Muito obrigado é expressão que faz diferença nas empresas
As empresas inventam vários programas para reconhecer os funcionários, mas se esquecem de uma prática simples que faz muita diferença: o agradecimento
Da Redação
Publicado em 28 de novembro de 2013 às 17h21.
São Paulo - Muito esforço e pouco reconhecimento. Esta é a reclamação de mais da metade dos brasileiros em relação aos seus empregos, uma sensação que vem se intensificando ano a ano. E, se alguém pensa que reconhecimento significa ganhar mais, se engana: um terço dos trabalhadores abriria mão do dinheiro por um simples “obrigado”.
É isso o que revela uma pesquisa realizada pela filial brasileira da International Stress Management Association (Isma), uma associação internacional que pesquisa causas e tratamentos para o estresse. Em 2010, ao entrevistar 1 000 pessoas em Porto Alegre e São Paulo sobre motivos de estresse no trabalho, os consultores da Isma depararam com esse resultado: 57% dos entrevistados sentiam uma discrepância no esforço que despendiam nas suas funções e no quanto eram reconhecidos. Em 2009, eram 32%.
Esse desequilíbrio traz consequências muito mais sérias do que decepções passageiras com os chefes. No longo prazo, a falta de reconhecimento causa problemas de saúde, já que as pessoas muito comprometidas ficam suscetíveis à exaustão e a problemas de autoestima por não serem valorizadas. Segundo estudos internacionais, o risco de desenvolver uma doença cardiovascular ou um transtorno depressivo aumenta em três vezes após um grande esforço com baixa recompensa no serviço.
Para as empresas, isso também significa prejuízo. De acordo com a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente da Isma-BR, 38% dos indivíduos que participaram da pesquisa no Brasil faltavam ao trabalho com frequência (absenteísmo), enquanto outros 42% iam para o emprego, mas deixavam o pensamento em outro lugar (presenteísmo).
O fim das relações
O abismo entre o esforço e a recompensa no ambiente empresarial começou a ser estudado nos anos 1990 pelo alemão Johannes Siegrist, diretor e professor do departamento de sociologia médica da Universidade de Duesseldorf. Segundo ele, sempre houve uma discrepância entre o esforço e a recompensa, mas a situação ficou crítica no mundo globalizado. Com uma economia global, os executivos pressionam mais pelo retorno do investimento. E os trabalhadores sofrem com a falta de segurança, os baixos salários e a insatisfação no emprego.
Outros fatores contribuem para aumentar essa distância. Parte dos afazeres hoje se restringe a processar, controlar e coordenar. O sedentarismo se tornou dominante. E a separação entre vida pessoal e vida profissional está por um fio. Trabalho remoto, reuniões virtuais, comunicadores instantâneos, e-mails, flexibilidade no horário e no local de trabalho reduzem as interações entre as pessoas.
“A pressa está impedindo a todos de fazer e acontecer — e fazendo-nos esquecer da comunicação verbal”, diz a professora Vera Cavalcanti, coordenadora do curso de liderança da FGV in Company. “Nós perdemos o contato visual, uma vez que só nos comunicamos por palavras escritas, que se encurtam cada vez mais e quase viram siglas. Perdemos um aspecto rico da comunicação, porque à distância não é possível avaliar a entonação, o olhar, o gestual”, explica Vera.
Algumas organizações já perceberam isso e estão tentando resgatar o engajamento dos colaboradores ao criar programas de reconhecimento interno. Prometem viagens, ingressos de cinema, jantar no melhor restaurante da cidade com acompanhante. Apesar do esforço, é comum ouvir do empregado: ‘Preferia minha parte em dinheiro’.
O problema é que, embora válidas, as ações não são perenes. Segundo Jeffrey Jolton, executivo da consultoria americana Kenexa, o dinheiro (em espécie ou embutido em brindes) é uma maneira importante de mostrar aos empregados o quanto eles são importantes para a companhia. Porém, isso não se sustenta como força motivacional para a maioria dos indivíduos. O que não quer dizer, obviamente, que basta a organização passar a dizer “obrigado” para cada conquista profissional, sem recompensar de forma justa, que tudo vai ficar bem. “Isso também não é sustentável”, alerta a professora Vera.
A lógica é complexa: tapa no ombro é importante, mas tapa no ombro sem salário digno é inútil. Por outro lado, salário alto, bônus e prêmios são ótimos, mas não são eles que farão as pessoas trabalharem mais motivadas no dia a dia. Jeffrey Jolton defende que o entusiasmo dos colaboradores é mais influenciado pela forma como eles são tratados no ambiente de trabalho do que pelo dinheiro.
Sawu Bona
Uma pesquisa da consultoria Kenexa mostra que 55% dos empregados afirmam que são reconhecidos quando fazem um bom serviço. Contudo, quando perguntados se se sentem valorizados, apenas 41% dizem “sim”. E 32% dizem “não”. Em outras palavras: menos da metade da força de trabalho se sente valorizada; e um terço acredita que não o é.
