Operação: PF cumpre mandados contra aliados e o ex-presidente (Valter Campanato/Agência Brasil)
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 8 de fevereiro de 2024 às 11h50.
Última atualização em 8 de fevereiro de 2024 às 16h05.
A Polícia Federal (PF) deflagrou na manhã desta quinta-feira, 8, a operação Tempus Veritatis – "hora da verdade", em latim –, para apurar, segundo a PF, uma suposta organização criminosa que atuou na tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, para obter vantagem de natureza política com a manutenção do então presidente da República no poder. Os alvos foram o ex-presidente Jair Bolsonaro e alguns de seus principais aliados políticos. Veja tudo o que se sabe sobre a operação.
Segundo a PF, foram cumpridos 33 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e 48 medidas cautelares, que incluem a proibição de manter contato com os demais investigados, proibição de se ausentarem do país, com entrega dos passaportes no prazo de 24 horas e suspensão do exercício de funções públicas.
A operação acontece nos estados do Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Ceará, Espírito Santo, Paraná, Goiás e no Distrito Federal.
Os polícias federais cumprem ordens expedidas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O Exército Brasileiro acompanha o cumprimento de alguns mandados, em apoio à Polícia Federal.
Como mostrou EXAME, um dos alvos da operação foi o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e terá de entregar seu passaporte às autoridades.
Seu advogado e assessor, o ex-ministro Fabio Wajngarten inclusive postou no X, antigo Twitter, que o ex-presidente entregará o documento em cumprimento às decisões.
Em cumprimento às decisões de hoje, o Presidente @jairbolsonaro entregará o passaporte às autoridades competentes.
Já determinou que seu auxiliar direto, que foi alvo da mesma decisão, que se encontrava em Mambucaba, retorne para sua casa em Brasília, atendendo a ordem de não…— Fabio Wajngarten (@fabiowoficial) February 8, 2024
Segundo a decisão de Moraes, obtida pela EXAME, além de Bolsonaro, também são alvos de busca, apreensão e medidas cautelares:
Alguns dos investigados foram alvo de mandados de prisão. São eles:
Os três primeiros foram presos nesta manhã. Bernardo Romão está nos Estados Unidos.
Segundo informações da Polícia Federal, as apurações apontam que o grupo investigado se dividiu em núcleos de atuação para disseminar uma suposta fraude nas eleições de 2022, antes mesmo da realização do pleito. O objetivo seria viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital.
Os núcleos de atuação da suposta organização criminosa são:
O primeiro eixo consistiu na construção e propagação da versão de fraude nas eleições de 2022, por meio da disseminação notícias falsas sobre vulnerabilidades do sistema eletrônico de votação, discurso reiterado pelos investigados desde 2019 e que persistiu mesmo após os resultados do segundo turno do pleito em 2022.
Segundo a investigação, eram integrantes do eixo de propagação de fraude:
O outro núcleo atuou na prática de atos para subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito, através de um golpe de Estado, com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível.
As pessoas apontadas como integrantes do Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e Apoio a Outros Núcleos são:
A investigação aponta que a atuação do grupo foi intensificada após o segundo turno das eleições presidenciais, e que foi utilizada uma metodologia de milícia digital para espalhar a ideia de que o pleito foi fraudado e era preciso resistir na frente de quarteis e instalações das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para o Golpe de Estado, novamente fazendo circular estudos e investigações de conteúdo inverídico.
A PF aponta ainda que a representação do Partido Liberal junto ao TSE questionando a segurança das urnas eletrônicas configurou o último ato do grupo para "insurgir-se formalmente contra o resultado das eleições".
É citada também a realização de reuniões com integrantes do governo Bolsonaro e militares da ativa para encaminhar orientações aos manifestantes de como agirem, locais de atuação, além de financiarem e respaldarem suas ações, por meio das Forças Armadas.
Com isso, é apontado o recrutamento de militares com formação em forças especiais atuaram as manifestações golpistas. Segundo parecer da Procuradoria-Geral da República, militares indecisos sobre a adesão ao plano de golpe de Estado sofreram ataques pessoais.
