Tudo sobre o caso das joias de Bolsonaro: veja cronologia, envolvidos e valores
Gestão do ex-presidente escalou militares e diferentes ministérios para tentar reaver conjunto avaliado em R$ 16,5 milhões
Agência de notícias
Publicado em 8 de março de 2023 às 08h59.
Última atualização em 8 de março de 2023 às 09h00.
Ao menos seis pessoas estão envolvidas diretamente na tentativa do governo de Jair Bolsonaro de tentar entrar no país ilegalmente com joias de diamantes avaliadas em R$ 16,5 milhões.
As pedras preciosas, que seriam um presente do governo da Arábia Saudita à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, foram encontradas na mochila de um assessor do ex-ministro Bento Albuquerque, no Aeroporto de Guarulhos, e apreendidas pela Receita Federal em outubro de 2021.
Após a primeira reportagem, soube-se que o então ministro Bento Albuquerque também trouxe do país no Oriente Médio um segundo conjunto de joias — este destinado ao próprio ex-presidente Jair Bolsonaro. Em ambos os casos, as peças eram da empresa Chopard, marca suíça que está entre as mais famosas (e caras) do ramo no mundo.
A apreensão das joias para Michelle por um fiscal da Receita gerou uma série de tentativas do antigo governo de reaver os itens milionários. Vários funcionários e ministérios foram envolvidos nas tratativas. Veja, abaixo, um passo a passo de todo o caso:
Cronologia do caso das joias
Nada a declarar (26/10/2021)
O conjunto com colar, anel, relógio e um par de brincos de diamante estava na mochila de um assessor do então ministro Bento Albuquerque. A Receita apreendeu as peças, que não haviam sido declaradas, no aeroporto de Guarulhos, em 26 de outubro de 2021.
Carteirada (26/10/2021)
Ao saber da apreensão, o ministro de Minas e Energia retornou à área da alfândega e tentou retirar os itens, informando que era um presente da família real saudita para a primeira-dama Michelle. Ele não aceitou a opção dada pela Receita de tratá-las como propriedade do Estado brasileiro.
'Destino adequado' (28/10/2021)
Em 28 de outubro o gabinete do Ministério de Minas e Energia (MME) enviou ofício ao responsável pela documentação do acervo da Presidência solicitando que fosse dado às joias "o destino legal adequado".
Acervo público ou privado (28/10/2021)
Em resposta, o Gabinete de Documentação Histórica solicitou o envio das joias para análise quanto à incorporação ao acervo privado ou público.
Solicitação do Itamaraty (03/11/2021)
Em 3 de novembro, o Ministério das Relações Exteriores pediu a liberação das peças.
Pressão de Albuquerque (03/11/2021)
No mesmo dia, o gabinete de Albuquerque reforça a pressão.
Ministro omite apreensão (22/11/2021)
Em correspondência datada de 22 de novembro de 2021, enviada ao príncipe da Arábia Saudita Abudulaziz bin Salman Al Saud, Albuquerque omitiu a apreensão das joias. O ministro afirma que os presentes recebidos do regime saudita foram incorporados ao acervo brasileiro "de acordo com a legislação nacional e o código de conduta da administração pública”.
Segundo pacote de joias (29/11/2022)
Um segundo conjunto de joias, contendo um relógio, uma caneta, um par de abotoaduras, um anel e um tipo de rosário, trazido ilegalmente para o país na mesma leva foi entregue à Presidência em 29 de novembro de 2022 pelo assessor especial do MME Antônio Carlos Ramos de Barros Mello. Eles estavam sob a guarda da pasta, segundo ele. Essas peças foram trazidas na bagagem pessoal de Albuquerque.
Em mãos (29/11/2022)
Um recibo mostra que Bolsonaro recebeu pessoalmente o segundo pacote de joias no Palácio da Alvorada. O documento foi assinado pelo funcionário Rodrigo Carlos do Santos às 15h50min do próprio dia 29 de novembro de 2022. Um dos tópicos do formulário questiona se o item foi visualizado pelo presidente. A resposta: “Sim”.
Secretário da Receita tenta liberação (28/12/2022)
No dia 28 de dezembro de 2022, às vésperas do fim do mandato de Bolsonaro, o então secretário da Receita, Julio Cesar Viera Gomes, enviou ofício para a alfândega do aeroporto em São Paulo pedindo a liberação das joias.
