outros tratamentos experimentais, comoa dexametasona , um anti-inflamatório corticosteroide que também é utilizado em crises de asma e também por alpinistas no combate aos efeitos da falta de oxigênio em altas altitudes, tem sido testados no mundo para utilização contra o SARS-CoV-2. Em um estudo divulgado em junho, o anti-inflamatório reduziu em até um terço o risco de morte dos pacientes entubados usando respiradores mecânicos; e em um quinto para pessoas que estavam recebendo oxigênio suplementar por causa do coronavírus.
Outro anti-inflamatório, chamado de EDP1815 , foi testado em pacientes com psoríase (doença na qual células de pele se acumulam e causam coceira e irritação) e apresentou resultados que podem ajudar pessoas também em estados iniciais do novo coronavírus.
O remdesivir, entretanto, é o único antiviral a ser testado contra a doença.
Vale lembrar que o remdesivir não é uma vacina, ou seja, a medicação é capaz somente de atuar em casos nos quais a pessoa já contraiu o SARS-CoV-2, não para prevenir infecções.
Quem é a Gilead
A Gilead é uma biofarmacêutica avaliada em 96 bilhões de dólares. Fundada em 1987 pelo médico Michael L. Riordan, a empresa é uma das maiores fabricantes de medicamentos dos Estados Unidos e faz parte do índice S&P 500, que reúne as companhias mais importantes da bolsa americana.
No Brasil, a farmacêutica tem escritórios em São Paulo e em Brasília. Só neste ano, com o otimismo dos investidores pelos testes bem-sucedidos do Remdesivir, as ações da Gilead subiram 26%.