Jack e Rose (Titanic)
Anderson Figo
Publicado em 4 de dezembro de 2017 às 10h47.
Última atualização em 4 de dezembro de 2017 às 10h53.
Não precisa nem ser grande fã da Sessão da Tarde para já ter visto a cena uma dúzia de vezes. Após o Titanic se partir em dois e começar a submergir por completo, Jack e Rose se lançam no mar gelado e aguardam ajuda. Há, porém, uma sutil diferença: enquanto a moça está “confortavelmente” apoiada em uma prancha improvisada, o jovem se apoia no pedaço de madeira pela borda, com o corpo mergulhado nas águas geladas do Atlântico. A morte do herói é inevitável, e acontece antes mesmo de Rose ser resgatada.
Para quem assiste, a insatisfação com o desfecho é inevitável. Além da vontade de ver na tela o bom e velho final feliz, a solução dada pelo roteiro simplesmente não convence. Tudo por conta de um questionamento simples: por que Jack não subiu no abrigo de madeira junto de sua amada, mesmo com a nítida impressão de que cabia mais um corpo ali? Teria o mocinho se apavorado com a situação a ponto de perder sua noção espacial por completo? Ou os espectadores é que desprezam por completo as leis da física e enxergam uma possibilidade que não existia?
A própria Kate Winslet, que interpreta Rose, já brincou que sua personagem fora um tanto egoísta, “Eu concordo. Eu acho que na verdade ele caberia naquela porta”, disse, em entrevista a um programa de TV dos EUA. Da mesma maneira, vários fãs já tentaram apelar para a ciência para cravar que sim, dava para Rose ter ‘dado uma beira’ para seu amante e salvado ambos do naufrágio. A tentativa mais famosa de comprovar a tese foi a dos Caçadores de Mitos, que testaram fatores como o peso da embarcação e propuseram, inclusive, um plano infalível de resgate — como você pode assistir aqui abaixo.
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A ideia pareceu convincente para todo mundo. Menos para James Cameron, diretor do filme. Em entrevista concedida este ano ao The Daily Beast, ele chegou a refutar os argumentos utilizados na tentativa de Adam Savage e Jamie Hyneman. “Ok, vamos imaginar a situação: você é o Jack e está na água a -2ºC, quando seu cérebro começa a ser afetado pela hipotermia. O ‘Caçadores de Mitos’ pede a você que retire seu colete salva-vidas, retire o dela, nade por debaixo da tábua, prenda os coletes de alguma forma que eles não se soltem dois minutos depois — o que significa que você estará debaixo d’água amarrando esse negócio sob uma temperatura abaixo de zero, o que levaria entre 5 e 10 minutos. Ou seja, quando você for voltar, já estará morto. Então isso não funcionaria. A melhor opção para ele era manter a parte superior do seu corpo fora da água e esperar que um barco ou qualquer outra coisa o retirasse do mar antes de morrer.”
A resposta definitiva, é claro, não iria convencer por completo os fãs. Mais hora menos hora, o questionamento apareceria novamente. Foi o que aconteceu em uma nova entrevista de Cameron, dessa vez, para a revista Vanity Fair. Aproveitando o aniversário de 20 anos do filme, completados em 2017, um incauto repórter resolveu reviver o debate sobre a tal porta de madeira pequena-demais-para-duas-pessoas. O argumento do cineasta, porém, foi outro bem diferente. Cameron desistiu de justificar a escolha do ponto de vista científico e apelou para um porquê, digamos, mais subjetivo.
“A resposta é muito simples. O roteiro diz, na página 147, que Jack morre. Muito simples… é claro que foi uma escolha artística, a placa era grande o suficiente para segurá-la, mas não para aguentar também o peso dele… eu acho que é meio besta termos essa discussão 20 anos depois. Mas isso mostra que o filme conseguiu mostrar um Jack tão cativante para o público a ponto de sua morte ser algo difícil de lidar… se ele vivesse, o final do filme poderia ser sem sentido… o filme é sobre morte e separação; ele tinha que morrer. Assim é a arte, as coisas acontecem por motivações artísticas, não físicas.”
Ok, James, entendemos seu ponto. Mas que cabia, isso cabia.