Patentes de vacinas: 'temos o direito de mudar de opinião', diz chanceler
Pressionado, o governo de Joe Biden decidiu apoiar a suspensão de direitos de propriedade intelectual sobre as vacinas contra covid-19
Agência Brasil
Publicado em 6 de maio de 2021 às 13h57.
Última atualização em 6 de maio de 2021 às 22h36.
O ministro das Relações Exteriores , Carlos Alberto de Franco França, disse nesta quinta-feira, 6, que a postura do Brasil, contrária até o momento à quebra de patentes de vacinas contra a covid-19 proposta pela Índia e África do Sul na Organização Mundial de Comércio (OMC), não é exatamente fixa e imutável. "Temos sempre o direito de mudar de opinião. Não tenho amor a nenhuma dessas posições", disse ele em audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado.
O chanceler foi consultado sobre o tema depois que os Estados Unidos anunciaram que mudaram de posição ontem e decidiram apoiar, agora num total de 100 países ou cerca de dois terços dos membros da OMC, a proposta de "waiver" (suspensão) do licenciamento das vacinas. A intenção é facilitar a transferência de tecnologia e possibilitar a produção das vacinas nos países que estão mais atrasados no processo de imunização.
A proposta engloba renúncia a diferentes direitos de proteção intelectual, entre eles as patentes dos imunizantes. Ontem, o conselho-geral da OMC se reuniu para discutir o tema, que voltará a ser debatido nas próximas semanas.
Nas primeiras horas da manhã, a União Europeia (UE) também disse que estaria do mesmo lado dos americanos. Perto do meio-dia, porém, o governo alemão, de Angela Merkel, se opôs à quebra de patentes das vacinas contra o coronavírus. O "waiver" foi proposto no Conselho de Trips da OMC em outubro do ano passado. Outras iniciativas vêm sendo discutidas, como o Accelerator e o Covid-19 Technology Access Pool, o ACT, ambas na Organização Mundial da Saúde (OMS).
A posição do Brasil sobre o tema - mantida por enquanto, de acordo com o ministro - é a de aceitar a proposta liderada por Canadá e Chile, conhecida como "terceira via". "Nada impede que a posição (do Brasil) de hoje seja atualizada amanhã", considerou, em relação ao encontro virtual que terá nestas sexta-feira com a representante comercial dos EUA, Katherine Tai para buscar "entender" a nova posição americana. Há pouco, o chanceler acrescentou que a reunião está prevista para ocorrer às 18 horas de Brasília.
É possível, de acordo com França, que a flexibilização da proposta pela Índia e África do Sul, possa criar uma condição multilateral para a questão. Ontem, os membros da OMC discutiram o tema e os dois países que encabeçam essa linha se propuseram a atualizar o documento, com outra reunião para debater o assunto previsto para ocorrer em algumas semanas. Essa condição multilateral sobre quebra de patentes, se realmente for definida favorece o Brasil, segundo o diplomata.
França salientou, porém, que uma nova proposta pode tomar tempo. "Não será para amanhã", advertiu. Ele também disse aos senadores que se for consultado pelo presidente Jair Bolsonaro sobre o tema que deve aconselhá-lo a favor de uma postura flexível e pragmática sobre "waiver". Isso porque, de acordo com o ministro é uma posição que pode "favorecer a todos". Além disso, ele disse que também quer ouvir as farmacêuticas sobre o assunto para entender como elas podem entrar, de fato, no acordo.
O ministro comentou ainda que a OMS tem falado sempre sobre a necessidade de se ampliar a produção de vacinas nos mais diferentes locais para dar uma resposta global à pandemia. "Temos sempre o direito de mudar de opinião se for para defender os mais legítimos interesses do Brasil, mas não vejo que o Brasil esteja isolado", disse que a opção do País foi a mesma do Canadá, do Chile e da própria administração da OMC.
Esta afirmação foi feita depois que a presidente da comissão, a senadora Kátia Abreu, questionou o convidado sobre se o Brasil estaria certo e os demais 100 países, errados. Ela se diz uma liberal, mas salientou que o acordo que abre essa possibilidade de quebra de patentes já existe para casos considerados mais extremos na OMC, e que a pandemia é um deles. "Sou liberal, mas o acordo de Trips não foi fechado por mim. Não queremos nada de graça, podemos pagar", afirmou a senadora. Ela cogitou ainda a hipótese de, depois de se tornar um produtor, de o Brasil vender vacinas para países da África e vizinhos. "Podemos ser a grande farmácia da América Latina", vislumbrou.
Pretendemos ampliar relações com China
O ministro das Relações Exteriores, Carlos França, disse hoje (6) que o Brasil pretende ampliar e diversificar as relações econômicas e comerciais que têm com a China. Em audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado, o chanceler acrescentou que a relação com o país asiático está entre as prioridades do governo brasileiro.
Ao iniciar sua fala, o ministro das Relações Exteriores disse que a China é um dos países priorizados pelo Brasil e que, além de ser o maior parceiro comercial, é um dos nossos cinco maiores investidores estrangeiros.
“O comércio bilateral cresceu em 2020, apesar da pandemia, para volume recorde de US$ 102,5 bilhões, com saldo superavitário para o Brasil de US$ 33 bilhões. Queremos um relacionamento econômico e comercial maior e mais diversificado com a China. Nossas exportações, ainda concentradas em poucos produtos primários, poderão expandir-se em quantidade e em variedade”, disse o chanceler.
A afirmação foi feita após a presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, Kátia Abreu (PP-TO), ter manifestado preocupação com a possibilidade de as relações entre os dois países serem “vetadas, atrapalhadas ou impedidas”.
“Em 2020, a China absorveu 32,3% de exportações brasileiras, o que propiciou ao nosso país superávit comercial de US$ 33,8 bilhões. O Brasil responde hoje por 4% de tudo que a China importa, e esse número cresce para 22% no caso do agronegócio. Temos espaço para avançar. Caso a China cresça a uma taxa anual de 4,6% na próxima década, as exportações podem saltar de US$ 34 bilhões ao ano, para US$ 53 bilhões. Nada nem ninguém pode vetar, atrapalhar ou impedir essa grande perspectiva para nosso país”, disse a senadora ao abrir a audiência.
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