A conclusão da investigação da PF é que a "empreitada criminosa" permaneceu durante o mês de dezembro, culminando no desencadeamento dos atos antidemocráticos do dia 8 de janeiro de 2023. A PGR diz ainda que um grupo de pessoas foi apontado como responsável pelo constantes assessoramento jurídico e pela elaboração de minutas de decreto com objetivo de consumar um golpe de Estado e de subverter a ordem democrática.
Segundo a PF, a minuta de golpe foi entregue a Bolsonaro por seu ex-assessor para assuntos internacionais Filipe Martins, preso na manhã desta quinta, e Amauri Feres, alvo de busca e apreensão.
O rascunho detalhava supostas interferências do Judiciário no Executivo e decretava a prisão de diversas autoridades, entre elas os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes e Rodrigo Pacheco, além de definir a realização de novas eleições
Investigações apontam ainda que alterações na minuta foram realizadas a pedido de Bolsonaro. Com as mudanças, permaneceu no rascunho o pedido de prisão de Moraes e a determinação de novas eleições. A PF aponta que o ex-presidente teria concordado com os termos do documento e convocado uma reunião com os comandantes das forças militares para apresentar a minuta e pressioná-los a aderirem ao Golpe de Estado.
Os policiais identificaram que a agenda e os voos de Moraes foram monitorados pelos investigados, que acompanharam os deslocamentos do ministro com o intuito de executarem a ordem de prisão, em caso de consumação do Golpe de Estado. Conversas entre o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, e Marcelo Câmara, coronel do Exército, preso nesta manhã, evidenciam o monitoramento do itinerário do ministro do STF, chamado de "professora" pelos investigados, segundo documentos encontrados pela PF.
O ex-ministro e candidato a vice de Bolsonaro nas eleições de 2022 é apontado pela PF como um dos participantes da tentativa de golpe de Estado, com forte atuação no ataque aos militares que não aderiram a ideia de ruptura institucional.
A investigação mostra conversas entre o ex-ministro e Ailtons Barros, onde Braga Neto pedia para que críticas ao tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, que ocupou o cargo de comandante da Aeronáutica no governo de Jair Bolsonaro, fossem intensificadas.
"Senta o pau no Batista Júnior (sic). Povo sofrendo, arbitrariedades sendo feita (sic) e ele fechado nas mordomias. negociando favores. Traidor da pátria. Daí para frente. Inferniza a vida dele e da família", orientou Braga Netto.
Na decisão de Moraes, é citado que a PF tem em mãos um vídeo de uma reunião secreta entre Bolsonaro e a alta cúpula do governo aprendido em uma busca na casa de Mauro Cid. Participaram do encontro:
Segundo a PF, a reunião teve como objetivo reforçar os ataques ao sistema eleitoral brasileiro e cobras os presentes por uma conduta ativa na difusão de informações inverídicas.
A investigação afirma que Bolsonaro exigiu que seus ministros deveriam promover e replicar todas as informações que questionavam as urnas eletrônicas
"Daqui pra frente quero que todo ministro fale o que eu vou falar aqui, e vou mostrar. Se o ministro não quiser falar ele vai vim falar para mim porque que ele não quer falar. Se apresentar onde eu estou errado eu topo. Agora, se não tiver argumento pra me ti... demover do que eu vou mostrar, não vou querer papo com esse ministro. Tá no lugar errado. Se tá achando que eu vou ter 70% dos votos e vou ganhar como ganhei em 2018, e vou provar , o cara tá no lugar errado", , disse Bolsonaro, segundo a PF.
Na mesma reunião, o então ministro-chefe do GSI, Augusto Heleno, disse que conversou com o diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) “para infiltrar agentes nas campanhas eleitorais”. O ministro, porém, logo foi calado por Bolsonaro, que pediu para o tema ser tratado apenas com ele.
De acordo com a PF, os fatos investigados configuram, em tese, os crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.