Gabinete de Bolsonaro entra em campo (28/12/2022)
No mesmo dia, a Ajudância de Ordens da Presidência, que era chefiada pelo tenente-coronel Mauro Cid, homem de confiança de Bolsonaro, envia ofício à Receita solicitando as joias.
Última tentativa (29/12/2022)
Em 29 de dezembro de 2022,o primeiro-sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva foi enviado a Guarulhos em voo da FAB para tentar recuperar as joias. A justificativa que consta no Portal da Transparência diz que o militar faria a viagem “atendendo a demanda recebida do chefe da Ajudância de Ordens do presidente da República”.
Quem são os envolvidos?
Marcos André Soeiro
Assessor de Bento Albuquerque, trouxe as joias recebidas na Arábia Saudita dentro de uma mochila. Ao passar pela alfândega, o assessor informou não ter nada a declarar. As peças foram encontradas e apreendidas pela Receita durante o raio X feito pela fiscalização de rotina entre os passageiros do voo 773, da Arábia Saudita para Guarulhos. Além das joias, dentro da mochila havia um certificado de autenticidade da marca Chopard. A cena foi registrada pelas câmeras de segurança do local.
Bento Albuquerque
Em 2021, era o ministro das Minas e Energia do governo Bolsonaro. As joias ganhas foram encontradas na mochila de seu assessor. Ao saber que as peças haviam sido apreendidas pela Receita, Albuquerque retornou à área da alfândega e tentou, ele próprio, retirar os itens, informando que se trataria de um presente pessoal para Michelle. Em carta enviada ao príncipe da Arábia Saudita, ele omitiu a apreensão das joias. Como O GLOBO mostrou, a Receita Federal irá intimar Albuquerque para ele dar explicações sobre a entrada do pacote.
José Roberto Bueno Junior
Militar e ex-chefe de gabinete de Bento Albuquerque, foi um dos primeiros servidores a empenhar esforços para tentar reaver as joias. Em 3 de novembro de 2021, dias depois da apreensão do conjunto de diamantes, enviou ofício à Receita Federal dizendo que Bento Albuquerque esteve em Riad para o lançamento da Iniciativa Oriente Médio Verde e que, na ocasião, “foram oferecidos, por autoridades estrangeiras, alguns presentes à representação brasileira”.
Junior disse que, uma vez que o ministro não poderia recusar ou devolver os presentes, “se faz necessário e imprescindível que seja dado ao acervo o destino legal adequado”. No fim do mandato de Bolsonaro, ele foi indicado para cargos em empresas estatais.
Mauro Cid
Homem de confiança do ex-presidente Jair Bolsonaro, o coronel Mauro Cid foi quem pediu um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) com urgência para que Jairo Moreira da Silva pudesse buscar as joias apreendidas.
Jair Bolsonaro
No dia 28 de dezembro de 2022, o próprio presidente enviou um ofício à Receita comunicando a viagem do subalterno e cobrando a devolução das joias.
Jairo Moreira da Silva
Chefe da Ajudância de Ordens do presidente, o sargento da Marinha seguiu para Guarulhos em 29 de dezembro de 2022 para "atender demandas" de Bolsonaro, conforme consta na solicitação de voo da FAB. Foi a última tentativa de reaver as joias.
"Não pode ter nada do (governo) antigo para o próximo, tem que tirar tudo e levar", argumentou o funcionário ao tentar convencer os fiscais alfandegários, conforme consta em relatos colhidos pelo jornal. Bolsonaro viajou para os Estados Unidos no dia seguinte e não retornou ao Brasil.
Instituições mobilizadas
Ministério de Minas e Energia
A segunda caixa de joias entregue pelo governo da Arábia Saudita a Bolsonaro ficou guardada no cofre da pasta por mais de um ano, até chegar ao acervo da Presidência, de acordo com assessores de Bento Albuquerque.
Ministério das Relações Exteriores
A pasta, via Itamaraty, pediu a Receita que tomasse as "providências necessárias para liberação dos bens retidos" em Guarulhos. A Receita retrucou que só seria possível fazer a retirada mediante os procedimentos de praxe nestes casos, com quitação da multa e do imposto devidos.
Chefia da Receita Federal
O próprio comando do órgão entrou em campo para liberar o material, segundo o jornal "O Estado de S.Paulo", mas os servidores do órgão mantiveram a decisão e fizeram valer a lei.