Quando o funcionário ganha um jantar num restaurante caro, ele fica feliz, mas não se sente valorizado por isso. O mesmo acontece quando o presidente da empresa manda um e-mail generalizado para todos agradecendo as metas cumpridas durante o ano e pedindo engajamento para o próximo. Tal mensagem não causa efeito no moral da equipe. É algo feito quase como por educação — e o time percebe isso. Para ter efeito, a ação precisa ser sincera, algo como o praticado por uma tribo africana quando um cumprimenta o outro.
De acordo com a professora Vera Cavalcanti, da FGV in Company, os membros dessa tribo saúdam uns aos outros com a expressão sawu bona (se diz “savú bona”), que significa “eu vejo você”. “É diferente do nosso ‘Tudo bem?’, no qual não nos interessa a resposta”, diz ela. “O sawu bona resgata a relação de amorosidade, o respeito pelo outro, o estar pronto para ver e ouvir o outro.”
Foi mais ou menos o que fez Douglas Conant, presidente da Campbell Soup, líder mundial na venda de sopas enlatadas por mais de uma década. Ele publicou um artigo no qual revelou que há mais de dez anos gasta alguns minutos do seu dia escrevendo notas de agradecimento aos colaboradores de destaque. Nesse período, ele preparou mais de 30 000 bilhetinhos com um simples “obrigado”.
Segundo a psicóloga Ana Maria Rossi, ações simples como essa são as mais eficazes. “É colocar um bombom na mesa do empregado ao voltar do almoço para agradecê-lo daquele relatório complexo; é mandar um bilhetinho dizendo o quanto seu trabalho é importante, ou dizer o quanto a pessoa o ajuda.” Você, nesse caso, destaca quem realmente foi importante naquela ação — atitude muito mais sincera, justa e significativa do que mandar e-mails coletivos.
Ações desse tipo são fáceis de executar e trazem resultados elevados, já que quem as recebe se sente extremamente valorizado, — muito mais, talvez, do que se tivesse ido jantar num restaurante cinco estrelas sem que o próprio chefe participasse do reconhecimento. E isso não chega a ser uma grande descoberta.
Uma pesquisa de 1992, do professor Gerald Graham, da Universidade Estadual de Wichita, já mostrava que, de uma lista de 65 potenciais incentivos, os colaboradores consideravam o reconhecimento de seu trabalho pelo chefe o incentivo mais motivador. Um simples “obrigado” tem um poder motivador muito maior do que os líderes imaginam. E o melhor da história: não custa nada.
São Paulo - Muito esforço e pouco reconhecimento. Esta é a reclamação de mais da metade dos brasileiros em relação aos seus empregos, uma sensação que vem se intensificando ano a ano. E, se alguém pensa que reconhecimento significa ganhar mais, se engana: um terço dos trabalhadores abriria mão do dinheiro por um simples “obrigado”.
É isso o que revela uma pesquisa realizada pela filial brasileira da International Stress Management Association (Isma), uma associação internacional que pesquisa causas e tratamentos para o estresse. Em 2010, ao entrevistar 1 000 pessoas em Porto Alegre e São Paulo sobre motivos de estresse no trabalho, os consultores da Isma depararam com esse resultado: 57% dos entrevistados sentiam uma discrepância no esforço que despendiam nas suas funções e no quanto eram reconhecidos. Em 2009, eram 32%.
Esse desequilíbrio traz consequências muito mais sérias do que decepções passageiras com os chefes. No longo prazo, a falta de reconhecimento causa problemas de saúde, já que as pessoas muito comprometidas ficam suscetíveis à exaustão e a problemas de autoestima por não serem valorizadas. Segundo estudos internacionais, o risco de desenvolver uma doença cardiovascular ou um transtorno depressivo aumenta em três vezes após um grande esforço com baixa recompensa no serviço.
Para as empresas, isso também significa prejuízo. De acordo com a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente da Isma-BR, 38% dos indivíduos que participaram da pesquisa no Brasil faltavam ao trabalho com frequência (absenteísmo), enquanto outros 42% iam para o emprego, mas deixavam o pensamento em outro lugar (presenteísmo).
O fim das relações
O abismo entre o esforço e a recompensa no ambiente empresarial começou a ser estudado nos anos 1990 pelo alemão Johannes Siegrist, diretor e professor do departamento de sociologia médica da Universidade de Duesseldorf. Segundo ele, sempre houve uma discrepância entre o esforço e a recompensa, mas a situação ficou crítica no mundo globalizado. Com uma economia global, os executivos pressionam mais pelo retorno do investimento. E os trabalhadores sofrem com a falta de segurança, os baixos salários e a insatisfação no emprego.
