Crise corta pela metade os bônus pagos pelos bancos no Brasil
Bancos, corretoras e gestoras de recursos mudam seus planos de negócios para se adaptar à crise
Da Redação
Publicado em 25 de março de 2010 às 18h23.
Quem trabalha no mercado financeiro no Brasil hoje vive um frustrante momento de transição. Depois de passar alguns anos recebendo bônus estratosféricos e inúmeras ofertas tentadoras de emprego, a rotina agora é de demissões e salários em queda.
Em apenas três meses, de setembro a novembro, centenas de funcionários – de estagiários a altos executivos – foram demitidos de bancos, corretoras e gestoras de recursos no país, e tudo indica que os cortes vão continuar em 2009. Estimativas de consultorias de recursos humanos indicam que os bônus que serão pagos entre janeiro e março devem ser 50% menores do que os deste ano – e há casos de profissionais que não vão ganhar qualquer remuneração extra, algo impensável poucos meses atrás.
"A realidade mudou bastante. O volume de trabalho está menor e todas as instituições estão passando ou vão passar por cortes", diz um ex-diretor do Credit Suisse, que foi demitido em outubro depois de a área em que trabalhava, a do banco de investimento, passar por um corte de 30%, segundo ele (oficialmente, o Credit não confirma as demissões).
O grande baque está sendo sentido pelos bancos de investimento, em razão da drástica queda das operações de abertura de capital, oferta de ações e fusões e aquisições, seus principais negócios. Houve apenas quatro IPOs na Bovespa em 2008, por exemplo – no ano anterior, haviam sido 64.
Além disso, as fusões e aquisições movimentaram 81 bilhões de reais no ano até outubro, 43% menos que em 2007. Mas também há problemas nos bancos médios e nas gestoras de fundos, especialmente nas independentes. As receitas das gestoras dependem de quanto capital elas administram – e muitos investidores, depois de amargar perdas consideráveis em aplicações mais arriscadas nos últimos meses, resolveram investir em títulos públicos, CDBs ou fundos mais conservadores, que geram poucas receitas.
Segundo a Anbid, as carteiras de ações e multimercados perderam quase 4 bilhões de reais só em novembro. "Os gestores dificilmente conseguirão recuperar esse dinheiro, porque a maior parte migrou para os CDBs, que costumam ser aplicações de prazos longos", diz Marcelo Pereira, sócio da consultoria Tag Investimentos.
Diante do cenário mais complicado, bancos e gestoras independentes, como BNP Paribas, Hedging-Griffo e Mauá, demitiram ou acertaram a saída de funcionários nos últimos meses. Na Link Investimentos, de São Paulo, a alternativa foi "aproveitar a crise para contratar gente boa por salários mais razoáveis do que aqueles que vinham sendo pagos", diz Daniel Mendonça de Barros, sócio da Link.
Nos últimos três meses, a empresa demitiu 25 profissionais – em geral, de altos salários – e contratou 24. "Também inauguramos um escritório em Curitiba, para atrair clientes para o home broker, que ainda está gerando resultados atraentes", diz ele, que espera uma queda de receitas de cerca de 20% em 2009.
Outro movimento que está ocorrendo entre as gestoras independentes é o de consolidação. Em dezembro, as cariocas Mandarim Investimentos e Máxima Asset, por exemplo, decidiram unir suas operações. A Plenus Gestão, especializada em renda variável, busca desde outubro se associar a uma gestora de renda fixa, para ampliar a gama de produtos oferecidos aos investidores.
"Não há como atuar sozinho com um baixo volume de recursos. A saída é a consolidação", diz Eduardo Coutinho, gestor da Plenus.
Nos bancos médios, um dos problemas é a diminuição da margem de lucro gerada pelas operações de crédito consignado. Os juros desse tipo de crédito são baixos, de cerca de 2% ao mês. Isso significa que, para ter lucro, os bancos precisam captar dinheiro de forma barata – o que se tornou impossível com o choque de liquidez provocado pela crise mundial.
Assim, bancos como BMG, Cruzeiro do Sul, Panamericano, Pine e Schahin, reviram seus planos de negócios, reduziram suas áreas de empréstimos consignados e demitiram centenas de funcionários. "O nome do jogo era escala. Agora, é liquidez. Fomos obrigados a reduzir a estrutura para conseguir manter a rentabilidade", diz Luis Octavio Índio da Costa, presidente do Cruzeiro do Sul, que demitiu 174 empregados entre setembro e outubro.
O ano de 2009 deve marcar a quebra de uma seqüência de sete anos seguidos de expansão do mercado de trabalho no setor bancário. Entre setembro e novembro deste ano, houve 3.224 demissões, um aumento de 32% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo o Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.