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"O Mercado de Notícias" discute pecados do jornalismo

Documentário de Jorge Furtado discute sobre os critérios, falhas e importância da imprensa no Brasil

Atores durante ensaio da peça O Mercado de Notícias, na Biblioteca Pública do Rio Grande do Sul (Fábio Rebelo/Divulgação)
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Da Redação

Publicado em 6 de agosto de 2014 às 17h23.

São paulo - Sempre muito original, o cineasta Jorge Furtado (Saneamento Básico: O Filme) foi buscar numa peça teatral da Inglaterra elisabetana do século 17 um paralelo para estabelecer uma perspectiva histórica para a aguçada discussão sobre critérios, falhas e importância da imprensa no Brasil em seu novo documentário, O Mercado de Notícias.

O filme estreia em dez cidades: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Salvador, João Pessoa, Santos e Juiz de Fora.

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Concorrente na seção principal do Festival É Tudo Verdade e multipremiado no Cine PE, em Recife, o filme de Furtado empresta o título da própria peça – O Mercado de Notícias, de Ben Jonson (1572-1637) -, que surge no mesmo momento histórico em que começam a circular os primeiros jornais.

Já ali se estabelecem os desafios da própria atividade, a partir da constatação de que não há fatos brutos na natureza. Todo e qualquer acontecimento, então, é passível de seleção, análise, interpretação. Portanto, também de erros jornalísticos.

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Dentro dessa discussão, o documentário debate a própria essência do jornalismo, ou seja, a obrigação de escolher o que publica ou não, o que cobre ou não, a necessidade de encontrar a novidade, de revelar histórias, equilibrando essa urgência com outra, não menos crucial: a da própria sobrevivência econômica e comercial.

Um aspecto que leva alguns a apostarem no sensacionalismo e, em última análise, no antijornalismo, para garantir altas tiragens e grandes receitas publicitárias.

Entre outros riscos implícitos à atividade, os jornalistas sempre dependem das fontes e elas, como se sabe, não raro têm seus interesses – que precisam ser filtrados, como observa no filme Geneton Moraes Neto.

Há uma indiscutível atualidade na discussão proposta por O Mercado de Notícias no Brasil atual, em que a imprensa tantas vezes pauta o debate político. Sempre foi assim? Depoimentos lembram que, até o golpe de 1964, havia uma identificação entre jornais e partidos – cada um tinha o seu.

Depois, praticamente todos se unem na resistência ao regime autoritário, que finalmente atingiu os interesses gerais, pela censura. Depois da redemocratização, em 1985, tornam-se não raro, muito conservadores.

Diretor da revista Carta Capital, o veterano Mino Carta não se esquiva de definir: A mídia brasileira é um partido político.

E o que é pior, não se aceita como agente político, escondendo-se por trás de uma suposta isenção, ao mesmo tempo em que elege escândalos e personagens a quem crucificar impiedosamente e outros de quem oculta ou relativiza os pecados.

Menciona-se ainda outras mazelas, como erros crassos e trágicos - sendo o caso da Escola Base o maior da memória recente, talvez.

Outros são lembrados: o quadro de Picasso, denunciado numa repartição do INSS, que não passava de um pôster, desses que se compram em qualquer museu; e a famosa bolinha de papel da última campanha presidencial do candidato José Serra.

Se tivesse sido feito mais recentemente, certamente o documentário poderia incluir a cobertura catastrofista que precedeu a Copa do Mundo.

Saindo de um modelo de documentário dependente exclusivamente de entrevistas, Furtado intercala as conversas com treze experientes jornalistas brasileiros com trechos de uma encenação da própria peça, a partir de uma tradução feita por ele mesmo e pela professora Liziane Kugland.

O recurso permite uma certa leveza, porque permite a inserção de comentários cínicos pertinentes aos tópicos em debate.

Para quem, no fim de contas, tiver a impressão de que Furtado é contra o jornalismo, ele mesmo contra-argumenta, defendendo, no material de divulgação, que seu filme é uma defesa do bom jornalismo, sem o qual não há democracia.

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