Outros fatores contribuem para aumentar essa distância. Parte dos afazeres hoje se restringe a processar, controlar e coordenar. O sedentarismo se tornou dominante. E a separação entre vida pessoal e vida profissional está por um fio. Trabalho remoto, reuniões virtuais, comunicadores instantâneos, e-mails, flexibilidade no horário e no local de trabalho reduzem as interações entre as pessoas.
“A pressa está impedindo a todos de fazer e acontecer — e fazendo-nos esquecer da comunicação verbal”, diz a professora Vera Cavalcanti, coordenadora do curso de liderança da FGV in Company. “Nós perdemos o contato visual, uma vez que só nos comunicamos por palavras escritas, que se encurtam cada vez mais e quase viram siglas. Perdemos um aspecto rico da comunicação, porque à distância não é possível avaliar a entonação, o olhar, o gestual”, explica Vera.
Algumas organizações já perceberam isso e estão tentando resgatar o engajamento dos colaboradores ao criar programas de reconhecimento interno. Prometem viagens, ingressos de cinema, jantar no melhor restaurante da cidade com acompanhante. Apesar do esforço, é comum ouvir do empregado: ‘Preferia minha parte em dinheiro’.
O problema é que, embora válidas, as ações não são perenes. Segundo Jeffrey Jolton, executivo da consultoria americana Kenexa, o dinheiro (em espécie ou embutido em brindes) é uma maneira importante de mostrar aos empregados o quanto eles são importantes para a companhia. Porém, isso não se sustenta como força motivacional para a maioria dos indivíduos. O que não quer dizer, obviamente, que basta a organização passar a dizer “obrigado” para cada conquista profissional, sem recompensar de forma justa, que tudo vai ficar bem. “Isso também não é sustentável”, alerta a professora Vera.
A lógica é complexa: tapa no ombro é importante, mas tapa no ombro sem salário digno é inútil. Por outro lado, salário alto, bônus e prêmios são ótimos, mas não são eles que farão as pessoas trabalharem mais motivadas no dia a dia. Jeffrey Jolton defende que o entusiasmo dos colaboradores é mais influenciado pela forma como eles são tratados no ambiente de trabalho do que pelo dinheiro.
Sawu Bona
Uma pesquisa da consultoria Kenexa mostra que 55% dos empregados afirmam que são reconhecidos quando fazem um bom serviço. Contudo, quando perguntados se se sentem valorizados, apenas 41% dizem “sim”. E 32% dizem “não”. Em outras palavras: menos da metade da força de trabalho se sente valorizada; e um terço acredita que não o é.
Quando o funcionário ganha um jantar num restaurante caro, ele fica feliz, mas não se sente valorizado por isso. O mesmo acontece quando o presidente da empresa manda um e-mail generalizado para todos agradecendo as metas cumpridas durante o ano e pedindo engajamento para o próximo. Tal mensagem não causa efeito no moral da equipe. É algo feito quase como por educação — e o time percebe isso. Para ter efeito, a ação precisa ser sincera, algo como o praticado por uma tribo africana quando um cumprimenta o outro.
De acordo com a professora Vera Cavalcanti, da FGV in Company, os membros dessa tribo saúdam uns aos outros com a expressão sawu bona (se diz “savú bona”), que significa “eu vejo você”. “É diferente do nosso ‘Tudo bem?’, no qual não nos interessa a resposta”, diz ela. “O sawu bona resgata a relação de amorosidade, o respeito pelo outro, o estar pronto para ver e ouvir o outro.”
Foi mais ou menos o que fez Douglas Conant, presidente da Campbell Soup, líder mundial na venda de sopas enlatadas por mais de uma década. Ele publicou um artigo no qual revelou que há mais de dez anos gasta alguns minutos do seu dia escrevendo notas de agradecimento aos colaboradores de destaque. Nesse período, ele preparou mais de 30 000 bilhetinhos com um simples “obrigado”.
Segundo a psicóloga Ana Maria Rossi, ações simples como essa são as mais eficazes. “É colocar um bombom na mesa do empregado ao voltar do almoço para agradecê-lo daquele relatório complexo; é mandar um bilhetinho dizendo o quanto seu trabalho é importante, ou dizer o quanto a pessoa o ajuda.” Você, nesse caso, destaca quem realmente foi importante naquela ação — atitude muito mais sincera, justa e significativa do que mandar e-mails coletivos.
Ações desse tipo são fáceis de executar e trazem resultados elevados, já que quem as recebe se sente extremamente valorizado, — muito mais, talvez, do que se tivesse ido jantar num restaurante cinco estrelas sem que o próprio chefe participasse do reconhecimento. E isso não chega a ser uma grande descoberta.
Uma pesquisa de 1992, do professor Gerald Graham, da Universidade Estadual de Wichita, já mostrava que, de uma lista de 65 potenciais incentivos, os colaboradores consideravam o reconhecimento de seu trabalho pelo chefe o incentivo mais motivador. Um simples “obrigado” tem um poder motivador muito maior do que os líderes imaginam. E o melhor da história: não custa nada.