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Crise dos povos ianomâmis: MPF vê possível caracterização de genocídio

"Grave situação" de saúde e segurança alimentar seria resultado da omissão do Estado em assegurar a proteção da terra indígena

Indígenas em frente ao coordenador da Câmara de Revisão da época, Antônio Carlos Bigonha, em fevereiro de 2020 (Geraldo Magela/Agência Senado)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 24 de janeiro de 2023 às 11h58.

Última atualização em 24 de janeiro de 2023 às 13h22.

A Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MPF) aponta que a "grave situação" de saúde e segurança alimentar vivida pelo povo Ianomâmi é resultado da omissão do Estado em assegurar a proteção da terra indígena, tendo o governo Jair Bolsonaro adotado "providências limitadas" sobre o tema. Em nota pública, a Procuradoria alerta para "verdadeira tragédia humanitária " e possível caracterização de genocídio, inclusive com eventual responsabilização internacional do Estado.

As ponderações do MPF foram divulgadas nesta segunda-feira, 23, mesmo dia em que o ministro da Justiça e Segurança Pública Flávio Dino determinou à Polícia Federal que abra uma investigação sobre possíveis crimes de genocídio, omissão de socorro e crime ambiental. Ao fundamentar o pedido de instauração do inquérito, Dino citou "incentivo político a garimpos ilegais em terras indígenas, abandono no que tange ao oferecimento de ações e serviços de saúde, e ausência de estratégias para garantia da segurança alimentar aos ianomâmis".

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O ofício à PF fala em "cenário de possível desmonte intencional contra os indígenas ianomâmis ou genocídio". "Os reiterados pedidos de ajuda contra a violência decorrente do garimpo ilegal bem como a ausência de efetivas ações e serviços de saúde à disposição dos ianomâmis frisam possível intenção de causar lesão grave à integridade ou mesmo provocar a extinção do referido grupo originário", ressaltou Dino determinar a abertura das apurações sobre a crise dos povos ianomâmis .

A Procuradoria destacou ações adotadas em meio ao governo Jair Bolsonaro para cobrar providências do Estado ante a expansão do garimpo ilegal e a precariedade dos serviços de saúde prestados ao povo Yanomami. O órgão citou processos movidos, em primeiro grau e na esfera cível, para garantir a instalação de Bases de Proteção Etnoambiental em pontos estratégicos da terra indígena e para elaboração de um plano emergencial de combate a crimes ambientais e retirada de invasores em meio à pandemia da covid-19.

Em novembro, o MPF oficiou o governo de transição informando sobre o "cenário calamitoso" na terra indígena ianomâmi, que "configuraria verdadeira tragédia humanitária e indicaria um processo em curso que, caso não imediatamente freado, poderá caracterizar hipótese de genocídio, inclusive passível, em tese, de responsabilização internacional do Estado".

No mesmo mês, a Polícia Federal e a Procuradoria da República em Roraima chegaram a deflagrar uma operação contra esquema de desvio de medicamentos do Distrito Sanitário Especial Indígena Ianomâmi. Os investigadores suspeitavam que apenas 30% dos mais de 90 tipos de remédios contratados pelos indígenas teriam sido devidamente entregues, deixando crianças desassistidas — somente com relação ao tratamento de verminoses, o desvio teria impactado o tratamento de 10 mil crianças.

Considerando os danos causados pelo garimpo na terra indígena Ianomâmi, a Procuradoria ainda chamou atenção para a tramitação do projeto de lei que objetiva legalizar a exploração mineral e de recursos hídricos nas terras indígenas. O Ministério Público Federal já apontou a inconstitucionalidade do texto. Segundo a Hutukara Associação Yanomami, houve um crescimento "alarmante" do número de garimpeiros na terra indígena, estimado em mais de 20 mil.

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