É preciso mais protagonismo feminino no turismo
Cerca de metade dos trabalhadores do setor são mulheres, mas quantos em altas posições
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Publicado em 8 de março de 2023 às 20h30.
De todos os setores pelos quais passei, o do turismo é o que mais tem mulheres, mas isso não necessariamente significa protagonismo. De acordo com o World Travel & Tourism Council (WTTC), maior autoridade empresarial do setor no mundo, 54% da força de trabalho em 2022 era feminina. No Brasil, não há uma compilação nesse sentido, mas dados do Ministério do Trabalho apontam que as mulheres compõem 49% dos empregados em atividades características do turismo. Já se foi o tempo, no entanto, em que um dado como esse era o suficiente. Precisamos de mais. Precisamos de um protagonismo feminino capaz de produzir mudanças reais.
Números têm uma característica peculiar de nem sempre retratar a realidade, ou de se sujeitar a distorções dependendo da narrativa que queremos estabelecer. Ainda segundo informações do ministério, a concentração de mulheres está ligada a atividades de camareira, serviços de alimentação e ao cuidado doméstico, todas associadas à questão da segregação de gênero do trabalho. Como consequência, as mulheres continuam limitadas a escalões inferiores ou a atividades tradicionais reservadas ao trabalho feminino.
Além da segregação horizontal de gênero, relativa aos tipos de trabalho, existe uma segregação vertical, que se refere à perspectiva de promoção na carreira. Mesmo em áreas tradicionalmente abertas à participação feminina, há presença maciça de homens em cargos estratégicos, uma vez que estes definem as políticas que asseguram o funcionamento organizacional cotidiano e a manutenção desta segregação. As mulheres são preferencialmente recrutadas para essas ocupações, enquanto os homens são empregados em cargos de transporte e gestão.
A pequena proporção de mulheres em posições de poder pode ser explicada pelo conceito do “teto de vidro”. Nós precisamos superar um conjunto de barreiras sociais e históricas que cristalizam preconceitos decorrentes de estereótipos. No começo desta semana, Antonio Guterres, o nono homem a exercer a função de secretário-geral da ONU, cargo nunca ocupado por uma mulher, afirmou que a ONU Mulheres estima em 300 anos o tempo para que alcancemos a equidade de gênero. De posse disso, precisamos entender que equidade de gênero não é benefício ou proposta de valor, é questão de responsabilidade e execução.
Construí minha carreira nos setores de energia e serviços financeiros, e nem preciso me alongar aqui sobre o quão predominantemente masculinos eles são. Quando cheguei à CVC Corp, no começo de 2021, aproveitei a oportunidade de aliar a responsabilidade por liderar a área de pessoas com a execução de políticas de equidade. No ano passado, tivemos 204 promoções de mulheres e 96 de homens, ou seja, 68% das promoções na companhia foram de mulheres. O resultado é que, atualmente, 62% do quadro é feminino e a nossa representatividade na liderança chega a 48%. No conselho de administração, a participação é de 28,5%, enquanto no comitê executivo, de 37,5%.
Como exemplo que vem de cima tem o poder de se espraiar, da nossa rede de franquias, tanto da marca CVC quanto da Experimento Intercâmbio Cultural, 55% das lojas são lideradas por mulheres, bem acima dos dados da Receita Federal que indicam que cerca de 35% de todos os sócios pessoas físicas de empresas de turismo no Brasil são mulheres.
Tenho plena consciência de que, sozinha, não sou capaz de mudar o mundo, mas eu posso fazer algo por ele todos os dias. A CVC Corp tem uma responsabilidade e um compromisso muito sério com a diversidade e inclusão. Inclusive, nosso programa de voluntariado, o REconecta, tem um público feminino de 80%. Isso mostra mais que disposição em vencer um jogo que se arrasta há tempo demais contra todas nós. É questão de sororidade, compromisso e transformação.
*Paula Domingues é Diretora de Gente e Sustentabilidade da CVC Corp.
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